
| D.E. Publicado em 20/09/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo da parte autora para, reconhecendo o período laborativo rural de 10/02/1971 a 30/06/1978, condenar o INSS no pagamento de aposentadoria proporcional por tempo de serviço/contribuição, desde a data da citação (03/07/2008), sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando, ainda, a autarquia no pagamento da verba honorária, fixada em 10% sobre o valor das parcelas vencidas, contadas estas até a data de prolação da sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010431-09.2006.4.03.6000/MS
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por DALVA REGINA PAULETTO FRITZEN em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural sob regime de economia familiar.
A r. sentença de fls. 330/335, julgou improcedentes os pedidos, determinando custas ex lege e fixando honorários sucumbenciais em R$1.000,00.
Em razões de apelação de fls. 349/354, a autora pugna pela reforma da sentença alegando, em suma, que apresentou provas documentais e testemunhais suficientes e aptas à comprovação do labor rural; que o imóvel de sua família não pode ser considerado como latifúndio, pois conforme declarou em entrevista rural, apenas uma fração da área seria destinada à agricultura, sendo a maior parte coberta por mata; que o enquadramento de seu genitor como empregador rural nos recibos do INCRA não desconfiguraria o trabalho agrícola em regime de economia familiar; que seu grupo familiar seria extenso (composto por genitores e 10 irmãos), o que representaria mão-de-obra compatível com a produção constante das notas fiscais, descrita pelo Juízo de 1º grau como "grande produção".
O INSS não apresentou contrarrazões.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
No entanto, não há necessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Impende registrar que é pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Do caso concreto.
Pretende a parte autora o reconhecimento do labor rural desempenhado em regime de mesmo núcleo familiar, no período de 10/02/1971 (aos 12 anos de idade) até 30/06/1978, com a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data de entrada do requerimento administrativo (10/05/2004).
Para comprovar o alegado labor rural, a autora apresentou os seguintes documentos:
- Certificados de cadastro de imóvel rural em nome do pai da autora, Sr. Olívio Pauletto, relativos aos exercícios de 1971 a 1979 (fls. 22/26);
- Notas fiscais emitidas em nome do pai da autora, Sr. Olívio Pauletto, comprovando a comercialização de produtos de origem agrícola - soja e trigo - nos anos de 1974 a 1977 (fls. 27/30, 67 e 165/168);
- Inscrição do pai da autora, Sr. Olívio Pauletto, no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Faxinal do Soturno, datada de 26/08/1980, com menção a pagamentos de anuidades nos anos de 1980 a 1989 (fls. 31).
Apenas se diga que, quanto à documentação expedida pelo INCRA (referente a imóvel rural familiar), a classificação descrita é de minifúndio, com enquadramento sindical que, embora conste como empregador rural, não descreve assalariados, sendo que, de mais a mais, as dimensões de propriedade são verdadeiramente diminutas, não alcançando sequer 01 módulo rural local.
Não há, portanto, elementos robustos a desconfigurarem o regime de economia familiar aventado.
Tendo em vista a existência de remansosa jurisprudência no sentido de ser extensível à mulher a condição de rurícola nos casos em que os documentos apresentados, para fins de comprovação de atividade campesina exercida em regime de economia familiar, indiquem familiar próximo como trabalhador rural (no caso, o genitor), afigura-se possível reconhecer que as alegações da autora baseiam-se em razoável início de prova material, a qual foi corroborada por idônea e segura prova testemunhal.
E bem se vê que os depoimentos colhidos em audiência alinham-se aos elementos contidos na documentação retro transcrita: a testemunha Iraci Higino Druzian (fls. 320) afirmou conhecer a autora até quando ela morou em Restinga Seca e tinha por volta de 20 anos (ano de 1979, eis que nascida em 1959); que até então a autora morou com os pais no interior do município, localidade de São Rafael; que a única atividade e fonte de renda da família era a agricultura; que não havia empregados, que só a família trabalhava; que a autora trabalhava na lavoura, colhia arroz e tirava leite dos animais; que na época não havia máquinas e era tudo no trabalho braçal. O depoente Luiz Carlos Nogara (fls. 321) afirmou que a autora morou na localidade de São Rafael e há tempo foi embora, por volta de 30 anos atrás (ano de 1979); que na época em que morou naquela cidade, trabalhava na lavoura ajudando seu pai; que era só a família que trabalhava; que a autora capinava e ajudava na plantação e a lidar com os animais. Por fim, a testemunha Edir José Marcuzzo (fls. 322) afirmou que conhece a autora desde pequena; que na época a autora trabalhava na lavoura com a família e que não havia empregados; que todo o trabalho era manual.
Ante o conteúdo material indiciário, conjugado com o discurso de testemunhas idôneas, conclui-se pelo acolhimento das atividades rurais da autora, em regime de mesmo núcleo familiar, no período de 10/02/1971 (a partir dos 12 anos de idade) até 30/06/1978.
E ao cabo desta análise, mister tecer-se considerações acerca da concessão de aposentadoria.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
"Observado o disposto no art. 4º desta Emenda e ressalvado o direito de opção a aposentadoria pelas normas por ela estabelecidas para o regime geral de previdência social, é assegurado o direito à aposentadoria ao segurado que se tenha filiado ao regime geral de previdência social, até a data de publicação desta Emenda, quando, cumulativamente, atender aos seguintes requisitos:
I - contar com cinqüenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de idade, se mulher; e
II - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que, na data da publicação desta Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea anterior.
§ 1º - O segurado de que trata este artigo, desde que atendido o disposto no inciso I do "caput", e observado o disposto no art. 4º desta Emenda, pode aposentar-se com valores proporcionais ao tempo de contribuição, quando atendidas as seguintes condições:
I - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta anos, se homem, e vinte e cinco anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a quarenta por cento do tempo que, na data da publicação desta Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea anterior" (grifos nossos).
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
"A EC nº 20/98, em seu art. 9º, possibilitou, ressalvado o direito de opção à aposentadoria pelas normas estabelecidas para o regime geral de previdência social, o direito à aposentadoria ao segurado que se tenha filiado ao regime geral de previdência social, até a data de sua publicação, desde que preencha cumulativamente os seguintes requisitos:
(...)
A EC nº 20/98 permitiu, ainda, que o segurado possa aposentar-se com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, quando atendidas as seguintes condições:
- 53 anos de idade, se homem, e 48 anos de idade, se mulher;
- tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) 30 anos, se homem, e 25 anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a 40% do tempo que, na data da publicação da EC nº 20/98, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea anterior."
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
"Regras transitórias: para os que já estavam no regime geral de previdência na data da vigência da Emenda Constitucional nº 20, mas ainda não haviam implementado o tempo de serviço necessário para se aposentar, o art. 9º da referida Emenda fixou as chamadas regras transitórias, que exigem o implemento de outros requisitos para obtenção dos benefícios.
Assim, além do tempo mínimo de contribuição de trinta e cinco e trinta anos, homens e mulheres devem preencher, cumulativamente, o requisito da idade mínima, qual seja, 53 e 48 anos de idade, respectivamente."
(Marisa Ferreira dos Santos e outros, Curso de Direito Constitucional, Ed. Saraiva, 5ª ed., pg. 557).
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
"Dessa forma, para fazer jus à aposentadoria proporcional consoante a regra revogada, o segurado deve preencher os requisitos necessários até a edição da referida emenda. Do contrário, deverá submeter-se à regra de transição. (...)
Assim, considerando-se que no caso em apreço, até 15/12/98 o segurado não possuía 30 anos de tempo de serviço, e tendo em vista que, em se computando o tempo de trabalho até 2000, o segurado, naquela data, não tinha a idade mínima, impõe-se o indeferimento do benefício."
(STJ, REsp nº 837.731/SP, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma, DJe 24/11/2008).
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
"Do mesmo modo, os trabalhadores que tenham cumprido todos os requisitos legais para a obtenção de sua aposentadoria ou de qualquer outro benefício, terão também os seus direitos respeitados, podendo valer-se da legislação vigente.
Além disso, serão reconhecidas as expectativas de direito dos atuais segurados da Previdência Social segundo regras baseadas no critério de proporcionalidade, considerando-se a parcela do período aquisitivo já cumprida".
Por fim, consigne-se que o próprio INSS disciplinou, internamente, a questão da cumulatividade, conforme orientação expressa no art. 223, II, da Instrução Normativa nº 45/2010.
Conforme planilha em anexo, procedendo-se ao cômputo do intervalo rural reconhecido nesta demanda - 10/02/1971 a 30/06/1978 - acrescido do tempo entendido como incontroverso (CTPS de fls. 15/21 e CNIS), verifica-se que a autora, em 10/05/2004 (data do requerimento administrativo), contava com 28 anos e 15 dias de tempo de serviço, o suficiente à concessão do benefício de aposentadoria proporcional por tempo de serviço/contribuição pelas regras permanentes posteriores à citada Emenda Constitucional, cumprido, ainda, o pedágio necessário.
Entretanto, o requisito etário exigido (48 anos, para o sexo feminino) somente foi implementado em 10/02/2007, após o ajuizamento da presente demanda.
Assim sendo, o marco inicial do benefício deve ser estabelecido na data da citação da autarquia (03/07/2008), momento em que todas as exigências à concessão restariam devidamente cumpridas.
Anote-se que o requisito carência restou cumprido, consoante anotações em CTPS.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
O termo ad quem a ser considerado continua sendo a data da prolação da sentença, ainda que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Explico. Na hipótese de procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos distintos em relação ao que foi decidido. Portanto, não considero lógico e razoável referido discrímen, a ponto de justificar o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que exercem suas funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação.
Isento a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais.
Ante o exposto, dou provimento ao apelo da parte autora para, reconhecendo o período laborativo rural de 10/02/1971 a 30/06/1978, condenar o INSS no pagamento de aposentadoria proporcional por tempo de serviço/contribuição, desde a data da citação (03/07/2008), sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando, ainda, a autarquia no pagamento da verba honorária, fixada em 10% sobre o valor das parcelas vencidas, contadas estas até a data de prolação da sentença.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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