Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2010389 / SP
0005439-65.2012.4.03.6106
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
10/06/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
INCAPACIDADE CONFIGURADA. CONTEXTO SOCIOECONÔMICO. HISTÓRICO LABORAL.
IMPROVÁVEL REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. SÚMULA 47 DO TNU. PRECEDENTE DO
STJ. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA INCAPACIDADE LABORAL.
IMPOSSIBILIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO
DO DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
PRECEDENTES DESTA CORTE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. REMESSA
NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE.
1 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por
invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12
(doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a
subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o
prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e
vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação
(§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
5 - Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após
filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas
taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o
deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual pode ser prorrogado por
24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, nos
termos do art. 15 e §1º da Lei.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 6 (seis)
contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência,
para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da
Lei nº 8.213/91, incluído pela Lei nº 13.457/2017).
9 - O laudo pericial de fls. 73/82, elaborado em 19/11/12 e complementado às fls. 114/115,
diagnosticou a parte autora como portadora de "retinopatia diabética e visão subnormal de
ambos os olhos". Salientou que o autor está incapacitado para atividades que exijam esforços
físicos e visão binocular. Concluiu pela incapacidade parcial e permanente. Não fixou a data de
início da incapacidade. Contudo, conforme relatório médico de fl. 29, depreende-se que o autor
estava incapacitado na data da cessação do auxílio-doença (19/11/12). No caso, considerando-
se que o autor trabalha como vendedor ambulante (autônomo), depreende-se que estão
presentes os fatores de risco, pois necessita realizar esforços físicos (soerguimentos de peso),
além de boa acuidade visual, já que viaja com seu veículo para fazer entregas e preenche
documentos (fl. 141). Além disso, conforme laudo médico de fl. 86, o autor apresenta perda de
audição por transtorno de condução e/ou neuro-sensorial.
10 - Sendo assim, afigura-se bastante improvável que quem sempre desempenhou a atividade
de comerciário/vendedor de sacolas plásticas, que possui apenas o ensino fundamental (fl. 85)
e que conta, atualmente com mais de 61 (sessenta e um) anos, vá conseguir após reabilitação,
capacitação e treinamento, recolocação profissional em funções que não exijam esforços físicos
e boa acuidade visual.
11 - Dessa forma, tem-se que o demandante é incapaz e totalmente insusceptível de
reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência, sobretudo, em virtude
do seu contexto socioeconômico e histórico laboral, sendo de rigor a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez.
12 - Análise do contexto social e econômico, com base na Súmula 47 da Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais e da jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça: STJ - AgRg no Ag: 1270388 PR 2010/0010566-9, Relator: Ministro JORGE MUSSI,
Data de Julgamento: 29/04/2010, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2010.
13 - Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a
ausência da remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não
consegue exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade
temporária ou definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade
remunerada, após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação e na
necessidade de devolução das parcelas recebidas durante o período que o segurado auferiu
renda. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao
enriquecimento ilícito e da coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o
legislador no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
14 - Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter
de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária de lhe conceder o
benefício vindicado, por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo
pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra
alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento
da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura
má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade
e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser
humano.
15 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com
recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos
valores do benefício devido no período em que laborou e recolheu contribuições. Até porque,
nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho,
absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à
margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do
regime. Precedentes.
16 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
17 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
18 - Honorários advocatícios. De acordo com o entendimento desta Turma, estes devem ser
calculados sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula nº
111 do Superior Tribunal de Justiça).
19 - Apelação do INSS desprovida. Remessa necessária parcialmente provida. Sentença
parcialmente reformada. Ação julgada parcialmente procedente.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação do INSS e dar parcial provimento à remessa necessária para estabelecer que a
correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros
de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o
mesmo Manual e que os honorários advocatícios serão calculados até a data da prolação da
sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
