Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2069230 / SP
0001671-94.2012.4.03.6183
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE. LABOR ANOTADO EM CTPS.
APOSENTADORIA PROPORCIONAL. DIREITO DE OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS
VANTAJOSO. EXECUÇÃO DO JULGADO SE OPTADO PELO BENEFÍCIO CONCEDIDO NA
VIA ADMINISTRATIVA. JUÍZO DA EXECUÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE
MORA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS
PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - Cumpre destacar ter a r. sentença incorrido em erro material ao mencionar no dispositivo a
fixação do termo inicial do benefício na data da "citação", quando o correto, de acordo com a
data e as fls. indicadas, seria "requerimento administrativo".
2 - Insta mencionar que nesta fase processual a análise do pedido de suspensão da
antecipação de tutela será efetuada juntamente com o mérito das questões trazidas a debate
pelo recurso de apelação.
3 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal,
especificamente na Lei de Benefícios.
4 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por
qualquer modalidade de prova.
6 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador.
7 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
8 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
9 - A r. sentença reconheceu como comum o período laborado de 04/05/1987 a 02/06/1987 - na
empresa Móveis Pastore S/A., e, como especiais, os períodos laborados de 02/04/1975 a
01/09/1980 - na empresa Nordeste Segurança de Valores Ltda., e de 01/07/1993 a 06/07/1999 -
na empresa Belfort Segurança de Bens e Valores Ltda., e condenou o INSS a implantar, em
favor do autor, o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição a partir da data
do requerimento administrativo (19/04/2011).
10 - Conforme Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPs: no período de 02/04/1975 a
01/09/1980, laborado na empresa Nordeste Transporte de Valores Ltda, o autor exerceu a
função de "vigilante", "efetuando rondas internas nos postos de trabalho, portando arma de
fogo, calibre 38", atividade enquadrada no código 2.5.7 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 -
PPP de fls. 73/74; e no período de 01/07/1993 a 06/07/1999, laborado na empresa Belfort
Segurança de Bens e Valores Ltda, o autor exerceu a função de "vigilante", trabalhando
"armado com revólver calibre 38", atividade enquadrada no código 2.5.7 do Anexo do Decreto
nº 53.831/64 - PPP de fls. 71/72.
11 - Saliente-se que, no tocante à profissão de guarda patrimonial, vigia, vigilante e afins,
entendo que é considerada de natureza especial durante todo o período a que está a
integridade física do trabalhador sujeita aos riscos de seu dever de proteger o bem alheio e
inibir eventual ação ofensiva.
12 - Alie-se como robusto elemento de convicção, nesse sentido, a reforma legislativa realizada
pela Lei nº 12.740/2012, que alterou o art. 193 da CLT, para considerar a atividade de vigilante
como perigosa, com o adicional de 30%, em virtude da exposição da categoria a roubos ou
outras espécies de violência, mesmo não fazendo menção a uso de armas.
13 - Ademais, reputa-se perigosa tal função por equiparação da categoria àquelas previstas no
item 2.5.7 do Decreto nº 53.831/64, ainda que não tenha sido incluída pelos Decretos nº
83.090/79 e nº 89.312/84, cujos anexos regulamentares encerram classificação meramente
exemplificativa.
14 - Ressalte-se que essa presunção de periculosidade perdura mesmo após a vigência do
Decreto nº 2.172/97, independentemente do laudo técnico a partir de então exigido.
15 - Aliás, a despeito da necessidade de se comprovar esse trabalho especial mediante estudo
técnico ou perfil profissiográfico, entende-se que tal exigência não se mostra adequada aos
ditames da Seguridade Social pois, ao contrário das demais atividades profissionais expostas a
agentes nocivos, o laudo pericial resulta inviável no caso dos vigias, na medida em que a
avaliação do grau de periculosidade se dá no mesmo âmbito da presunção adotada pelo
enquadramento no Decreto nº 53.831/64, vale dizer, somente seria possível avaliar a efetiva
exposição de risco numa situação real de defesa ao patrimônio tutelado, justamente o que se
procura prevenir com contratação dos profissionais da área da segurança privada.
16 - A propósito da continuidade das circunstâncias de perigo a que exposto o segurado, bem
decidiu este E. Tribunal que "Diferentemente do que ocorre com a insalubridade, na qual ganha
importância o tempo, por seu efeito cumulativo, em se tratando de atividade perigosa, sua
caracterização independe da exposição do trabalhador durante toda a jornada, pois que a
mínima exposição oferece potencial risco de morte, justificando o enquadramento especial , não
havendo que se falar em intermitência, uma vez que o autor exerce a função de vigia durante
toda a jornada de trabalho, assim sendo, a exposição ao risco é inerente à sua atividade
profissional" (10ª Turma, AC nº 2007.03.99.038553-3, Rel. Des. Fed. Sérgio Nascimento, j.
23/06/2009, DJF3 01/07/2009, p. 889).
17 - Possível, portanto, o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de
02/04/1975 a 01/09/1980 e de 01/07/1993 a 06/07/1999, conforme, aliás, reconhecido em
sentença.
18 - Acerca da conversão do período de tempo especial, deve ela ser feita com a aplicação do
fator 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, não importando a época em que
desenvolvida a atividade, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
19 - No tocante ao labor comum, é assente na jurisprudência que a CTPS constitui prova do
período nela anotado, somente afastada a presunção de veracidade mediante apresentação de
prova em contrário, conforme assentado no Enunciado nº 12 do Tribunal Superior do Trabalho.
E, relativamente ao recolhimento de contribuições previdenciárias, em se tratando de segurado
empregado, essa obrigação fica transferida ao empregador, devendo o INSS fiscalizar o exato
cumprimento da norma. Logo, eventuais omissões não podem ser alegadas em detrimento do
trabalhador que não deve ser penalizado pela inércia de outrem.
20 - Em outras palavras, o ente autárquico não se desincumbe do ônus de comprovar eventuais
irregularidades existentes nos registros apostos na CTPS do autor (art. 333, II, CPC/73 e art.
373, II, CPC/15), devendo, desse modo, proceder ao cálculo do tempo de serviço com a devida
inclusão dos vínculos laborais em discussão.
21 - Para comprovar o trabalho no período de 04/05/1987 a 02/06/1987, o autor apresentou
cópia de sua CTPS (fl.10) e registro de empregado (fl. 78), demonstrando o alegado labor para
Móveis Pastore S/A.
22 - Com o advento da emenda constitucional 20/98, extinguiu-se a aposentadoria proporcional
para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998),
assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema,
desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
23 - Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de
forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema
por ocasião da alteração legislativa em comento.
24 - Desta forma, convertendo-se os períodos de atividade especial reconhecidos nesta
demanda em tempo comum, aplicando-se o fator de conversão de 1.4, e somando-os aos
demais períodos comuns já reconhecidos administrativamente pelo INSS (fls. 177/178) e
anotados em CTPS (fls. 35/44), verifica-se que, na data da publicação da EC 20/98
(16/12/1998), o autor contava com 23 anos, 7 meses e 1 dia de tempo de atividade; insuficiente
para a concessão do benefício de aposentadoria.
25 - Computando-se períodos posteriores, verifica-se que na data do requerimento
administrativo (19/04/2011 - fl. 32), o autor contava com 34 anos, 6 meses e 22 dias de tempo
de atividade; suficiente para a concessão do benefício de aposentadoria proporcional por tempo
de contribuição, a partir desta data.
26 - A parte autora recebe benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, sendo assim,
faculta-se ao demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais
vantajoso.
27 - A controvérsia sobre a possibilidade de execução das prestações do benefício concedido
judicialmente na hipótese de opção pelo obtido na via administrativa, mais vantajoso, deverá ser
apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do Tema nº 1.018 pelo
E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado. Observância da
garantia constitucional da duração razoável do processo. Ressalva quanto aos honorários
advocatícios.
28 - No caso de opção pelo benefício judicial, os valores devidos por força da presente
condenação deverão ser compensados com aqueles já pagos administrativamente no período
concomitante.
29 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
30 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
31 - Sagrou vitorioso o autor ao obter o reconhecimento do labor comum e dos períodos de
labor especial, com a consequente concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição. Por outro lado, foi indeferido o pleito de indenização por danos morais, restando
vencedora nesse ponto a autarquia. Desta feita, os honorários advocatícios ficam compensados
entre as partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), sem condenação das partes
no reembolso das custas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o
INSS delas isento.
32 - Remessa necessária e apelação do INSS parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, corrigir o erro
material presente na r. sentença, para constar "data do requerimento administrativo" como
termo inicial do benefício; e dar parcial provimento à remessa necessária e à apelação do INSS,
para determinar a implantação do benefício de aposentadoria proporcional por tempo de
contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (19/04/2011), acrescidas as
parcelas em atraso de correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E e de juros de mora,
incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual,
facultando ao autor a opção de percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso,
observando-se o acima expendido quanto à execução dos valores atrasados; além de
reconhecer a ocorrência da sucumbência recíproca; mantendo, no mais, a r. sentença proferida
em primeiro grau de jurisdição
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
