D.E. Publicado em 09/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa necessária e à apelação do INSS, tão somente para fixar os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 24/10/2017 20:14:15 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0001299-86.2006.4.03.6109/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada por IZIDIO PORTILHO COELHO, objetivando o reconhecimento do trabalho especial, com consequente conversão em tempo comum, nos períodos de 10/10/1977 a 15/05/1978, 30/05/1978 a 06/02/1980 e 20/05/1980 a 05/03/1997.
A r. sentença de fls. 206/214, complementada pela decisão de fls. 222/223, julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a especialidade do labor desempenhado nos períodos alegados na inicial, condenando o INSS no pagamento e implantação da aposentadoria por tempo de contribuição, "desde que preenchidos os demais requisitos exigidos para tanto". Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. Concedida a antecipação de tutela para determinar ao INSS que proceda à averbação dos períodos de atividade especial reconhecidos pela sentença, devidamente convertidos em tempo comum. Sentença submetida à remessa necessária.
Em razões recursais de fls. 232/244, o INSS pleiteia a reforma da sentença, ao fundamento de que o uso de equipamento de proteção individual teria neutralizado o agente nocivo alegado, descaracterizando a atividade especial. Aduz, ainda, a impossibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum antes de 10/12/1980, bem como o não preenchimento do requisito etário no caso dos autos. Subsidiariamente, pede que o benefício tenha como data de início a citação, que os juros de mora sejam fixados com a observância do art. 1º-F da Lei 9.494/97 e, por fim, que a base de cálculo dos honorários advocatícios seja limitada às parcelas devidas até a data da sentença (Súmula 111 do C. STJ).
Contrarrazões da parte autora às fls. 250/258.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais, nos períodos de 10/10/1977 a 15/05/1978, 30/05/1978 a 06/02/1980 e 20/05/1980 a 05/03/1997.
Quanto ao período laborado na empresa "Auto Viação Jurema Ltda" (10/10/1977 a 15/05/1978), o formulário DSS - 8030 à fl. 24 demonstra que o autor, no exercício da função de "Cobrador", "trabalhava nas catracas dos ônibus cobrando passagens dos usuários das linhas", cabendo ressaltar que a ocupação do requerente encontra previsão no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64, sendo passível de reconhecimento como atividade especial pelo mero enquadramento da categoria profissional.
A documentação apresentada para comprovar o labor especial no período de 30/05/1978 a 06/02/1980 (formulário de fl. 35 e laudo técnico de fls. 36/41) aponta que, na função de "Operador de Máquinas", exercida no setor de usinagem da empresa "FCI Brasil Ltda", o autor operava "máquinas de usinagem específica (prensa, retifica, fresa, furadeira, laminadora ou tornos automáticos, mecânico, revolver ou copiador), manual ou automaticamente, acionando alavancas, manivelas, chaves elétricas ou botões de comando, para por a peça em contato com a ferramenta e possibilitar operações de usinagem diversas", estando exposto aos agentes agressivos "óleo lubrificante, graxa e pó seco", cabendo ressaltar que a atividade desempenhada encontra-se abrangida pelo Decreto n. 83.080/79, códigos 2.5.1 (operadores de máquinas nas indústrias metalúrgicas) e 2.5.2 (prensadores), ambos do Anexo II.
Por fim, no que diz respeito ao período compreendido entre 20/05/1980 e 05/03/1997, os formulários de fls. 48/49, 51/52, 54/55, 57/58, 60/61, 63/64 e 66/67, o laudo individual de fls. 69/70 e o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP de fls. 75/79 indicam que o autor, nas diversas ocupações exercidas junto à empresa "Caterpillar Brasil Ltda", esteve exposto ao agente agressivo ruído nas seguintes intensidades e períodos:
1) 82,9 dB(A), no período de 20/05/1980 a 20/03/1984;
2) 80,4 dB(A), no período de 21/03/1984 a 20/09/1986;
3) 82,4 dB(A), no período de 21/09/1986 a 12/09/1989;
4) 80,4 dB(A), no período de 13/09/1989 a 31/12/1992;
5) 80,3 dB(A), no período de 01/01/1993 a 05/03/1997.
No que toca à possibilidade de conversão e soma de tempo especial em comum, cumpre seja tecida uma breve explanação histórica:
A Lei nº 8.213/91, quando de sua edição, manteve a possibilidade de conversão do tempo especial em comum para fins de aposentadoria comum, conforme redação do seu art. 57, § 5º:
No entanto o art. 28 da MP 1663-10/98 revogou tal parágrafo. A MP 1663-13 manteve tal revogação, assim como a MP 1663-15. Ocorre que esta última, quando parcialmente convertida em Lei, em 20/11/1998 (Lei nº 9.711/98), não continha referida revogação, concluindo-se, portanto, que permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais, porque o § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 fora mantido. Confira-se a redação da Lei nº 9.711/98:
A EC nº 20/98 de 15/12/1998 alterou a redação do § 1º do art. 201 da Constituição, vedando a adoção de critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar. A EC nº 47/05 também previu a necessidade de Lei Complementar, mas esta ainda não foi editada, e estendeu a aposentadoria especial aos segurados com deficiência, regulamentada pela LC nº 142 de 08/05/2013.
Em 14/09/1998, foi editado o Decreto nº 2.782, de 14/09/1998, que regulamentava o art. 28 da MP nº 1.663-13/98 acerca do tempo de serviço especial exercido até 28/05/1998. Esse Decreto foi revogado pelo Decreto nº 3.048, de 06/05/1999, que, em seu art. 70, regulamentava a Lei nº 9.711/98 e estabelecia restrições à conversão do tempo especial em comum, vedando a conversão a partir de maio/98 e estabelecendo percentual mínimo de tempo de exercício de atividade especial.
E em 03/09/2003 sobreveio o Decreto nº 4.827, que alterou o referido art. 70, assim dispondo:
Desta forma, da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, conclui-se que permanece a possibilidade da conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrados como especiais os períodos indicados na inicial, quais sejam: 10/10/1977 a 15/05/1978, 30/05/1978 a 06/02/1980 e 20/05/1980 a 05/03/1997.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
No mais, observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Nos termos anteriormente expendidos, de rigor o acolhimento do pedido do autor no sentido de que a autarquia previdenciária seja compelida a reconhecer como tempo de serviço trabalhado em regime especial, sujeito a conversão em tempo comum, as atividades exercidas nos interregnos de 10/10/1977 a 15/05/1978, 30/05/1978 a 06/02/1980 e 20/05/1980 a 05/03/1997, em razão do enquadramento da categoria profissional e da submissão ao agente agressivo ruído.
Tendo em vista o caráter meramente declaratório da presente demanda - pleito de reconhecimento de atividade especial - fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido.
Ante o exposto, dou parcial provimento à remessa necessária e à apelação do INSS, tão somente para fixar os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º grau.
É como voto.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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