
| D.E. Publicado em 06/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial, à apelação do INSS e à apelação da parte autora, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0005753-81.2006.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e de apelações interpostas pela parte autora e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada por FRANCISCO MATIAS DA SILVA, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do trabalho especial, com consequente conversão em tempo comum, nos períodos de 26/12/1978 a 04/04/1983, de 05/05/1983 a 30/08/1986 e de 20/11/1986 até a data do ajuizamento da ação.
A r. sentença de fls. 101/110 julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a especialidade do labor desempenhado nos períodos de 26/12/1978 a 04/03/1983 e de 05/05/1983 a 30/08/1986, deixando, entretanto, de determinar a implantação da aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, ante a ausência de comprovação do tempo mínimo necessário para a obtenção da benesse. Fixada a sucumbência recíproca. Sentença submetida à remessa necessária.
Em razões recursais de fls. 114/119, o INSS pleiteia a reforma da sentença, ao fundamento de que "parte do período que o autor pretende ver reconhecido como especial é anterior à legislação que contemplou a conversão do tempo especial em tempo comum". Sustenta, ainda, que "para a conversão dos períodos anteriores à 24.07.1991 (data da entrada em vigor da Lei nº 8.213/91) deve ser aplicada a legislação vigente à época, qual seja, o fator de conversão 1.20". Postula, por fim, o conhecimento do reexame necessário.
A parte autora, por sua vez, também apresenta recurso de apelação (fls. 121/124), aduzindo, em síntese, que faz jus à aposentadoria pleiteada, que demonstrou ter laborado com submissão a condições prejudiciais à saúde em todos os períodos questionados na inicial, e que "o uso do EPI não descaracteriza a nocividade causada ao ser humano, não sendo motivo para se afastar a conversão do tempo de serviço para o trabalho especial".
Devidamente processados os recursos, sem o oferecimento das contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais.
Quanto ao período laborado na empresa "Quaker Brasil Ltda", o formulário DSS - 8030 à fl. 26 e o laudo técnico constantes de fls. 27/30 demonstram que o autor, no exercício das funções de Ajudante de Produção e Ajudante de Embalagem, esteve exposto a nível médio de ruído de 87 dB (A), de modo habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, no período de 26/12/1978 a 04/03/1983.
Da mesma forma, no exercício das atividades prestadas para a empresa "Cia. União dos Refinadores de Açúcar e Café", no lapso compreendido entre 05/05/1983 e 30/08/1986, o autor também esteve exposto, de modo habitual e permanente, ao agente agressivo ruído, nível 91,5 dB (A), conforme apontam o formulário e o laudo técnico carreados aos autos (fls. 31/33).
A documentação apresentada para comprovar a submissão a condições especiais de trabalho, no período laborado na "Brasilata S/A Emb. Metálicas", merece algumas considerações.
Com efeito, o formulário juntado à fl. 34 dos autos revela que o nível médio de ruído encontrado foi de 92dB (A) entre 20/11/1986 e 17/11/1999 (data de elaboração do documento), quando o autor trabalhou na função de Operador de Produção "A".
Todavia, o laudo pericial coligido às fls. 36/38 encontra-se incompleto, porquanto desprovido da necessária indicação dos dados pessoais do empregado (documento tem início na página 02, item 4 - agentes físicos avaliados - sem indicação do funcionário cujas condições ambientais de trabalho estavam sendo avaliadas). Além disso, refere-se à medição efetuada em setor diverso daquele no qual o autor exercia suas funções (o formulário, que indica corretamente o nome do empregado, ora requerente, indica seu trabalho no setor de produção, ao passo que o laudo pericial informa que a medição foi realizada no setor de prensas).
Nesse diapasão, considerando ser indispensável a apresentação de laudo técnico para a caracterização do trabalho especial submetido ao agente agressivo ruído, conforme se verificará a seguir, não há como ser reconhecido o pedido do autor, nesse ponto, em razão da inexistência de documento apto à comprovação do direito alegado.
No que toca à possibilidade de conversão e soma de tempo especial em comum, cumpre seja tecida uma breve explanação histórica:
A Lei nº 8.213/91, quando de sua edição, manteve a possibilidade de conversão do tempo especial em comum para fins de aposentadoria comum, conforme redação do seu art. 57, § 5º:
No entanto o art. 28 da MP 1663-10/98 revogou tal parágrafo. A MP 1663-13 manteve tal revogação, assim como a MP 1663-15. Ocorre que esta última, quando parcialmente convertida em Lei, em 20/11/1998 (Lei nº 9.711/98), não continha referida revogação, concluindo-se, portanto, que permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais, porque o § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 fora mantido. Confira-se a redação da Lei nº 9.711/98:
A EC nº 20/98 de 15/12/1998 alterou a redação do § 1º do art. 201 da Constituição, vedando a adoção de critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar. A EC nº 47/05 também previu a necessidade de Lei Complementar, mas esta ainda não foi editada, e estendeu a aposentadoria especial aos segurados com deficiência, regulamentada pela LC nº 142 de 08/05/2013.
Em 14/09/1998, foi editado o Decreto nº 2.782, de 14/09/1998, que regulamentava o art. 28 da MP nº 1.663-13/98 acerca do tempo de serviço especial exercido até 28/05/1998. Esse Decreto foi revogado pelo Decreto nº 3.048, de 06/05/1999, que, em seu art. 70, regulamentava a Lei nº 9.711/98 e estabelecia restrições à conversão do tempo especial em comum, vedando a conversão a partir de maio/98 e estabelecendo percentual mínimo de tempo de exercício de atividade especial.
E em 03/09/2003 sobreveio o Decreto nº 4.827, que alterou o referido art. 70, assim dispondo:
Desta forma, da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, conclui-se que permanece a possibilidade da conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrados como especiais os períodos compreendidos entre 26/12/1978 e 04/03/1983 e entre 05/05/1983 e 30/08/1986. Por sua vez, quanto ao período de atividade laborativa iniciado em 20/11/1986, não houve a demonstração da efetiva submissão ao agente agressivo ruído, mediante apresentação de laudo de condições ambientais, nos temos da legislação de regência.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
No mais, observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Conforme planilhas anexas, somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda (26/12/1978 a 04/03/1983 e 05/05/1983 a 30/08/1986) aos períodos incontroversos constantes do CNIS, que passa a integrar a presente decisão, da CTPS de fls. 55/59, e reconhecidos administrativamente pelo INSS (fls. 45), verifica-se que o autor, seja na data do requerimento administrativo (04/09/2002 - fl. 18), seja na data da citação (02/04/2007 - fl. 74) não alcançou tempo de serviço suficiente para a obtenção do benefício vindicado, motivo pelo qual, de rigor a manutenção da improcedência da demanda nesse ponto.
Por sua vez, conforme constou da r. sentença de 1º grau, merece acolhida, em parte, o pedido do autor no sentido de que a autarquia previdenciária seja compelida a reconhecer "como tempo de serviço trabalhado em regime especial, sujeito a conversão em tempo comum com acréscimo de 40%, as atividades exercidas de 26/12/1978 a 04/03/1983 na empresa ADRIA PRODUTOS ALIMENTÍCIOS LTDA e de 05/05/1983 a 30/08/1982 para a empresa UNIÃO DOS REFINADORES DE AÇUCAR E CAFÉ, em razão da atividade exercida sob o agente agressivo ruído" (fls. 110).
Ante a sucumbência recíproca, deixo de condenar as partes em honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas por ser o autor beneficiário da justiça gratuita e o INSS delas isento.
Ante o exposto, nego provimento à remessa oficial, à apelação do INSS e à apelação da parte autora, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau.
É como voto.
Desembargador Federal
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