Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0007478-20.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
13/08/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 20/08/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
DOENÇA. QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA. TEMAS INCONTROVERSOS NOS
AUTOS. LAUDO MÉDICO-PERICIAL. INCAPACIDADE LABORATIVA NÃO-COMPROVADA.
BENEFÍCIO INDEVIDO. RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO. APELAÇÃO DO INSS
PROVIDA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO.
AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE
PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
8 - O preenchimento dos requisitos atinentes às qualidade de segurado e carência legal restara
incontroverso, na medida em que o INSS não impugnara o capítulo da sentença que os
reconhecera.
9 - Referentemente à inaptidão laboral, da perícia médico-judicial realizada em 14/10/2014,
posteriormente complementada, infere-se que a parte autora - contando com 61 anos à ocasião,
de profissão declarada “costureira - autônoma” (inclusive na exordial) - padeceria de diminuição
da acuidade visual à direita (déficit visual decorrente de sequela de descolamento de retina),
compensada com o olho esquerdo, com lentes corretivas; hipertensão arterial sistêmica e
diabetes controladas com medicamentos.
10 - Acrescentou que as patologias que acometem a autora são passíveis de controle clínico e
que a autora tem orientações para não realizar atividades que necessitem de muito esforço físico.
11 - Afirmou, o perito, e em resposta aos quesitos formulados, que a parte autora não
apresentaria incapacidade laborativa no momento da perícia.
12 - O juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do
CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção
das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente
jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que
infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros
documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante
o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário
das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes.
13 - Documentos médicos carreados pela parte demandante não confrontam as conclusões
periciais.
14 - A perícia médico-judicial foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual
respondera satisfatoriamente aos quesitos elaborados, fornecendo diagnóstico com base na
análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como
efetuando demais avaliações que entendera pertinentes, sendo certo que, não sendo infirmada
pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
15 - Do parecer especializado, revela-se panorama não-condizente com quadro de incapacidade
laborativa, merecendo, pois, total reforma o julgado de Primeiro Grau.
16 - Inocuidade da oitiva de testemunhas no tocante à caracterização da incapacidade laborativa,
cuja demonstração dar-se-á por meio de elementos exclusivamente médico-periciais.
17 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
18 - Condenada a autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente
desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais se arbitra em
10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco)
anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão
dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos
da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
19 - Apelação do autor desprovida. Apelação do INSS provida. Sentença reformada. Revogação
da tutela. Devolução de valores. Juízo da execução. Ação julgada improcedente. Inversão das
verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007478-20.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: ANA HELENA BONATI CANCIAN
Advogado do(a) APELANTE: CASSIANO TADEU BELOTO BALDO - SP205848-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007478-20.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: ANA HELENA BONATI CANCIAN
Advogado do(a) APELANTE: CASSIANO TADEU BELOTO BALDO - SP205848-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas, pela autora ANA HELENA BONATI CANCIAN e pelo
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, em ação previdenciária objetivando a
concessão de “aposentadoria por invalidez” ou “auxílio-doença”.
A r. sentença prolatada em 06/07/2016, parcialmente modificada por força de embargos de
declaração (ID 102665334 – pág. 139/142, 147/148, 149/150), julgou procedente a ação,
condenando o INSS no pagamento de “aposentadoria por invalidez” à parte demandante, desde
31/07/2013 (data imediatamente após a cessação administrativa, sob rubrica NB 601.541.876-
5) (ID 102665334 – pág. 44), com incidência de correção monetária e juros de mora sobre os
atrasados verificados. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios
arbitrados em 10% sobre o total vencido até a sentença. Tutela antecipada deferida.
Em suas razões recursais (ID 102665334 – pág. 153/156), a parte autora pleiteia a concessão
da “aposentadoria por invalidez” desde 30/08/2012, data do requerimento administrativo
indeferido sob NB 553.032.615-0 (ID 102665334 – pág. 11), bem como a majoração do
percentual honorário para 15%.
Também insatisfeito, o INSS interpôs recurso de apelação (ID 102665334 – pág. 161/163),
requerendo a decretação de improcedência da ação, porquanto o perito, no bojo do laudo, teria
afirmado a inexistência de incapacidade laboral.
Devidamente processados os recursos, com o oferecimento de contrarrazões pela parte autora
(ID 102665334 – pág. 168/172), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007478-20.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: ANA HELENA BONATI CANCIAN
Advogado do(a) APELANTE: CASSIANO TADEU BELOTO BALDO - SP205848-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de “aposentadoria
por invalidez” será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de “auxílio-
doença”, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade
que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o “auxílio-doença” é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de “auxílio-
doença” e “aposentadoria por invalidez”.
Do caso concreto.
Cumpre ressaltar que o preenchimento dos requisitos atinentes às qualidade de segurado e
carência legal restara incontroverso, na medida em que o INSS não impugnara o capítulo da
sentença que os reconhecera.
Por sua vez, referentemente à inaptidão laboral, da perícia médico-judicial realizada em
14/10/2014, posteriormente complementada (ID 102665334 – pág. 81/93, 111), infere-se que a
parte autora - contando com 61 anos à ocasião (ID 102665334 – pág. 08), de profissão
declarada “costureira - autônoma” (inclusive na exordial) - padeceria de diminuição da acuidade
visual à direita (déficit visual decorrente de sequela de descolamento de retina), compensada
com o olho esquerdo, com lentes corretivas; hipertensão arterial sistêmica e diabetes
controladas com medicamentos.
Acrescentou que as patologias que acometem a autora são passíveis de controle clínico e que
a autora tem orientações para não realizar atividades que necessitem de muito esforço físico.
Afirmou, o perito, e em resposta aos quesitos formulados (ID 102665334 – pág. 33/34, 56/57,
97), que a parte autora não apresentaria incapacidade laborativa no momento da perícia.
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre
convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou
científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos
robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto.
Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas
partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se
vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração
do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000,
Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo
Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Os documentos médicos carreados pela parte demandante (ID 102665334 – pág. 12/14, 16/17,
85/93) não confrontam as conclusões periciais.
A perícia médico-judicial foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual
respondera satisfatoriamente aos quesitos elaborados, fornecendo diagnóstico com base na
análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como
efetuando demais avaliações que entendera pertinentes, sendo certo que, não sendo infirmada
pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
De leitura minudente do parecer especializado, revela-se panorama não-condizente com quadro
de incapacidade laborativa, merecendo, pois, total reforma o julgado de Primeiro Grau.
Ressalte-se, outrossim, a inocuidade da oitiva de testemunhas (ID 102665334 – pág. 136/138)
no tocante à caracterização da incapacidade laborativa, cuja demonstração dar-se-á por meio
de elementos exclusivamente médico-periciais.
Observo, por fim, a concessão da tutela antecipada.
Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória
deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado,
conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) é tema, cuja
análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo (STJ,
Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia
constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o
derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo
ao andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo
juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
Ante o exposto, nego provimento ao apelo da parte autora e dou provimento à apelação do
INSS, para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, com a
revogação da tutela anteriormente concedida.
Inverto o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas
processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários
advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a
exigibilidade suspensa por cinco anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de
recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita (ID
102665334 – pág. 19), a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50,
reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso
excepcional ou a certificação do trânsito em julgado.
É como voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Com fundamento na
ausência de incapacidade laboral, o Ilustre Relator votou no sentido de reformar a sentença que
concedeu o benefício de aposentadoria por invalidez.
E, a par do respeito e da admiração que nutro pelo Ilustre Relator, dele divirjo.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que,
após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por
incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no
caso de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual
por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).
No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício
provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a
reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade
for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por
invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está
dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de
qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e
afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da
carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em14/10/2014, constatou que a parte
autora, costureira, idade atual de 64 anos, é portadora de perda acuidade visual à direita, em
razão de sequela de descolamento da retina, compensada pelo olho esquerdo com lentes
corretivas, não estando incapacitada para o exercício de sua atividade habitual, como se vê do
laudo constante do ID102665334, págs. 81-83.
Não obstante a conclusão a que chegou o perito judicial, é de se levar em conta que a parte
autora exerce atividade laboral como costureira autônoma, atividade que exige acuidade visual.
E a sua limitação certamente a coloca em situação de desvantagem em relação a outros
profissionais dentro do competitivo mercado de trabalho, o que conduz à conclusão de que ela,
na verdade, está incapacitada de forma permanente para o exercício desua atividade habitual.
Há que se considerar, também, os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais da
segurada, sendo certo que, no caso concreto, a parte autora exerceu, por toda vida, apenas
atividade como costureira, e conta, atualmente, com idade de 64 anos, não tendo condição e
aptidão intelectual para se dedicar a outra profissão.
Destaco que o magistrado não está adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem
o artigo 436 do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, podendo também considerar, como no
caso, outros elementos de prova constantes dos autos.
Desse modo, considerando que a parte autora, conforme conjunto probatório constante dos
autos, não tem condições de trabalhar, não sendo possível a recuperação da sua capacidade
laboral e não tendo ela condições de se reabilitar para o exercício de outra atividade que lhe
garanta o sustento, é possível a concessão da aposentadoria por invalidez, até porque
preenchidos os demais requisitos legais.
Nesse sentido, é o entendimento firmado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
... a jurisprudência do STJ alinhou-se no sentido de que, para a concessão da aposentadoria
por invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela
incapacidade laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais
do segurado.
(AgInt nos EDcl no AREsp nº 884.666/DF, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe
08/11/2016)
Quanto ao preenchimento dos demais requisitos (condição de segurado e cumprimento da
carência), a matéria não foi questionada pelo INSS, em suas razões de apelo, devendo
subsistir, nesse ponto, o que foi estabelecido pela sentença.
O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento administrativo
ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-
doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
No caso, o termo inicial do benefício fica mantido em 31/07/2013, dia seguinte ao da cessação
administrativa.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho
de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal,
quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na
sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos
de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta
Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento
pacificado nos Tribunais Superiores.
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Não obstante a matéria que trata dos honorários recursais tenha sido afetada pelo Temanº
1.059 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que determinou a suspensão do processamento
dos feitos pendentes que versem sobre essa temática, é possível, na atual fase processual,
tendo em conta o princípio da duração razoável do processo, que a matéria não constitui objeto
principal do processo e que a questão pode ser reexaminada na fase de liquidação,a fixação do
montante devido a título de honorários recursais, porém, deixando a sua exigibilidade
condicionada à futura deliberação sobre o referido tema, o que será examinado oportunamente
peloJuízo da execução.
Assim, desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na
sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do
CPC/2015. Por outro lado, não tendo sido a parte apelante, em primeira instância, condenada
em honorários advocatícios, não há que se falar, em relação a ela, em majoração da verba
honorária de sucumbência (STJ, AgInt no AREsp nº 1.300.570/ES, 1ª Turma, Relator Ministro
Sérgio Kukina, DJe 29/08/2018).
Ante o exposto, divergindo do voto do Ilustre Relator, para manter a concessão de
aposentadoria por invalidez, NEGO PROVIMENTO aos apelos, condenando o INSS ao
pagamento de honorários recursais, na forma antes delineada, e DETERMINO, DE OFÍCIO, a
alteração de juros de mora e correção monetária, nos termos expendidos nesta declaração de
voto. Mantenho, quanto ao mais, a sentença apelada.
É COMO VOTO.
/gabiv/asato
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
DOENÇA. QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA. TEMAS INCONTROVERSOS NOS
AUTOS. LAUDO MÉDICO-PERICIAL. INCAPACIDADE LABORATIVA NÃO-COMPROVADA.
BENEFÍCIO INDEVIDO. RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO. APELAÇÃO DO INSS
PROVIDA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO.
AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER
DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º
estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12
(doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
8 - O preenchimento dos requisitos atinentes às qualidade de segurado e carência legal restara
incontroverso, na medida em que o INSS não impugnara o capítulo da sentença que os
reconhecera.
9 - Referentemente à inaptidão laboral, da perícia médico-judicial realizada em 14/10/2014,
posteriormente complementada, infere-se que a parte autora - contando com 61 anos à
ocasião, de profissão declarada “costureira - autônoma” (inclusive na exordial) - padeceria de
diminuição da acuidade visual à direita (déficit visual decorrente de sequela de descolamento de
retina), compensada com o olho esquerdo, com lentes corretivas; hipertensão arterial sistêmica
e diabetes controladas com medicamentos.
10 - Acrescentou que as patologias que acometem a autora são passíveis de controle clínico e
que a autora tem orientações para não realizar atividades que necessitem de muito esforço
físico.
11 - Afirmou, o perito, e em resposta aos quesitos formulados, que a parte autora não
apresentaria incapacidade laborativa no momento da perícia.
12 - O juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do
CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção
das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente
jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que
infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros
documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se
aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o
destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame.
Precedentes.
13 - Documentos médicos carreados pela parte demandante não confrontam as conclusões
periciais.
14 - A perícia médico-judicial foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual
respondera satisfatoriamente aos quesitos elaborados, fornecendo diagnóstico com base na
análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como
efetuando demais avaliações que entendera pertinentes, sendo certo que, não sendo infirmada
pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
15 - Do parecer especializado, revela-se panorama não-condizente com quadro de
incapacidade laborativa, merecendo, pois, total reforma o julgado de Primeiro Grau.
16 - Inocuidade da oitiva de testemunhas no tocante à caracterização da incapacidade
laborativa, cuja demonstração dar-se-á por meio de elementos exclusivamente médico-periciais.
17 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
18 - Condenada a autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente
desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais se arbitra em
10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5
(cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a
concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º,
e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
19 - Apelação do autor desprovida. Apelação do INSS provida. Sentença reformada.
Revogação da tutela. Devolução de valores. Juízo da execução. Ação julgada improcedente.
Inversão das verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO
JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO
AO APELO DA PARTE AUTORA E, POR MAIORIA, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO
INSS, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, COM QUEM VOTARAM O DES. FEDERAL
TORU YAMAMOTO, O DES. FEDERAL PAULO DOMINGUES E O DES. FEDERAL DAVID
DANTAS, VENCIDA A DES. FEDERAL INÊS VIRGÍNIA QUE NEGAVA PROVIMENTO AO
APELO DO INSS, E DETERMINAVA, DE OFÍCIO, A ALTERAÇÃO DE JUROS DE MORA E
CORREÇÃO MONETÁRIA.
LAVRARÁ O ACÓRDÃO O RELATOR.
SUSTENTOU ORALMENTE, POR VIDEOCONFERÊNCIA, O DR. CASSIANO TADEU
BELOTO BALDO
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
