
| D.E. Publicado em 29/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à remessa necessária para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0034784-37.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença de fls. 136/138 julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária no pagamento do benefício de aposentadoria por invalidez, a partir da data da citação. As parcelas atrasadas serão acrescidas de correção monetária e de juros de mora. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Em suas razões recursais de fls. 140/144, o INSS sustenta que a parte autora não preenche os requisitos necessários à concessão do benefício.
Devidamente processado o recurso, com contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Depois da edição da Lei n. 8.213/91, a situação do rurícola modificou-se, já que passou a integrar um Sistema Único, com os mesmos direitos e obrigações dos trabalhadores urbanos, tornando-se segurado obrigatório da Previdência Social.
Quanto ao desenvolvimento de atividade laboral, exige a Lei n. 8.213/91 início de prova material para comprovar a condição de rurícola, excluindo-se a prova exclusivamente testemunhal para esse fim, entendimento consagrado igualmente pela Súmula 149 do STJ.
Sobre essa questão, é necessário destacar que o rol previsto no artigo 106 da Lei n. 8.213/91 não é taxativo, podendo, portanto, o postulante provar materialmente o exercício de atividade rural por meio de documentos não mencionados no referido dispositivo.
Em princípio, os trabalhadores rurais, na qualidade de empregados, não necessitam comprovar os recolhimentos das contribuições previdenciárias, devendo apenas provar o exercício da atividade laboral no campo pelo prazo da carência estipulado pela lei, tal como exigido para o segurado especial. Assim dispõe o art. 11, VII c/c art. 39, I, da Lei 8.213/91.
In casu, como início de prova material de seu labor rural, a autora apresentou os seguintes documentos:
- Certidão de casamento, datada de 07/05/99, em que consta a profissão do cônjuge como "lavrador" e da autora como "prendas domésticas". No verso, consta averbação de separação do casal em 29/05/95 (fl. 14);
- Contratos de arrendamento de uma gleba de terras de 19,36 hectares ou 8.0 alqueires, destinado à pastagem de bovinos, em nome do companheiro "MANOEL DA CUNHA VIANA", nos períodos de 01/02/00 a 31/01/02, 01/02/02 a 31/01/07 e 01/02/07 a 31/01/12 (fls. 19/21);
- Declarações cadastrais de produtor, em nome do companheiro, datadas de 29/03/00, 17/09/02 e 17/09/08 (fls. 22/24);
- Notas fiscais de produção em nome do companheiro, emitidas em ordem sequencial (n.º 65, 66 e 67), datadas de 21/12/07, 10/09/08 e 14/01/09, constando a venda de dez bovinos em 2007, oito em 2008 e nove em 2009 (fls. 25/27);
- Declarações de exercício de atividade rural prestadas por terceiros (fls. 28/29).
Consigna-se que não pode ser estendida, de forma automática, à parte autora a condição de rurícola atestada no documento relativo ao cônjuge (ANTÔNIO ASCENCIO).
Isso porque a extensão de efeitos em decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - parece-me viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, nos termos do artigo 11, inciso VII, da Lei n. 8.213/91, não sendo este o caso dos autos, em que a parte autora relata que o cônjuge laborava em usina, cortando cana.
Ademais, consta a separação do casal em 29/05/95 e o exercício de atividade urbana pela autora no período de 01/04/97 a 15/12/97 (fls. 15/16).
Acresça-se que as declarações emitidas por terceiros equivalem a mero depoimento escrito, de modo que não pode ser utilizado como início de prova material, sob pena de afronta ao disposto na Súmula 149 do STJ.
Contudo, apresenta-se viável o início de prova material relativo ao suposto exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, com o companheiro "MANOEL DA CUNHA VIANA", haja vista que trata-se de pequena gleba rural (inferior a quatro módulos fiscais) que comercializa pequena quantidade de gado, conforme notas fiscais acostadas.
Na audiência de instrução de fls. 131/134, realizada em 09/02/12, foram colhidos os depoimentos da autora e das testemunhas arroladas, veja-se:
Autora: Que a autora tirava leite; faz uns dois anos que não trabalha; quando trabalhava tirava leite, onde reside, mas é arrendado; que tirou leite por aproximadamente dez anos; que trabalhava na roça, depois trabalhou na usina durante seis anos, como cozinheira, mas isto ocorria nas safras a cada seis meses; atualmente reside numa fazenda, da sogra da depoente, há aproximadamente treze anos; que é amasiada com o Sr. Manoel da Cunha Viana, há dezesseis anos; antes disso era casada com Antônio Ascencio, com quem conviveu por aproximadamente vinte anos; que o Sr. Manoel da Cunha morava no sítio e ali trabalhava; Antônio Ascencio trabalhava na usina, cortando cana; não trabalha mais, porque foi abalroada por duas vacas que lhe feriram o ombro; estudou até o quarto ano incompleto; não sabe informar o tamanho da propriedade da sogra; ela não cria gado; ela aluga pasto; nesta fazenda a depoente tirava leite, de aproximadamente dez cabeças; não sabe informar quantas cabeças de gado atualmente são criadas na fazenda; que o nome da sua sogra é Vitória Fantini; que o esposo da autora arrendou nove alqueires de terras da própria mãe, sendo que nesses nove alqueires a depoente e o esposo ali residem; nesses nove alqueires, a depoente e o esposo criam nove vacas; sobrevivem desses nove alqueires (fl. 132).
Isaias dos Santos Pires: que o depoente conhece a autora; eram vizinhos de propriedade, quando pequenos, em 1980, o depoente retornou a General Salgado - SP como policial militar e hoje é aposentado como sargento; trabalhou nesta cidade de 1980 até à aposentadoria; de 1980 pra frente, a autora era casada e morava próxima a companhia militar, na zona urbana; o esposo da autora, daquela época, chamava-se Turcão, é falecido; atualmente a autora mora vizinha de uma propriedade do depoente, a qual convive com o Sr. Emanoel Viana; que ela é vizinha dessa propriedade há aproximadamente dez a doze anos; tanto ela como o marido sobrevivem do leite; desde que conhece a autora ela sempre foi trabalhadora de roça; tem conhecimento de que, por um certo período ela trabalhou na usina; a propriedade da qual a autora reside pertence a sogra, dona Vitória, cujo tamanho é de aproximadamente é de oito alqueires; não sabe o tamanho total da propriedade da sogra da autora, inclusive o depoente comprou uma parte dessas terras; acredita que a terra da dona Vitória gira em torno de uns cinquenta alqueires (fl. 133).
Darci Mazaro Cangani: que a depoente conhece a autora; eram vizinhas de propriedade quando pequenas; a depoente casou, morou em São Paulo, depois retornou; atualmente a autora reside no sítio, isso há aproximadamente dez anos; esse sítio pertence a genitora do esposo; é arrendado; há uns três anos, a depoente foi nessa fazenda e ela tirava leite; teve conhecimento de que a autora foi imprensada por uma vaca, ficou inválida; que eles não têm empregados, só os dois; que a depoente tem uma propriedade que fica um pouco próxima do sítio da autora; já foi nesse sítio várias vezes; que a autora e esposo tiram leite; não sabe informar qual é o tamanho total da propriedade da sogra da autora.
Desta forma, a prova testemunhal corroborou os documentos acostados aos autos, restando comprovado o labor rurícola em regime de economia familiar.
Assim, demonstrada a qualidade de segurada especial e o cumprimento da carência exigida para a concessão dos benefícios previdenciários pleiteados, passo à análise da incapacidade laboral.
No laudo médico de fls. 101/107, complementado às fls. 112/113, foi constatado que a autora é portadora de "luxação esterno/clavicular direita".
Concluiu o perito pela incapacidade total e definitiva, desde 05/01/09.
Destarte, tratando-se de incapacidade total e definitiva, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e dou parcial provimento à remessa necessária para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, a sentença de primeiro grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 19/06/2018 19:48:29 |
