
| D.E. Publicado em 18/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000004-08.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada por JACI MARCELINO DA CRUZ, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de fls. 48/53 julgou parcialmente procedente o pedido, "somente para declarar que o autor, no período de 02 de novembro de 1962, data em que completou quatorze anos, até 17 de fevereiro de 1976, dia anterior ao primeiro emprego com registro em carteira, laborou como rurícola, como boia-fria, determinando que o requerido proceda à averbação necessária". Fixou a sucumbência recíproca.
Em razões recursais de fls. 55/57, o INSS pleiteia a reforma da sentença, ao argumento de que as provas juntadas aos autos são insuficientes para a comprovação do alegado labor rural entre os anos de 1962 e 1976. Aduz que a documentação é frágil e os "depoimentos genéricos", razão pela qual "se afigura indevida a declaração de todo o tempo de serviço rural mencionado".
Contrarrazões do autor às fls. 60/69.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural, nos períodos de 01/11/1961 a 17/02/1976, 14/05/1976 a 28/02/1981, 22/03/1983 a 01/05/1988, 23/10/1990 a 01/07/1991, 22/09/1993 a 30/01/1994, 01/10/1996 a 30/09/1998, 05/03/2004 a 10/06/2005, 10/08/2005 a 30/07/2008 e 21/02/2009 a 30/08/2009.
Passo ao exame do labor rural.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
A prova material juntada aos autos, a respeito do labor no campo do autor, é a sua própria certidão de casamento, ocorrido em 06/07/1974, na qual é qualificado como lavrador (fl. 09).
O documento juntado é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborado por idônea e segura prova testemunhal.
A testemunha do autor, Sr. Geraldo Gomes de Proença (fls. 44), afirmou que conhece o autor desde a infância e que "o autor trabalhava na lavoura, para uns e outros, como boia-fria", sendo que já trabalharam juntos para os proprietários "Balaio, Massakata, sempre na lavoura". Disse que após o casamento, o autor continuou a trabalhar no campo, não sabendo especificar até quando. Esclareceu, ainda, que "depois que entrou na Itabira, ele voltou a trabalhar na lavoura, para uns e outros, quando não tinha emprego com registro em carteira".
O depoente Sr. Vandir Mendes de Queiroz (fls. 45) afirmou que conhece o autor "há mais de quarenta anos, de Ribeirão Grande", e que "antes de se casar, ele trabalhava sempre na roça, para terceiros, para empreiteiros, como meeiro, boia-fria", tendo trabalhado para "Antonio Balaio, Eduardo Brizola e mais Massakati Oikawa". Confirmou que após o casamento o autor "continuou trabalhando na roça. Depois arrumou emprego na fábrica de cimento, Itabira". Acrescentou, por fim, que "ele voltou a trabalhar na lavoura quando ficava desempregado".
A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória do documento carreado aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino desde 02/11/1962 (quando o autor completou 14 anos de idade, conforme assentado pela r. sentença de 1º grau), até 17/02/1976, um dia antes do primeiro vínculo urbano registrado em CTPS.
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Nesse contexto, a despeito da possibilidade de reconhecimento da atividade campesina a partir dos 12 anos, mantenho o termo inicial fixado pelo Digno Juiz de 1º grau (02/11/1962), em observância ao princípio da non reformatio in pejus.
Com relação aos demais períodos questionados pelo autor na exordial, perfilho do mesmo entendimento assentado pela r. sentença de 1º grau, no sentido de que "a pretensão não merece acolhida, porquanto não juntou aos autos um único documento sequer que sirva como início de prova material de que tenha voltado para a atividade rural, nos período em que ficou sem emprego com vínculo empregatício. Ademais, não é crível que tenha voltado para a lavoura depois que trabalhou em várias empresas com vínculo empregatício de natureza urbana, pois não é o que ordinariamente acontece, mas o contrário" (fl. 51).
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
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Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
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Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
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Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
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Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
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Por fim, consigne-se que o próprio INSS disciplinou, internamente, a questão da cumulatividade, conforme orientação expressa no art. 223, II, da Instrução Normativa nº 45/2010.
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Conforme planilha anexa, procedendo ao cômputo do labor rural reconhecido nesta demanda (02/11/1962 a 17/02/1976), acrescido dos períodos de trabalho considerados incontroversos (CTPS de fls. 10/15 e CNIS em anexo), verifica-se que, até a data de prolação da sentença (16/08/2010), o autor contava com 29 anos e 11 dias de serviço, tempo insuficiente para a concessão da aposentadoria postulada, mesmo que na modalidade proporcional, considerando o descumprimento da exigência referente ao tempo adicional (pedágio).
De qualquer sorte, fica assegurado ao demandante o reconhecimento da atividade campesina desempenhada no período de 02/11/1962 a 17/02/1976, nos moldes estabelecidos pelo r. provimento jurisdicional de 1º grau.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau.
É como voto.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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| Data e Hora: | 05/07/2017 19:10:12 |
