
| D.E. Publicado em 20/09/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, para afastar o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de 01/04/2005 a 19/04/2005 e de 30/03/2007 a 30/07/2007; e dar parcial provimento à apelação do autor, para reconhecer a especialidade do labor nos períodos de 07/02/2001 a 06/02/2002 e de 01/05/2003 a 18/11/2003; mantendo, no mais, a r. sentença proferida em 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006891-76.2009.4.03.6119/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e por JOSE MUDESTO DE SOUZA, em ação ajuizada por este, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor sob condições especiais.
A r. sentença de fls. 189/197 julgou parcialmente procedente o pedido, para o fim de determinar ao réu que tão somente a averbação, como especiais, dos lapsos temporais havidos entre 01/10/1977 a 30/01/1978, 09/02/1978 a 01/11/1978, 06/11/1978 a 22/01/1979, 03/02/1979 a 21/04/1979, 21/08/1980 a 24/11/1980, 04/02/1985 a 03/07/1990 e 19/11/2003 a 30/07/2008. Foi fixada a sucumbência recíproca.
Em razões recursais de fls. 208/218, o autor alega que o magistrado não considerou como especial o período de 01/4/1998 a 22/10/2008, não obstante apresentada documentação necessária à comprovação de exposição a agente agressivo ruído em nível superior ao permitido em lei.
O INSS também apresentou recurso às fls. 231/239, onde afirma que não restou comprovada a exposição do autor a agentes nocivos. Na hipótese de manutenção do reconhecimento da atividade especial, sustenta que deve ser aplicado o fator 1,20,
Devidamente processado o recurso, com contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 08/03/2010, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS a reconhecer e averbar, em favor da parte autora, tempo de serviço especial. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
No mais, verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Do caso concreto.
Pretende o autor o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de 01/10/1977 a 30/01/1978, 09/02/1978 a 01/11/1978, 06/11/1978 a 22/01/1979, 03/02/1979 a 21/04/1979, 21/08/1980 a 24/11/1980, 04/02/1985 a 03/07/1990 e 01/04/1998 a 30/07/2008, com a consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
De acordo com anotações constantes na CTPS do autor (fls. 28/35), nos período de 01/10/1977 a 30/01/1978, 09/02/1978 a 01/11/1978, 06/11/1978 a 22/01/1979, 03/02/1979 a 21/04/1979, 21/08/1980 a 24/11/1980, o autor exerceu as funções de servente (ramo de atividade: construções) e ½ oficial carpinteiro, juntos às empresas Sidart Engenharia, CR Almeida, Cobra e Cia. Imobiliária Ibitirama; cabível o reconhecimento da especialidade a teor do item 2.3.3 do Decreto nº 53.831/64.
Em relação ao período de 04/02/1985 a 03/07/1990, conforme PPP de fl. 49, o autor estava exposto ao agente agressivo ruído de 87 dB, no exercício da função de prensista junto à empresa Suspex Industria e Comércio de Auto Peças.
Quanto ao período de 01/04/1998 a 22/10/2008, laborado na empresa Centroflex Indústria e Comércio de Artefatos de Borracha Ltda; conforme PPP de fls. 50/51, emitido em 17/11/2008; nos períodos de 07/02/2001 a 06/02/2002, de 01/05/2003 a 31/03/2004, de 01/04/2004 a 31/03/2005, de 20/04/2005 a 29/03/2006, de 30/03/2006 a 29/03/2007, de 31/07/2007 a 30/07/2008, o autor esteve exposto, além do ruído, a desmoldantes, composto CRU, massa de borracha e silicone; agentes químicos enquadrados no código 1.2.11 do Anexo do Decreto nº 53.831/64.
Assim, possível o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de 01/10/1977 a 30/01/1978, 09/02/1978 a 01/11/1978, 06/11/1978 a 22/01/1979, 03/02/1979 a 21/04/1979, 21/08/1980 a 24/11/1980, 04/02/1985 a 03/07/1990, 07/02/2001 a 06/02/2002, de 01/05/2003 a 31/03/2004, de 01/04/2004 a 31/03/2005, de 20/04/2005 a 29/03/2006, de 30/03/2006 a 29/03/2007, de 31/07/2007 a 30/07/2008.
Acerca da conversão do período de tempo especial, deve ela ser feita com a aplicação do fator 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, não importando a época em que desenvolvida a atividade, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Quanto à aposentadoria proporcional, seus requisitos etário e contributivo estão estabelecidos na EC nº 20/98, em seu art. 9º:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Desta forma, convertendo-se os períodos de atividade especial reconhecidos nesta demanda em tempo comum, aplicando-se o fator de conversão de 1.4, e somando-os aos demais períodos comuns anotados em CTPS (fls. 28/44) e já reconhecidos administrativamente pelo INSS (CNIS), verifica-se que, na data do requerimento administrativo (03/03/2009 - fl. 17), o autor contava com 33 anos, 8 meses e 6 dias de tempo total de atividade; apesar de ter cumprido o "pedágio", não havia cumprido o requisito etário necessário para fazer jus ao benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.
Por fim, dou os honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixo de condenar qualquer delas no reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS delas isento.
Diante do exposto, dou parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, para afastar o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de 01/04/2005 a 19/04/2005 e de 30/03/2007 a 30/07/2007; e dou parcial provimento à apelação do autor, para reconhecer a especialidade do labor nos períodos de 07/02/2001 a 06/02/2002 e de 01/05/2003 a 18/11/2003; mantendo, no mais, a r. sentença proferida em 1º grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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