
| D.E. Publicado em 19/02/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade e de ofício, em atenção ao determinado no REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, extinguir o processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do mesmo diploma legislativo (art. 485, IV, do CPC/2015), diante da não comprovação do trabalho rural; por conseguinte, julgar prejudicados os apelos do INSS e do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002628-30.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, e por AGNALDO JOSÉ DA SILVA, representado por sua curadora, em ação por este ajuizada, objetivando a concessão de benefício de aposentadoria rural por invalidez.
A r. sentença, de fls. 105/108, julgou procedente o pedido para o fim de condenar o INSS a conceder ao autor a aposentadoria por invalidez rural a partir da juntada do laudo pericial em 27/10/2009. Deixou consignado que as parcelas em atraso deverão ser pagas de uma só vez com correção do débito de acordo com a alteração legislativa imposta pela Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º F da Lei nº 9.494/97, calculado de forma decrescente. Sem Custas e com condenação do INSS no pagamento das despesas processuais porventura existentes, inclusive honorários advocatícios, estes fixados em R$ 700,00, atualizáveis desde a sentença até o efetivo pagamento.
Em razões recursais às fls. 112/119, o autor postula pela alteração do termo inicial do benefício para a data do requerimento administrativo, em 02/02/1997.
Por sua vez, em razões recursais às fls.121/129, o INSS postula inicialmente, pelo apensamento destes, ao processo de pensão por morte 780/2009, tendo em vista que o acolhimento de um, implica na exclusão do outro. No mérito, requer o afastamento do benefício de aposentadoria por invalidez, em razão de a parte autora não ter juntado um único início de prova material para comprovar a atividade rural, sendo impossível seu reconhecimento como lavrador, não devendo o benefício ser concedido baseado exclusivamente em prova testemunhal. Subsidiariamente, requer a diminuição dos honorários advocatícios para R$ 500,00.
Devidamente intimados, a parte autora e o INSS apresentaram contrarrazões respectivamente às fls. 131/135 e 137/141.
Parecer do Ministério Público Estadual às fls. 144/145, pelo não provimento dos recursos.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Parecer do Ministério Público Federal às fls. 150/152, pelo desprovimento do recurso de apelação da parte autora e pelo provimento do recurso do INSS.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em exame pericial de fls. 92/98, diagnosticou o autor como portador de "distúrbio psiquiátrico com debilidade mental".
Relatou, em resposta ao quesito da parte autora, quanto ao grau de incapacidade que se trata de: "incapacidade laborativa total e definitiva".
Acrescentou também que: "o periciando é incapaz desde os 6 anos de idade e nunca exerceu qualquer atividade laborativa até esta data".
Por fim, em resposta ao quesito do juízo fixou a data do início da incapacidade desde os 6 anos de idade.
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
No entanto, a despeito da incapacidade constatada, verifico que o perito apontou que a doença existe desde os 6 (seis) anos de idade e, que o autor "nunca exerceu qualquer atividade laborativa", que embora reforce a alegação de incapacidade, contraria o argumento de que ele era trabalhador rural.
O autor não acostou um único início de prova material em seu nome e os documentos juntados às fls. 19 e 77 são frágeis em comprovar sua atividade rural, eis que estão em nome de seu falecido pai e de sua curadora.
Realizada audiência de instrução e julgamento, em 04/08/2010 (fls. 105/110), foram coletados os depoimentos das testemunhas por ele arroladas, as quais forneceram poucas e imprecisas informações sobre o suposto desempenho de atividade laboral, não sendo possível inferir a filiação deste, na qualidade de rurícola, junto ao RGPS nos períodos por elas indicados.
A testemunha Olegário Socorro da Silva alegou que: "Conhece o autor desde que ele era criança e ainda quando era criança se mudou com o pai para o Estado de Mato Grosso e ali trabalhava um pouco com o pai na roça. Ocorre que o autor ficou doente e voltou para o Estado de São Paulo, passando a morar juntamente com os avós e a tia Maria, atual curadora do mesmo, a fim de fazer o tratamento de saúde. Depois que passou a morar com esta era ela quem cuidava do autor e era responsável pelas despesas financeiras dele; porém o pai ajudava sempre que podia mandando dinheiro. O autor mora num sítio com a tia e até hoje consegue fazer algum serviço desde que a tia o oriente. Não é um trabalho de pessoa normal. É algum serviço pequeno do tipo tratar de algum animal, mas a tia tem que estar sempre orientando senão ele não consegue fazer. Há cerca de cinco anos o problema de saúde do autor se agravou. Antes de se agravar o autor trabalhava na roça um pouco (...) O autor sempre precisou da orientação de algum familiar para conseguir trabalhar. Sozinho ele não conseguia trabalhar. A propriedade da família do autor em Populina é de cerca de quinze alqueires de terra e quem trabalha ali é somente a família. Quando tinha trabalho na propriedade os membros da família trabalhavam para vizinhos, mas o autor não trabalhava para vizinhos , porque normalmente o patrão não gostava devido ao problema de saúde dele" (fl. 104).
Eurico Amancio do Carmo afirmou que: " O depoente conhece o autor e sabe que ele mora em um sítio em Populina, nesta comarca. O sítio é de cerca de dez alqueires de terra e nele trabalhava a família tocando roças de arroz e milho. Não havia empregados. O autor ali trabalhou até pouco tempo antes da morte do pai ocorrida em 1996. Em tal época o autor passou a sofer de problema de saúde e teve que parar de trabalhar. O autor tem "problema de cabeça" (...) além de trabalhar no sitio o autor trabalhava pra vizinhos, mas não dava muito conta de trabalhar. O depoente já viu o autor trabalhar para João Boga e Dr. Alfredo. Viu isso umas duas vezes ou três vezes. Quem estava junto com o autor na ocasião era a atual curadora maria, sendo que esta também trabalhava. " (fl. 110).
Há inconsistências nos depoimentos que são frágeis a comprovar o labor rural do autor, eis que tem distúrbios psiquiátricos incapacitantes desde os 6 anos de idade.
Apesar da desnecessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período em que se presente reconhecer em juízo, o substrato material deve ser minimamente razoável e harmônico com os depoimentos colhidos em audiência, sob pena de aceitação da comprovação do período laborado exclusivamente por prova testemunhal, em clara afronta ao disposto na Lei (Súmula 149 do STJ).
In casu, o autor não só deixou de juntar provas materiais mínimas do seu labor rural, como os depoimentos das testemunhas por ele arroladas foram, em sua maior parte, vagos e, na parte que não o eram, trouxeram dados que corroboraram o fato de o autor nunca ter possuído condições de desempenhar o labor rural, em consequência de seu problema de saúde.
Mesmo compadecido da situação, tenho de destacar que ao Poder Judiciário compete a aplicação da solução legal prevista, sob pena de subversão do sistema e indevida incursão na seara legislativa. Afastada a qualidade de segurado, indevido o benefício previdenciário, o que não significa, entretanto, que não exista outra forma de se buscar no ordenamento jurídico amparo estatal, como por exemplo a via do benefício assistencial de prestação continuada (LOAS), que prescinde do recolhimento de contribuições.
Por fim, diante da não demonstração do trabalho desenvolvido na lide campesina, quanto ao período de interesse, imperiosa a extinção da demanda, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a propositura de nova ação, caso o requerente venha a conseguir documentos que comprovem o labor desenvolvido na qualidade de rurícola, pelo período de carência exigido em lei.
Nesse sentido, transcrevo o entendimento consolidado do C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973:
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado dos embargos, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Ante o exposto, de ofício, em atenção ao determinado no REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, extingo o processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do mesmo diploma legislativo (art. 485, IV, do CPC/2015), diante da não comprovação do trabalho rural; por conseguinte, julgo prejudicados os apelos do autor e do INSS.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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