Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1966004 / SP
0002060-10.2012.4.03.6109
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
12/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. SOLDADOR. RUÍDO. RECONHECIMENTO
PARCIAL. TEMPO SUFICIENTE. BENEFÍCIO INTEGRAL CONCEDIDO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÕES, DO INSS E PARTE AUTORA, E REMESSA
NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
2 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
3 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
4 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na
legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo
comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um
comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser
desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do
sistema.
5 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até
a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
6 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
7 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
8 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
9 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
10 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
11 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
12 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
13 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
14 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
15 - Controvertida, na demanda, a especialidade dos intervalos de 01/08/1981 a 21/07/1988,
03/06/2002 a 18/11/2003, 19/11/2003 a 27/01/2004 e 22/07/2004 a 29/04/2010.
16 - No que diz respeito ao período trabalhado na empregadora "Rockwell Braseixos S/A" entre
01/08/1981 e 21/07/1988, consoante comprovam o formulário de fl. 24 e CTPS às fls. 38 e 54, o
autor exercia a função de "soldador de produção", o que autoriza o seu enquadramento no
Anexo do Decreto nº 53.831/64 (código 2.5.2), bem como no Anexo II do Decreto nº 83.080/79
(código 2.5.3).
17 - Durante as atividades realizadas na "Mastra Indústria e Comércio Ltda", nos lapsos de
03/06/2002 a 18/11/2003, 19/11/2003 a 27/01/2004 e 22/07/2004 a 29/04/2010, o Perfil
Profissiográfico Previdenciário (fls. 31/33), com identificação dos responsáveis pelos registros
ambientais, informa a submissão ao fragor de 90dB.
18 - Destarte, conforme fundamentação supra, constata-se que o demandante trabalhou
exposto a ruído superior aos limites de tolerância nos períodos de 19/11/2003 a 27/01/2004 e
22/07/2004 a 29/04/2010.
19 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de
01/08/1981 a 21/07/1988, 19/11/2003 a 27/01/2004 e 22/07/2004 a 29/04/2010.
20 - Vale notar que foi admitida a especialidade do intervalo de 02/07/1990 a 31/08/1995 em
sede administrativa, conforme consta do documento de fls. 73/74.
21 - Conforme planilha anexa, somando-se o tempo de serviço comum incontroverso (resumo
de documentos - fls. 73/74) ao especial, reconhecido nesta demanda e em sede administrativa,
convertido em comum, verifica-se que o autor alcançou 39 anos, 1 meses e 26 dias de serviço
na data do requerimento administrativo (29/04/2010 - fl. 73), fazendo jus à aposentadoria por
tempo de contribuição, deferida na origem.
22 - A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob
a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de
variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
23 - Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por
refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
24 - Apelações, do INSS e da parte autora, e remessa necessária parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade dos períodos de 19/11/2003 a
27/01/2004 e 22/07/2004 a 29/04/2010 e dar parcial provimento à apelação do INSS e à
remessa necessária, a fim de estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso
deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será
apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a
expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no
mais, a r. sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Referência Legislativa
LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-611 ANO-1992 ART-292***** LBPS-91 LEI DE
BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57 PAR-4 PAR-5 ART-58LEG-FED DEC-53831 ANO-
1964***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-2.5.3LEG-FED LEI-6887 ANO-1980LEG-FED MPR-1523
ANO-1996LEG-FED MPR-1523 ANO-1997
EDIÇÃO 13LEG-FED MPR-1596 ANO-1997
EDIÇÃO 14LEG-FED LEI-9528 ANO-1997LEG-FED DEC-2172 ANO-1997LEG-FED LEI-9711
ANO-1998 ART-28LEG-FED DEC-533831 ANO-1964 ITE-2.5.2LEG-FED LEI-11960 ANO-
2009***** RPS-99 REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ART-70
Veja
STF RE 870.947/SE REPERCUSSÃO GERAL TEMA 810.
