Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1449210 / SP
0031131-32.2009.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. RECONHECIMENTO PARCIAL.
CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. TEMPO ESPECIAL. CONVERSÃO EM COMUM.
BENEFÍCIO CONCEDIDO. APOSENTADORIA PROPORCIONAL. DIREITO ADQUIRIDO. EC
Nº 20/98. TERMO INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO
QUINQUENAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. TERMO FINAL PARA A SUA INCIDÊNCIA. DATA DA PROLAÇÃO DA
SENTENÇA. ISONOMIA CONSTITUCIONAL. PRECEDENTES DA TURMA. APELAÇÃO DA
PARTE AUTORA PROVIDA.
1 - Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
com reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais, nos
períodos de 30/06/1983 a 28/09/1983, 21/05/1984 a 04/05/1988 e de 14/10/1996 a 02/04/1998.
2 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
3 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
4 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
5 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
6 - A Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida
Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº
1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o
artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a
edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997,
que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico
do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
7 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
8 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
9 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
14 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
15 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
16 - De início, cumpre salientar que não há que se falar em ausência de comprovação da
existência dos vínculos empregatícios mantidos com as empresas "A. Araújo S/A" e "Mendes
Junior Engenharia S.A" - tal como consignado no decisum - uma vez que os respectivos
períodos restaram devidamente computados pela Autarquia, por ocasião do requerimento
administrativo, com base nas Carteiras de Trabalho fornecidas pelo autor (conforme "relação de
documentos para cálculo de tempo de serviço"), de modo que, repise-se, não recai qualquer
controvérsia sobre a existência dos mesmos.
17 - Por outro lado, a ausência de documentação apta à comprovação de eventual submissão a
agente prejudicial à saúde e à integridade física (formulários, laudo técnico e/ou PPP) no
interregno de 30/06/1983 a 28/09/1983 ("A. Araújo S/A"), inviabiliza o reconhecimento
pretendido, devendo o mesmo ser computado, portanto, como tempo de serviço comum.
18 - Para comprovar o labor especial no período de 21/05/1984 a 04/05/1988, o autor
apresentou o formulário DSS - 8030 e o Laudo Técnico Pericial, os quais apontam que, ao
desempenhar a função de "Balconista de Almoxarifado", junto à empresa "Mendes Junior
Engenharia S.A", esteve exposto a ruído acima de 90 dB(A).
19 - Quanto ao período de 14/10/1996 a 02/04/1998, laborado na empresa "Companhia
Santista de Papel", o formulário DSS - 8030 e o Laudo Técnico demonstram que o autor esteve
exposto ao agente agressivo ruído, na intensidade de 84 dB(A). Nesse contexto, possível o
reconhecimento da atividade especial no lapso de 14/10/1996 a 05/03/1997, eis que
desempenhado com submissão a nível de pressa sonora superior ao limite de tolerância vigente
à época, o que não se verifica, todavia, após referido marco.
20 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrados como
especiais os períodos de 21/05/1984 a 04/05/1988 e de 14/10/1996 a 05/03/1997.
21 - Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda aos períodos considerados
incontroversos ("resumo de documentos para cálculo de tempo de serviço"), verifica-se que, na
data do requerimento administrativo (DER - 02/04/1998), o autor contava com 31 anos, 07
meses e 02 dias de serviço, o que lhe assegura o direito ao benefício de aposentadoria
proporcional por tempo de contribuição, com base na legislação pretérita à Emenda
Constitucional nº 20/98 (direito adquirido, art. 3º).
22 - Quanto ao termo inicial do benefício, ressalvando o entendimento pessoal deste relator
acerca da ausência de comprovação do direito no momento da formulação do pleito na via
administrativa, deve ser fixado na data do requerimento administrativo (02/04/1998), respeitada
a prescrição das parcelas anteriores ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação.
23 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
24 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
25 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
26 - O termo ad quem a ser considerado continua sendo a data da prolação da sentença, ainda
que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Na hipótese de
procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o
trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não
transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos
atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos distintos em relação
ao que foi decidido. Portanto, não se afigura lógico e razoável referido discrímen, a ponto de
justificar o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que
exercem suas funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação. Precedentes.
27 - Isenta a Autarquia do pagamento de custas processuais.
28 - Apelação da parte autora provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação
da parte autora, para reconhecer a especialidade do labor nos períodos de 21/05/1984 a
04/05/1988 e de 14/10/1996 a 05/03/1997, e para condenar o INSS na implantação e
pagamento da aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, com base na legislação
pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98, desde a data do requerimento administrativo
(02/04/1998), respeitada a prescrição quinquenal, sendo que sobre os valores em atraso
incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será
apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício
requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando-o, ainda, no pagamento da verba
honorária, fixada em 10% sobre as parcelas vencidas, contadas estas até a data de prolação da
sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
