
| D.E. Publicado em 17/08/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, para reformar a r. sentença de 1º grau, julgar improcedente o pedido, revogar a tutela concedida e autorizar a cobrança pelo INSS dos valores recebidos pela autora a título de tutela antecipada, conforme inteligência dos artigos 273, §3º e 475-O do CPC/73, aplicável à época, limitando-se, porém, o ressarcimento a 10% (dez por cento) do valor do benefício previdenciário a ela devido, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021214-86.2009.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por MARIA DE LURDES MORAIS BUENO, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou, sucessivamente, de auxílio-doença.
A r. sentença, de fls. 90/93, julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária na concessão de aposentadoria por invalidez, desde a data da juntada do laudo médico. Determinou-se que as prestações em atraso sejam acrescidas de correção monetária e de juros de mora, à razão de 1% (um por cento) ao mês. Honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, conforme a Súmula 111 do STJ. Deferida a antecipação da tutela, para permitir a imediata implantação do benefício (fls. 93). Não houve remessa necessária, em virtude de aplicação da exceção prevista no artigo 475, §2º, do Código de Processo Civil de 1973.
Em razões recursais de fls. 96/107, o INSS alega, em síntese, não terem sido satisfeitos os requisitos para a concessão do benefício, já que a incapacidade laboral, caso exista, é preexistente à filiação da parte autora à Previdência Social, sendo, portanto, aplicáveis as vedações previstas nos artigos 59, parágrafo único, e 42, §2º, da Lei 8.213/91. Subsidiariamente, pede a redução dos honorários advocatícios para 5% (cinco por cento) do valor das prestações vencidas até a data da prolação da sentença. Prequestiona a matéria para fins recursais.
A parte autora apresentou contrarrazões às fls. 113/115.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
No que tange à incapacidade, o perito médico indicado pelo Juízo, com base em exame pericial de fls. 74/84, elaborado em 25/2/2009, diagnosticou a parte autora como portadora de "bócio multinodular e hipertensão arterial", concluindo o expert "a incapacidade para o trabalho é total e permanente. Não haverá melhora clínica e não tem condições de readaptação ou reabilitação" (resposta aos quesitos n. 1 e 4 do INSS - fl. 64).
Consignou que a data de início da incapacidade laboral remonta a março de 2008 (resposta ao quesito n. 13 do INSS - fl. 82).
O extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais de fls. 65 comprova, entretanto, que ela efetuou recolhimentos previdenciários apenas e tão somente nos períodos de 01/5/2006 a 30/6/2008, de 01/7/2008 a 31/10/2008 e de 01/11/2008 a 31/3/2009.
Não se me afigura crível, no entanto, que os males mencionados no laudo tenham tornado a autora incapaz para o exercício de atividade remunerada após o seu ingresso no RGPS.
Acerca do bócio multinodular, artigo publicado no site oficial da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia revela tratar-se de doença causada por consumo deficiente de iodo (http://www.tireoide.org.br/um-panorama-sobre-o-bocio-multinodular/):
Ao se referir ao histórico da doença, o perito judicial informou que a autora sofreu intervenção cirúrgica, uma "Tireoidectomia total", em 22/10/2007 (fl. 76), ou seja, apenas 5 (cinco) meses após ter completado a carência mínima para a concessão do benefício.
Lembro, por oportuno, que prevalece no direito processual civil brasileiro o livre convencimento motivado. Assim, o magistrado não está adstrito ao laudo, podendo reinterpretar os dados obtidos pelo perito judicial à luz dos princípios jurídicos que devem reger a questão. Ademais, frise-se que, para concluir como leigo, não necessita o juízo de opinião técnica, eis que o julgador pode muito bem extrair as suas convicções das máximas de experiências subministradas pelo que ordinariamente acontece (arts. 335 do CPC/1973 e 375 do CPC/2015).
Ora, sabe-se que intervenções cirúrgicas demandam, em regra, uma série de exames preparatórios, os quais pressupõe, inclusive, um quadro patológico relativamente já consolidado. Ademais, depreende-se do artigo da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, mencionado alhures, que a deficiência no consumo de iodo não provoca imediatamente a eclosão do bócio multinodular, já que "10 a 15% dos bócios tornam-se detectáveis clinicamente entre 7 e 20 anos após o início da disfunção tireoidiana". A doença, portanto, depende de certa evolução, inclusive para que seja clinicamente detectada e tratada.
Assim, se me afigura pouco crível que os males mencionados, por sua própria natureza, tenham tornado a parte autora incapaz justamente no período em que havia completado a carência legal de 12 (doze) contribuições, após maio de 2007.
Note-se que a autora somente veio a promover recolhimentos junto à Previdência Social, para fins de ingresso no sistema na qualidade contribuinte individual, quando já possuía mais de 65 (sessenta e cinco anos) anos de idade, em setembro de 2000, o que, somado aos demais fatos relatados, aponta que os males são preexistentes a sua filiação, além do seu notório caráter oportunista.
Ressalta-se, ainda, que a demandante efetuou as contribuições previdenciárias justamente nos 18 (dezoito) meses anteriores ao requerimento administrativo do benefício (NB: 5608688160), no período de 01/5/2006 a 22/10/2007, com deliberado intento de propiciar artificiosamente a implementação dos requisitos necessários à percepção dos benefícios vindicados.
Assim, observo que a incapacidade da parte-autora é preexistente ao tempo em que reingressou no sistema de seguridade. A esse propósito, inicialmente é necessário frisar que a Seguridade Social brasileira está construída sobre os parâmetros jurídicos da solidariedade, de modo que a seguro social depende do cumprimento de um conjunto de requisitos distribuídos por toda sociedade e também para o Estado, especialmente por trabalhadores, sendo certo que as contribuições necessárias ao custeio desse conjunto de benefícios pecuniários devem ser recolhidas mesmo quando o trabalhador não está acometido de doenças incapacitantes.
Não havendo contribuições por parte dos trabalhadores (contribuintes obrigatórios ou facultativos) sob a lógica solidária que mantém o sistema de seguridade, e se esses trabalhadores só fazem discretas contribuições quando já estão acometidos de doenças incapacitantes, por certo o benefício previdenciário não é devido à luz da Lei 8.213/1991 e da própria lógica constitucional da Previdência.
Diante de tais elementos, aliados às máximas de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece, conforme expressamente dispõe o art. 335 do CPC/73, inevitável a conclusão de que, quando já incapaz de exercer suas atividades habituais, decidiu a parte autora reingressar no RGPS com o objetivo de buscar, indevidamente, proteção previdenciária que não lhe alcançaria, conforme vedações constantes dos artigos 42, §2º e 59, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213/91.
Por fim, acresça-se que o fato de o INSS ter lhe concedido anteriormente o benefício não tem o condão de chancelar a sua filiação ao RGPS, pois um erro não justifica o outro. Além do mais, acolher tal argumentação implicaria, por vias transversas, em se impedir que a Administração corrigisse os seus próprios equívocos e potenciais ilegalidades, fazendo com que tais condutas se perpetuassem no tempo.
Destarte, verificada a preexistência da incapacidade laboral, de rigor o indeferimento do pedido.
Observo que a sentença concedeu a tutela antecipada, assim, a situação dos autos adequa-se àquela apreciada no recurso representativo de controvérsia REsp autuada sob o nº 1.401.560/MT.
O precedente restou assim ementado, verbis:
Revogo os efeitos da tutela antecipada concedida (fl. 95/96) e aplico, portanto, o entendimento consagrado pelo C. STJ no mencionado recurso repetitivo representativo de controvérsia e reconheço a repetibilidade dos valores recebidos pela autora por força de tutela de urgência concedida, a ser vindicada nestes próprios autos, após regular liquidação.
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS, para reformar a r. sentença de 1º grau, julgar improcedente o pedido, revogar a tutela concedida e autorizar a cobrança pelo INSS dos valores recebidos pela autora a título de tutela antecipada, conforme inteligência dos artigos 273, §3º e 475-O do CPC/73, aplicável à época, limitando-se, porém, o ressarcimento a 10% (dez por cento) do valor do benefício previdenciário a ela devido, nos termos do artigo 115, II e §1º da Lei nº 8.213/91.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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