
| D.E. Publicado em 06/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa necessária para reconhecer o labor especial apenas no período de 22/08/1989 a 31/12/1998, afastando o período de 1º/01/1999 a 31/12/2008 e negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 27/06/2017 12:01:35 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0036051-78.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por JESUS DANTAS DE SOUZA em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor sob condições especiais.
A r. sentença de fls. 140/142-verso julgou parcialmente procedente o pedido inicial e condenou o INSS a proceder a conversão do tempo de serviço trabalhado em atividade especial entre 22/08/1989 e 31/12/2008, pelo índice 1,4. Pela sucumbência, condenou o autor no pagamento de honorários advocatícios, fixados em 800,00; assinalando, contudo, sua condição de beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita. Decisão submetida à remessa necessária.
Em razões recursais de fls. 145/151, a parte autora pugna pela reforma da r. sentença ao fundamento de que, no seu entender, faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição, eis que completou mais de 35 anos de trabalho e tratando-se de aposentadoria integral, não poderia ter sido exigido o requisito etário.
Devidamente processado o recurso, sem contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Pretende a parte autora a concessão do beneficio de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor sob condições especiais.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Conforme Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPs (fls. 32/33-verso), nos períodos em que laborou na empresa Eucatex S/A Ind. e Com., o autor esteve exposto a ruído de 98 dB(A) entre 22/08/1989 a 31/12/1998, e a ruído de 83,9 dB(A) entre 01/01/1999 e 30/11/2006.
Ressalte-se que de acordo com o PPP emitido em 09/09/2009 (fls. 101/101-verso), após, portanto, ao ajuizamento da ação, verifica-se que no período de 01/01/1999 a 30/09/2000, consta a intensidade de 95,2 dB(A) de pressão sonora a que o autor estava submetido.
A discrepância quanto ao nível de ruído salta aos olhos (83,9 dB x 95,2 dB), e se revela como fator determinante para o desate da controvérsia posta a julgamento nesta oportunidade.
Isso porque, a preponderar as informações contidas no PPP de fls. 33/33-verso - contemporâneo ao ajuizamento da ação -, o demandante não faria jus ao reconhecimento da especialidade no período de 01/01/1999 a 30/09/2000, dado que submetido a nível de ruído da ordem de 83,9 decibéis, inferior, portanto, ao limite estabelecido pela legislação vigente à época (90 decibéis).
Solução diversa se aplicaria na hipótese de adoção do segundo PPP (fls. 101/101-verso), onde o nível de ruído, de acordo com o ali apontado, ultrapassava os 90 decibéis.
Ora, entendo que a situação retratada vai além da ideia simplista de se eleger o PPP cujas informações sejam mais vantajosas ao segurado. Bem ao reverso, está-se, aqui, diante de uma incongruência técnica que, a meu julgar, retira por completo a credibilidade do PPP emitido posteriormente (fls. 101/101-verso), já que fora este submetido ao crivo desta Corte, por pretender o autor sua utilização, em prol de sua tese.
Por outro lado, a inicial da presente ação não cuidou, em momento algum, de esclarecer o Juízo acerca da inconsistência mencionada.
Vale lembrar, porque de todo oportuno, que ambos os PPPs contém a advertência de responsabilização criminal, no caso de não serem verídicas as informações prestadas pelo subscritor (item IV), além de existir expressa previsão legal de cominação de multa para a empresa que fornecer dados em desacordo com o teor do laudo pericial (arts. 58, §3º e 133 da Lei nº 8.213/91).
Bem por isso, levando-se em consideração apenas as informações contidas nos PPPs de fls. 32/33-verso, de rigor o reconhecimento da especialidade da atividade desempenhada apenas no período de 22/08/1989 a 31/12/1998, em razão da submissão do autor a ruído da ordem de 98 decibéis.
Assim, fica afastada a especialidade do labor no período de 1º/01/1999 a 31/12/2008, seja pela imprestabilidade do documento de fls. 101/101-verso, seja pelo fato do autor ter ficado exposto a pressão sonora inferior àquela exigida por lei: 83,9 dB (90 dB até 19/11/2003 e 85 dB a partir de então), seja por ausência de comprovação após 30/11/2006.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que o Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
A propósito do tema:
Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 15/04/2013).
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Acerca da conversão do período de tempo especial, deve ela ser feita com a aplicação do fator 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, não importando a época em que desenvolvida a atividade, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Assim, após converter o período especial em tempo comum de 22/08/1989 a 31/12/1998, aplicando-se o fator de conversão de 1.4, e somá-los aos demais períodos (CTPS - fls. 79 e 81 e CNIS - fl. 55); constata-se que a parte autora, na data da publicação da EC 20/98 (16/12/1998), alcançou apenas 22 anos, 7 meses e 6 dia, e portanto, não fazia jus ao benefício da aposentadoria.
Contabilizando os períodos de tempo posteriores à EC 20/98, no momento da citação (28/03/2008), o autor contava com menos de 50 anos e com 32 anos, 10 meses e 25 dias de tempo total de atividade; não tendo, portanto, cumprido o requisito etário e nem o "pedágio" necessário para fazer jus a aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.
Oportuno mencionar que, conforme informações do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, desde 06/09/2011 o autor vem recebendo aposentadoria por tempo de contribuição.
Diante o exposto, dou parcial provimento à remessa necessária para reconhecer o labor especial apenas no período de 22/08/1989 a 31/12/1998, afastando o período de 1º/01/1999 a 31/12/2008 e nego provimento à apelação da parte autora.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 27/06/2017 12:01:32 |
