D.E. Publicado em 17/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 07/11/2017 16:30:59 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003291-57.2003.4.03.6119/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por ANTONIO MANOEL DOS REIS em ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de trabalho especial, com consequente conversão em tempo comum.
A r. sentença de fls. 216/231 julgou extinto o feito, sem resolução de mérito, por perda superveniente do interesse de agir, em relação aos períodos de 19/02/1982 a 22/02/1984 e 01/01/1976 a 30/12/1978, julgando improcedente o pedido no tocante aos demais períodos questionados, e condenou a parte autora no pagamentos dos honorários advocatícios, arbitrados no valor de R$500,00 (quinhentos reais), observados os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Em razões recursais de fls. 251/263, a parte autora pleiteia a reforma da sentença, ao fundamento de que a documentação apresentada seria suficiente para a comprovação da submissão aos agentes nocivos nos períodos de trabalho questionados na inicial. Aduz que a utilização de equipamento de proteção individual não retira o caráter especial do labor prestado em condições prejudiciais à saúde, postulando a procedência total da demanda.
Contrarrazões do INSS às fls. 267/277.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Do caso concreto.
Quanto ao período de 01/03/1984 a 30/06/1985, laborado na empresa "Maxdel Indústria e Comércio Ltda", o formulário DSS de fl. 83 informa que o autor, então no exercício da função de "motorista", realizava o "transporte de mercadorias", conduzindo "veículo motorizado", sem especificar, contudo, que tipo de mercadoria transportava e o meio de transporte utilizado, inviabilizando, assim, o reconhecimento da atividade especial pelo enquadramento da categoria profissional (Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79). Conforme bem salientado pela r. sentença de 1º grau, "caberia ao autor comprovar que sua função enquadrava-se por similitude na condição de motorista de caminhão (ou equiparado), o que não se verificou nos autos".
Da mesma forma, no tocante aos períodos de 01/07/1985 a 26/06/1991, 01/07/1991 a 01/08/1991 e 01/10/1992 a 01/04/1998, não houve a demonstração do labor especial pretendido. Isso porque a documentação apresentada (laudo de insalubridade de fls. 74/75, laudo de avaliação ambiental de fls. 76/81 e formulários de fls. 85, 87 e 89) revela que a exposição ao agente agressivo ruído não se dava de forma habitual e permanentemente acima dos limites legais.
Com efeito, nos períodos acima referidos, o requerente desempenhou as funções de "supervisor industrial", "gerente industrial" e "gerente de produção" junto à empresa "Maxdel Indústria e Comércio Ltda", nas quais "acompanhava o processo produtivo nas etapas de injeção (PU/PVC), rebarbação, lavagem, (PU), Expedição e Transportes, sendo estas atividades exercidas nos galpões I e II". Segundo consta do laudo de insalubridade, datado de 02/07/1998 (fl. 75), o ruído aferido nos setores retro mencionados foram os seguintes:
1) PU - 77 dB a 89 dB;
2) PVC - 75 dB a 86 dB;
3) LAVAGEM - 80 dB a 81 dB;
4) REBARBA - 85 dB a 96 dB;
5) PINTURA - 82 dB a 93 dB;
6) EXPEDIÇÃO - 74 dB a 82 dB.
Além disso, à conclusão do laudo, consigna o perito que "as atividades exercidas em 60% (sessenta por cento) da jornada de trabalho, pelo Sr. Antonio Manoel dos Reis, junto a área de produção da Maxdel Indústria e Comércio Ltda, enquadra-se nos regulamentos do benefício de aposentadoria especial", havendo referência, ainda, no formulário de fl. 87 que "nos 40% (quarenta por cento) restante da jornada de trabalho atendia clientes e organizava a parte administrativa da produção, sem a presença de qualquer tipo de agente agressivo". Por fim, registrou de maneira acertada, a meu ver, o Digno Juiz de 1º grau que "consta do laudo de fls. 76/81 que a parte administrativa da fábrica (inclusive a mesa de supervisor de fabrica - fl. 80) não estava sujeita aos limites de tolerância exigidos nos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, quer seja, em nível de ruído superior a 80 decibéis" (grifos no original).
Portanto, não tendo o autor logrado êxito em demonstrar que exerceu suas atividades em condições prejudiciais à saúde e à integridade física nos períodos de 01/03/1984 a 30/06/1985, 01/07/1985 a 26/06/1991, 01/07/1991 a 01/08/1991 e 01/10/1992 a 01/04/1998, não há como reconhecer e computar tais interregnos como tempo de serviço especial.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Por fim, consigne-se que o próprio INSS disciplinou, internamente, a questão da cumulatividade, conforme orientação expressa no art. 223, II, da Instrução Normativa nº 45/2010.
Conforme planilha anexa, somando-se a atividade especial reconhecida administrativamente pelo INSS (19/02/1982 a 22/02/1984 - fl. 142) aos demais períodos de atividade comum, constantes do "resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição" às fls. 142/143, da CTPS de fls. 17/20 e do CNIS, em anexo, verifica-se que o autor, na data do requerimento administrativo (01/04/1998 - fl. 145) perfazia 25 anos, 10 meses e 05 dias de serviço, insuficientes para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, mesmo que na modalidade proporcional com base nas regras transitórias estabelecidas pela Emenda Constitucional nº 20/98, considerando o descumprimento das exigências referentes à idade mínima e ao "pedágio".
Importante ser dito que não houve o preenchimento dos requisitos necessários nem mesmo por ocasião da prolação da sentença de 1º grau (15/04/2008 - fl. 231), sendo de rigor a manutenção da sentença de improcedência da demanda.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau.
É como voto.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 07/11/2017 16:30:55 |