
| D.E. Publicado em 13/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária e à apelação do INSS, e dar parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade do labor nos períodos de 21/03/1979 a 05/09/1980, 01/10/1986 a 15/06/1993 e 17/01/1994 a 09/10/2000, mantendo, entretanto, a improcedência do pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, e para fixar a sucumbência recíproca, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0005148-80.2008.4.03.6114/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelações interpostas pela parte autora e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por SEBASTIÃO CAMPINA DE OLIVEIRA objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de trabalho especial, com consequente conversão em tempo comum.
A r. sentença de fls. 183/185 julgou parcialmente procedente o pedido, "para reconhecer o caráter especial das atividades exercidas pelo autor nos períodos de 21/03/79 a 05/03/80, 01/10/86 a 15/06/93 e 17/01/94 a 12/12/98", e condenou a parte autora no pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Em razões recursais de fls. 190/200, a parte autora pleiteia a reforma da sentença, ao fundamento de que a documentação acostada aos autos seria suficiente para comprovar a efetiva submissão a agentes nocivos em todos os períodos de trabalho questionados na inicial, pugnando pela total procedência da demanda, com a concessão da aposentadoria vindicada.
O INSS, por sua vez, também apresenta apelação (fls. 202/207), sustentando que a utilização de equipamento de proteção individual teria neutralizado o agente agressivo ruído, descaracterizando a insalubridade do ambiente de trabalho. Pede a improcedência dos pedidos formulados pelo autor.
Contrarrazões da parte autora às fls. 211/214 e do INSS às fls. 216/219.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais nos períodos de 21/03/1979 a 05/09/1980, 23/03/1981 a 30/09/1986, 01/10/1986 a 31/05/1988, 01/06/1988 a 15/06/1993 e 17/01/1994 a 09/10/2000.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
No mais, observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso concreto.
Quanto ao período de 21/03/1979 a 05/09/1980, laborado na empresa "Basf S/A (sucedida pela KNAUF - Isopor Ltda)", o formulário DSS - 8030 de fl. 168 e o Laudo Técnico Pericial de fls. 170/172 informam que o autor, então no exercício das funções de "Auxiliar de Produção" e "Operador de Máquina B" esteve exposto ao agente agressivo ruído, na intensidade de 81,1 dB (A).
No tocante aos períodos de 23/03/1981 a 30/09/1986, 01/10/1986 a 31/05/1988 e 01/06/1988 a 15/06/1993, trabalhado junto à "Rolls Royce Brasil Ltda", o autor instruiu a presente demanda com o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP de fls. 47/48 e com o formulário DSS - 8030 de fl. 173. Referidos documentos apontam que, no interregno compreendido entre 01/10/1986 e 15/06/1993, ao exercer as funções de "Ajudante Galvanoplastia", "1/2 Oficial Galvanoplastia" e "Oficial Galvanoplastia", o requerente esteve exposto a ruído de 86 dB(A), o que autoriza o reconhecimento da especialidade do labor, em razão da exposição a nível de pressão sonora superior ao limite de tolerância vigente à época.
O mesmo não se pode dizer quanto ao lapso compreendido entre 23/03/1981 e 30/09/1986, no qual o autor desempenhou a função de "Ajudante/Lavagem", com exposição a ruído de 73 dB(A). Além da impossibilidade de enquadramento pela exposição ao agente agressivo ruído, constata-se que a ocupação do autor não encontra subsunção nos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, sendo imperioso concluir que o período em questão deverá ser computado como tempo de atividade comum.
Por fim, a respeito do período de 17/01/1994 a 09/10/2000, laborado na empresa "ZF do Brasil Ltda", o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP constante de fls. 49/50 demonstra que o autor, nas funções de "Operador Máquinas B" e "Prensista B", esteve exposto a ruído na intensidade de 92,71 dB(A).
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrados como especiais os períodos de 21/03/1979 a 05/09/1980, 01/10/1986 a 15/06/1993 e 17/01/1994 a 09/10/2000.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Por fim, consigne-se que o próprio INSS disciplinou, internamente, a questão da cumulatividade, conforme orientação expressa no art. 223, II, da Instrução Normativa nº 45/2010.
Conforme planilha anexa, somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda aos demais períodos de atividade comum constantes da CTPS de fls. 118/157 e do CNIS de fl. 107, verifica-se que o autor, na data do requerimento administrativo (14/12/2006 - fl.32), perfazia 33 anos e 05 meses de serviço, insuficientes para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, mesmo que na modalidade proporcional com base nas regras transitórias estabelecidas pela Emenda Constitucional nº 20/98, considerando o descumprimento da exigência referente à idade mínima.
Dessa forma, não prospera o pedido de concessão de benefício previdenciário. Por sua vez, merece acolhida, em parte, o pedido do autor, a fim de que a autarquia previdenciária seja compelida a reconhecer como tempo de serviço trabalhado em regime especial, sujeito a conversão em tempo comum, os períodos de 21/03/1979 a 05/09/1980, 01/10/1986 a 15/06/1993 e 17/01/1994 a 09/10/2000.
Ante a sucumbência recíproca, dou a verba honorária por compensada, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73 e deixo de condenar as partes no pagamento das custas, eis que o autor é beneficiário da justiça gratuita e o INSS delas está isento.
Ante o exposto, nego provimento à remessa necessária e à apelação do INSS, e dou parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade do labor nos períodos de 21/03/1979 a 05/09/1980, 01/10/1986 a 15/06/1993 e 17/01/1994 a 09/10/2000, mantendo, entretanto, a improcedência do pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, e para fixar a sucumbência recíproca.
É como voto.
CARLOS DELGADO
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