Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1740275 / SP
0003919-26.2010.4.03.6111
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO. ATENDENTE DE
ENFERMAGEM. AUXILIAR DE ENFERMAGEM. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INICIAL. DATA
DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO.
OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. JUROS DE MORA. CORREÇÃO
MONETÁRIA. VERBA HONORÁRIA. ISENÇÃO DE CUSTAS. REMESSA NECESSÁRIA, TIDA
POR INTERPOSTA, E APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDAS. APELAÇÃO DA
AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
com reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais, nos
períodos de 07/07/1980 a 30/11/1985, 01/12/1985 a 31/10/1994, 01/11/1994 a 31/08/2003,
01/09/2003 a 01/03/2007.
2 - A r. sentença condenou o INSS à averbação de tempo de serviço especial da autora. Assim,
trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo
retro mencionado, e da Súmula 490 do STJ.
3 - Inicialmente, cumpre consignar que no pedido vertido na inicial não consta pleito de
concessão de aposentadoria especial, de modo que não merece conhecimento tal alegação
posta nas razões de apelação, no sentido de que a aposentadoria especial é espécie de
aposentadoria por tempo de contribuição, o que não obsta a concessão de um benefício pelo
outro.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
5 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
6 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
7 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
8 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
9 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
10 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
11 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
12 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
13 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
14 - Do exame acurado de todos os documentos, a conclusão a que se chega é a de que a
parte autora estivera sob o manto da especialidade, durante o labor na Fundação Municipal de
Ensino Superior de Marília, conforme descrições do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP
(fls. 31/33), como segue: de 07/07/1980 a 30/11/1985, na condição de serviçal, no setor
"lavanderia", a qual cabia: "buscar roupas sujas nas alas e levar para a Lavanderia para serem
lavadas e esterilizadas... separar as roupas que devem ser esterilizadas seguindo normas do
CCIH (Centro de Controle de Infecção Hospitalar), ensacar roupas para distribuir nos setores,
auxiliar na higienização do setor de Lavanderia"; de 01/12/1985 a 31/10/1994, na condição de
auxiliar de saúde, no setor "CSE", a qual cabia: "prestar cuidados de enfermagem na Unidade
Básica de Saúde e no domicílio do paciente quando necessário... realizar coleta de materiais
como sangue, urina, fezes, escarros e materiais para exames de Papanicolau... auxiliar na
lavagem e esterilização de materiais como curativos, espéculos e outros; fazer curativos
comuns e de pacientes portadores de hanseníase, câncer e tuberculose; fazer inalações"; de
01/11/1994 a 31/12/1998 e 01/01/1999 a 31/08/2003, na condição de atendente de
enfermagem, no setor "CSE", a qual cabia "... auxiliar nos preparativos de óbitos; auxiliar no
controle da disseminação de infecção hospitalar."; de 01/09/2003 a 31/03/2004, na condição de
auxiliar de enfermagem, no setor "clínica pediátrica", a qual cabia: "... fazer curativos comuns e
contaminados; auxiliar o enfermeiro na realização de sondas vesical e nasogástrica; auxiliar o
médico nos procedimentos de sutura... auxiliar o enfermeiro em lavagem intestinal; auxiliar no
controle da disseminação de infecção hospitalar."; de 01/04/2004 a 21/10/2006, na condição de
auxiliar de enfermagem, no setor "oftalmologia", a qual cabia: "... puncionar veias... auxiliar no
controle da disseminação da infecção hospitalar.".
15 - Possível o reconhecimento da especialidade do labor, do período de 07/07/1980 a
21/10/2006 (data da emissão do PPP), em razão da previsão contida nos Decretos nºs
53.831/64 (código 1.3.2, quadro Anexo), 83.080/79 (código 1.3.4, Anexo I) e 3.048/99 (código
3.0.1, Anexo IV).
16 - Somando-se o labor especial reconhecido nesta demanda ao período em que esteve em
gozo de auxílio doença (CNIS), constata-se que, na data do pleito administrativo (01/03/2007),
totalizava 31 anos, 08 meses e 15 dias de serviço, fazendo jus à concessão da aposentadoria
integral por tempo de contribuição, não havendo que se falar em pedágio e implemento de
requisito etário.
17 - O termo inicial do benefício deve coincidir com a data do requerimento administrativo
(01/03/2007), ocasião em que a entidade autárquica tomou conhecimento da pretensão.
18 - Conforme extrato do CNIS ora anexado, que houve concessão administrativa do benefício
de aposentadoria por tempo de contribuição, desde 04/11/2016 (NB 1759528541). Sendo
assim, faculta-se à demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais
vantajoso, vedado o recebimento em conjunto de duas aposentadorias, nos termos do art. 124,
II, da Lei nº 8.213/91, e, com isso, condicionada a execução dos valores atrasados à opção pelo
benefício concedido em Juízo, uma vez que se permitir a execução dos atrasados
concomitantemente com a manutenção do benefício concedido administrativamente
representaria uma "desaposentação" às avessas, cuja possibilidade - renúncia de benefício - é
vedada por lei - art. 18, §2º da Lei nº 8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C.
Supremo Tribunal Federal na análise do RE autuado sob o nº 661.256/SC.
19 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
20 - Juros de mora incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
21 - Honorários advocatícios fixados moderadamente em percentual de 10% (dez por cento),
devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da
sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
22 - Isenta-se a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais, em se tratando de
autos que tramitam sob os auspícios da assistência judiciária gratuita.
23 - Remessa necessária, tida por interposta, e apelação do INSS parcialmente providas.
Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
remessa necessária, tida por interposta, bem assim à apelação do INSS, para afastar a
especialidade do labor no período de 22/10/2006 a 01/03/2007, além dos períodos em que a
autora esteve em gozo do benefício de auxílio doença, e dar parcial provimento à apelação da
autora, para condenar o INSS a implantar em seu favor o benefício de aposentadoria integral
por tempo de contribuição, a partir data do requerimento administrativa (01/03/2007), sendo que
sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09,
a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a
expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando, ainda, a
autarquia no pagamento da verba honorária, fixada em 10% sobre o valor das parcelas
vencidas, contadas estas até a data de prolação da sentença, facultando-se à autora a opção
de percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso, e, por maioria, decidiu condicionar a
execução dos valores atrasados à necessária opção por aquele cujo direito foi reconhecido em
Juízo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-490 SUM-111LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-53831 ANO-1964
ITE-1.3.2***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-1.3.4LEG-FED DEC-611 ANO-1992 ART-292***** LBPS-
91 LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57 PAR-4 PAR-5 ART-124 INC-2 ART-18 PAR-2LEG-FED
LEI-9528 ANO-1997LEG-FED LEI-9711 ANO-1998 ART-28***** RPS-99 REGULAMENTO DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ART-70 ITE-3.0.1LEG-FED LEI-11960 ANO-2009
Veja
STF RE 661.256/SCREPERCUSSÃO GERALTEMA 503;
STF RE 870.947/SEREPERCUSSÃO GERALTEMA 810.
