
| D.E. Publicado em 03/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações do INSS e do autor, e dar parcial provimento à remessa necessária, para assentar que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e para estabelecer que os juros de mora incidirão até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, mantidos os demais termos estabelecidos na r. sentença de Primeira Jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0035931-69.2010.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelações interpostas, pelo autor JOSÉ FLORISVAL FERNANDES e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de fls. 190/193 julgou procedente o pedido formulado e condenou o requerido à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, no valor de um salário mínimo mensal, a contar da data da citação, devendo as prestações em atraso serem pagas de uma só vez, acrescidas de correção monetária a contar do vencimento de cada parcela e juros de mora a partir da citação. Autarquia condenada no pagamento dos honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o total das prestações vencidas, nos termos da Súmula 111, do STJ. Réu isentado das custas na forma da lei. Sentença submetida ao reexame obrigatório.
Apelou o autor (fls. 198/202), requerendo a reparação dos critérios de apuração da renda mensal inicial - RMI, e o deferimento da tutela antecipada.
O INSS apresenta apelação (fls. 208/216), pleiteando a reforma da sentença para excluir da averbação do tempo rural o período de 01/01/1967 a 31/12/1968 e de 01/01/1970 a 31/12/1972, sob argumento de que as provas juntadas aos autos seriam insuficientes à comprovação do alegado labor na condição de rurícola. Para além, a parte autora não cumprira os requisitos necessários à concessão do benefício. Por fim, prequestiona a matéria.
Devidamente processados os recursos, com as contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 01/10/2009, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
Busca a parte autora, na demanda presente, o reconhecimento do labor rural de outrora, desempenhado de 01/01/1967 até 31/12/1972, em prol da concessão, a si, de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, desde a data da postulação administrativa - merecendo destaque, aqui, o período já acolhido pelo INSS (em sede administrativa, e reafirmado em contestação) relativo ao ano de 1969 - de 01/01/1969 a 31/12/1969, o que o torna notadamente incontroverso nos autos.
Do labor rural.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Impende registrar que é pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Para comprovar o suposto labor rural, foram apresentados os seguintes documentos, em nome próprio do autor (doravante, em sequência cronológica):
a) Certificado de Dispensa de Incorporação, expedido em 20/11/1969, no qual é qualificado como agricultor (fl. 27);
b) Certidão do Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt, emitida em 03/11/2004, certificando que o requerente, ao requerer a Carteira de Identidade em 24/10/1972, apresentou Certidão de Casamento, declarando exercer a profissão de lavrador, bem como residir na Fazenda São João - Guariroba/SP (fl. 29);
c) Requerimento de exame de sanidade, emitido pelo Delegado de Polícia de Taquaritinga, datado de 07/06/1974, no qual o autor é qualificado como lavrador (fl. 31);
d) Atestado de residência, emitido pela Delegacia de Polícia de Taquaritinga/SP - Secretaria de Segurança Pública, firmado em 14/06/1974, no qual o requerente é qualificado como lavrador (fl. 32);
e) Exame Psicossomático e Psicotécnico, realizado em 17/06/1978, no qual o requerente é qualificado como lavrador (fl. 30).
Além da documentação trazida como início de prova material hábil a comprovar o exercício de labor rural, em audiência realizada em 14/06/2011, foram ouvidas três testemunhas, José Carlos Papassidro (fl. 172/175), José Alcenio Savazzi (fl. 176/179) e Arlindo Turra (fls. 180/182).
A testemunha José Carlos Papassidro afirmou que:
(...)
J: Lida a inicial. Conhece o José Florisval Fernandes?
D: Conheço.
J: Conhece desde quando?
D: Trabalhamos juntos.
J: Trabalhou junto com ele quando?
D: No Lotério de Carli até...desde 1964 a 1970.
J: Ele era o que nesse Lotério, o senhor lembra?
D: Ele plantava amendoim, era parceiro, era arrendatário de cereais, que ele comprava e vendia.
J: O senhor trabalhava para ele ou não?
D: Trabalhava.
J: Era Empregado do Lotério?
D: Era o José Florisval era.
J: O senhor também era arrendatário?
D: Não, não, a gente trabalhava por dia por...
J: Ele trabalhava todo dia lá?
D: Trabalhava.
J: O que ele fazia lá especificamente, arrendatário para fazer o que?
D: O José?
J: É.
D: Nós trabalhava por dia para esse Lotério, passava ferramenta, carpia.
J: Mas lá na Fazenda tinha o na época?
D: Tinha algodão, amendoim, tinha tomate.
J: Aonde era essa fazenda?
D: É propriedade do Orlando Previdelli.
J: Mas onde era?
D: Guariroba.
J: Tem quantos alqueires lá?
D: Ai, tinha uns vinte alqueires.
J: Depois que ele saiu ele foi para onde, o senhor sabe?
D: Eu trabalhei lá até 1970.
J: Ele ficou?
D: É, ele ficou e eu fui para Osvaldo Cruz.
J: Depois o senhor perdeu o contato?
D: É, depois eu voltei no 1975 e ele trabalhava no Chimbó, na usina.
(...)
Advogado: Como era a forma de pagamento?
D: Pagava de quinze, vinte dias.
J: O senhor não lembra como pagava?
D: Sei, pagava em dinheiro, alguma vez pagava em cheque.
(...)
Advogado: Eram registrados?
D: Não.
J: E nem contrato de arrendamento até fazia?
D: Não, era no fio do bigode essa época aí.
(...)
Advogado: O Lotério arrendava terra de quem?
D: Era do Orlando.
J: Ele trabalhava para o Orlando?
D: Ele arrendava terra e plantava por conta e nós trabalhava para o Lotério.
J: Os senhores eram empregados do Lotério?
D: É.
(...)
Advogado: Os senhores ganhavam igual, de forma igual?
D: Era mais ou menos igual, né.
(...)
Advogado: O Lotério tinha empregados?
D: Tinha, ele a máquina de amendoim, também porque quando acabava as coisas assim ele comprava cereais e nós trabalhava na máquina de amendoim também."
O depoente José Alcenio Savazzi afirmou que:
(...)
J: Lida a inicial. Conhece o José Florisval Fernandes?
D: Conheço bastante.
J: Conhece ele desde quando?
D: Desde moleque, desde os dez anos, onze anos (anos de 1959, 1960).
J: Senhor sabe se ele chegou a trabalhar como rural?
D: Trabalhava, trabalhava no Lotério.
J: Chegou a trabalhar no Lotério?
D: Trabalhava.
J: O senhor trabalhou lá que período?
D: Ai, eu tinha onze anos.
J: Mas de que ano a que ano mais ou menos?
D: Mais ou menos no 1960 até 1966, por aí.
J: O senhor trabalhou lá?
D: Trabalhei e ele trabalhou lá, ele continuou lá.
J: Ele começou lá quando?
D: Quando eu comecei ele já estava lá.
J: Antes de 1960 ele já estava lá?
D: Acho que trabalhava já.
J: E aí o senhor saiu em 1966 e ele continuou?
D: Continuou.
J: Ele era empregado de quem?
D: Do Lotério.
J: Ele cumpria ordens de quem?
D: Do Lotério.
J: O Lotério que dava ordens?
D: É.
J: E vocês ficavam a disposição do Lotério?
D: Ficava.
J: Tinha horário para entrar e horário pra sair.
D: Ai, não tinha, não tinha não.
J: Como é que eram feitos os pagamentos, o senhor se recorda?
D: Ali ele pagava a gente, ali era sei lá, quando a gente cobrava, quando a gente pedia, não era assim...
J: Mas pegava em cheque, dinheiro?
D: Dinheiro, dinheiro.
J: Depois que ele saiu o senhor perdeu o contato?
D: Eu fui para um sítio, tinha um sítio e aí eu fui para o sítio e ele trabalhou mais uns tempos ainda e ele saiu e foi para a usina e sei lá, a gente conhece ele até agora, mas...
(...)
Advogado: Depois do Lotério o senhor sabe onde ele foi trabalhar?
D: Ele foi para a usina ali na vila, no Chimbó.
(...)
Advogado: Como chama a fazenda?
D: Que ele foi trabalhar é Chimbó, pelo nome eu não tenho certeza absoluta, mas era Chimbó.
Advogado: O sítio era do seu pai?
D: Era.
J: Qual é o nome do seu pai?
D: Reinaldo Savazzi.
J: O senhor viu ele trabalhando lá mesmo depois que saiu?
D: Via, é perto, é dentro da vila.
J: E depois de 1966 o senhor passava lá e via ele trabalhando?
D: Sim, via."
Por fim, a testemunha Arlindo Turra afirmou que:
(...)
J: Lida a inicial. Conhece o seu José Florisval Fernandes?
D: Sim, sim.
J: Conhece há quanto tempo?
D: Ai, doutor, é desde escola que nós se conhece.
J: Chegou a trabalhar com ele?
D: "Trabalhemos".
J: Aonde?
D: No Lotério de Carli.
J: Em que ano foi?
D: Nós "trabalhemos" desde 1963, 1964.
J: O senhor entrou lá quando?
D: Faz muito tempo, só que no 1963 eu tenho certeza que nós estava lá.
J: Ele já estava lá em 1963.
D: Estava no sítio, na vila, no sítio.
J: O senhor saiu de lá quando?
D: Eu saí no ano de 1975.
J: Ele saiu de lá quando?
D: De lá...acho que 1970 e pouco.
J: Sabe se ele trabalhou lá até 1972?
D: Trabalhou.
J: Ele fazia o que lá?
D: No começo o homem tinha a máquina de amendoim.
J: Os senhores eram empregados?
D: Empregados.
J: Cumpriam ordens de quem?
D: Era dele mesmo.
J: Ele era arrendador?
D: Era arrendatário, tinha uma máquina de amendoim e comprova cereais.
J: De quem era a terra?
D: Do Mario Previdelli.
J: Como é que era feito o pagamento, dinheiro, cheque?
D: Tinha vez que fazia em cheque.
J: Mas como era a forma de pagamento?
D: Não tinha, não é que nem hoje, coisa certa.
J: Mas ele pagava todos os meses?
D: É.
J: Ele trabalhava todos os dias?
D: Todos os dias, não tinha..."
Assim, a prova oral reforça o labor no campo e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, tornando possível o reconhecimento do labor rural nos interregnos controvertidos de 01/01/1967 a 31/12/1968 e de 01/01/1970 a 31/12/1972, exceto, todavia, para fins de carência.
Embora não integrem a presente discussão, merecem relevo os seguintes períodos (adotados como especiais pelo INSS, em sede administrativa, fls. 106/109), a serem utilizados no cômputo do ciclo laboral da parte demandante: 18/05/1982 a 08/11/1982, 11/04/1983 a 30/10/1986, 28/01/1987 a 13/10/1987 e 05/04/1988 a 06/11/1989.
Da aposentadoria.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Conforme planilha anexa, computando-se os lapsos rurais reconhecidos nesta demanda, somando-os aos demais lapsos laborativos (fls. 106/109), constata-se que, na data do pedido administrativo, aos 13/01/2006, o autor cumprira 36 anos, 08 meses e 05 dias de serviço, assegurando-lhe o direito à aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição, não havendo que se falar em aplicação do requisito etário, nos termos do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal. Neste ponto, imperiosa a manutenção da r. sentença.
Cumpre consignar que o cálculo da renda mensal será oportunamente realizado em sede de execução, isso porque, na fase de conhecimento, a solução da controvérsia deve se ater ao direito postulado, qual seja, a verificação do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
O cálculo da renda mensal inicial é atribuição afeta à autarquia previdenciária, por ocasião do cumprimento da obrigação de fazer (implantação do benefício), e a apuração das parcelas em atraso terá lugar por ocasião da deflagração do incidente de cumprimento de sentença, previsto no art. 513 e seguintes do Código de Processo Civil.
A esse respeito, confira-se precedente desta Corte:
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Por fim, quanto às providências atinentes à antecipação da tutela jurisdicional, verificáveis às fls. 228/230.
Ante o exposto, nego provimento às apelações do INSS e do autor, e dou parcial provimento à remessa necessária, para assentar que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e para estabelecer que os juros de mora incidirão até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, mantidos os demais termos estabelecidos na r. sentença de Primeira Jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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