Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5119903-65.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
21/05/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 22/05/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ RURAL. INÍCIO
DE PROVA MATERIAL INEXISTENTE. PROVA TESTEMUNHAL ISOLADA NÃO COMPROVA
ATIVIDADE RURAL. BENEFÍCIO INDEVIDO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO
MÉRITO (RESP Nº 1.352.721/SP).
1. Para a comprovação da atividade rural é necessária a apresentação de início de prova
material, corroborável por prova testemunhal (art. 55, § 3.º, da Lei 8.213/91 e Súmula 149 do
Superior Tribunal de Justiça).
2. Ainda que exista início de prova material do trabalho rural do companheiro da autora, restou
comprovado que ele passou a exercer atividades urbanas, o que afasta sua condição de
trabalhador rural.
3. Não existindo ao menos início de prova material da atividade rural, desnecessária a incursão
sobre a credibilidade ou não da prova testemunhal, posto que esta, isoladamente, não se presta à
declaração de existência de tempo de serviço rural.
4. Conforme entendimento desta Egrégia Décima Turma, à falta de apresentação de documento
indispensável ao ajuizamento da ação (art. 320 do Novo CPC), acarreta a extinção do processo
sem resolução do mérito, com fundamento na ausência de pressuposto de constituição e
desenvolvimento válido do processo.
5. Tese fixada pelo E. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial
1.352.721/SP, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Representativo de Controvérsia.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
6. Extinção do feito, de ofício, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, IV, do atual
CPC. Prejudicada a apelação da parte autora.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5119903-65.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: ANGELINA DE FATIMA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA DANTAS FURLANETO - SP334177-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5119903-65.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: ANGELINA DE FATIMA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA DANTAS FURLANETO - SP334177-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento
de natureza previdenciária, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-
doença, sobreveio sentença improcedência do pedido, condenando-se a parte autora ao
pagamento das verbas de sucumbência, observada sua condição de beneficiária da assistência
judiciária gratuita.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação pugnando pela reforma da sentença,
para que seja julgado procedente o pedido, sustentando o cumprimento dos requisitos legais para
a concessão dos benefícios postulados.
Sem as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5119903-65.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: ANGELINA DE FATIMA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDA DANTAS FURLANETO - SP334177-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, recebo o recurso
de apelação da parte autora, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do novo
Código de Processo Civil.
Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez, de acordo com o artigo 42, caput
e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os que se seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da
carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de
atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existente antes da
filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento
daquelas. Enquanto que, de acordo com os artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, o benefício de
auxílio-doença é devido ao segurado que fica incapacitado temporariamente para o exercício de
suas atividades profissionais habituais, bem como àquele cuja incapacidade, embora
permanente, não seja total, isto é, haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que
garanta o seu sustento.
Em se tratando de segurado especial, a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que
de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, afasta a
sujeição à carência, desde que tal exercício tenha ocorrido em período igual ao número de meses
correspondentes ao da carência do benefício pleiteado, nos termos do art. 26, inciso III, c.c. inciso
I do art. 39 da Lei n° 8.213/91.
O Superior Tribunal de Justiça também já decidiu:
"O trabalhador rural, na condição de segurado especial, faz jus não só à aposentadoria por
invalidez, como também a auxílio-doença, auxílio-reclusão, pensão e aposentadoria por idade,
isentas de carência, no valor equivalente a um salário-mínimo" (REsp n° 416658/SP, Relatora
Ministra Laurita Vaz, j. 01/04/2003, DJ 28/04/2003, p. 240).
Nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91 e de acordo com a jurisprudência
consubstanciada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, é possível a comprovação do
trabalho rural mediante a apresentação de início de prova documental, devendo esta ser
complementada por prova testemunhal.
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não
significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de
documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir
que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade
a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim
começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da
situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios.
Entretanto, no caso em análise, a autora não trouxe aos autos razoável início de prova material
do alegado trabalho rural.
Mesmo se entendendo constituir início de prova material as cópias das certidões de nascimento
dos filhos da autora, nas quais seu companheiro foi qualificado profissionalmente como lavrador
(Ids. 11395339, 11395341 e 11395343), verifica-se que ele passou a exercer atividades urbanas,
conforme se verifica na cópia de sua CTPS, na qual consta anotação de contrato de trabalho na
função de “auxiliar de serviços gerais”, CBO 991405 (Id. 11395359). Tal fato afasta a condição de
trabalhador rural.
A admissão de documento em nome do marido ou companheiro, extensível à mulher, dá-se em
consideração ao exercício da atividade que se presume ser comum ao casal. Se o marido deixou
a lida rural, não se pode afirmar que a mulher continuou exercendo atividade rural nesse regime.
Por outro lado, se a autora passou a exercer a atividade rural independente, há necessidade de
que traga para os autos início de prova material dessa condição após o início da atividade urbana
de seu marido, o que não é o caso dos autos.
Portanto, não existindo outro documento que indique o exercício de atividade rural em período
mais recente, posterior ao trabalho urbano ou contemporâneo ao período de carência,
desnecessária a incursão sobre a credibilidade ou não da prova testemunhal, uma vez que esta,
isoladamente, não se presta à declaração de existência de tempo de serviço rural.
Com relação à matéria, o E. Superior Tribunal de Justiça, ao julgar, em 16/12/2015, o Recurso
Especial Repetitivo nº 1.352.721/SP, de Relatoria do Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,
firmou entendimento no sentido de que a ausência de documento comprobatório do exercício de
atividade rural, autoriza a extinção do processo sem resolução de mérito, com fundamento na
falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, oportunizando o
ajuizamento de nova demanda:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS
ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL
DO INSS DESPROVIDO. 1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística
civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as
peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida
metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade
Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam
judicialmente os benefícios previdenciários. 2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas
de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do
Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem
ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui
proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se
procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter
social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude
do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado. 3. Assim como ocorre
no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do
especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio
da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas. 4. A
concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido
constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito
fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o
trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do
recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão
de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social. 5.
A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa. 6. Recurso Especial do INSS desprovido."
Assim, considerando que é certo que os trabalhadores rurais têm dificuldades para obtenção de
documentos comprobatórios de suas atividades agrícolas e por tratar-se de natureza alimentar,
sendo a previdência social direito fundamental assegurado pela Constituição Federal, as normas
do Direito Processual Civil devem ser flexibilizadas, de forma favorável ao amparo dos
vulneráveis.
Vale dizer que, sendo imprescindível a produção de início de prova material para o ajuizamento
da demanda, nos termos do art. 320 do CPC/2015, é insuficiente a prova exclusivamente
testemunhal, na esteira da Súmula 149 do E.STJ, portanto constitui-se ausência de pressupostos
para o desenvolvimento válido da ação.
Sendo assim, esta Egrégia Décima Turma, orientando-se pela tese acima firmada, passou a
decidir que diante da ausência de início de prova material, não deve o pedido ser julgado
improcedente, mas extinto o feito sem julgamento de mérito, nos termos dos artigos 485, IV, e
320, do Novo Código de Processo Civil.
Diante do exposto, nos termos dos artigos 485, IV, e 320, do Novo Código de Processo Civil, DE
OFÍCIO, JULGO EXTINTO O PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, restando
prejudicada a apelação da parte autora.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ RURAL. INÍCIO
DE PROVA MATERIAL INEXISTENTE. PROVA TESTEMUNHAL ISOLADA NÃO COMPROVA
ATIVIDADE RURAL. BENEFÍCIO INDEVIDO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO
MÉRITO (RESP Nº 1.352.721/SP).
1. Para a comprovação da atividade rural é necessária a apresentação de início de prova
material, corroborável por prova testemunhal (art. 55, § 3.º, da Lei 8.213/91 e Súmula 149 do
Superior Tribunal de Justiça).
2. Ainda que exista início de prova material do trabalho rural do companheiro da autora, restou
comprovado que ele passou a exercer atividades urbanas, o que afasta sua condição de
trabalhador rural.
3. Não existindo ao menos início de prova material da atividade rural, desnecessária a incursão
sobre a credibilidade ou não da prova testemunhal, posto que esta, isoladamente, não se presta à
declaração de existência de tempo de serviço rural.
4. Conforme entendimento desta Egrégia Décima Turma, à falta de apresentação de documento
indispensável ao ajuizamento da ação (art. 320 do Novo CPC), acarreta a extinção do processo
sem resolução do mérito, com fundamento na ausência de pressuposto de constituição e
desenvolvimento válido do processo.
5. Tese fixada pelo E. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial
1.352.721/SP, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Representativo de Controvérsia.
6. Extinção do feito, de ofício, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, IV, do atual
CPC. Prejudicada a apelação da parte autora. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu extinguir o processo, de oficio, sem resolucao de merito, restando
prejudicada a apelacao da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
