D.E. Publicado em 12/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, para restringir o reconhecimento do labor rural ao período de 08/07/1966 a 30/09/1985, mantida, entretanto, a concessão da aposentadoria integral por tempo de contribuição, devida desde a citação (13/07/2011), bem como para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e para que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, sejam fixados de acordo com o mesmo Manual, facultando-se ao autor a opção de percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso e, por maioria, possibilitar a execução das parcelas em atraso decorrentes do benefício concedido judicialmente até o dia anterior à implantação do benefício mais vantajoso concedido na via administrativa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0034372-09.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada por DILSO PORFIRIO DE ARAUJO, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de fls. 101/102 julgou procedente o pedido, para reconhecer o labor rural no período de 08/07/1965 a 08/09/1987, condenando a Autarquia no pagamento e implantação do benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir da data da citação (13/07/2011), acrescidas as parcelas vencidas de correção monetária e juros de mora. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.
Em razões recursais de fls. 118/133, o INSS pleiteia a reforma da r. sentença, ao argumento de que as provas juntadas aos autos são insuficientes para a comprovação do alegado labor na condição de rurícola. Aduz a impossibilidade de reconhecimento do trabalho realizado por menores de 14 anos, insurgindo-se, ainda, quanto ao fato de que "o tempo de serviço prestado pelo trabalhador rural anterior a novembro de 1991 não se presta para efeito de carência".
Contrarrazões da parte autora às fls. 141/143.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 29/02/2012, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, § 2º do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS a implantar, em favor da parte autora, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural no período compreendido entre 08/07/1965 e 08/09/1987.
Passo ao exame do labor rural.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
As pretensas provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo do autor, são:
a) Certidão de casamento dos genitores do autor, realizado em 19/03/1960, na qual seu pai é qualificado como lavrador (fl. 18);
b) Certificado de Dispensa de Incorporação, datado de 17/05/1973, no qual o autor é qualificado como lavrador (fl. 19);
c) Título Eleitoral, de 06/08/1974, no qual o autor também é qualificado como lavrador (fl. 20);
d) Certidão de Casamento, realizado em 25/10/1980, constando a profissão do autor como sendo lavrador (fl. 21);
e) Certidão de nascimento dos filhos, de 18/01/1982, 20/12/1982, 19/06/1984 e 08/08/1985, todas qualificando o autor como agricultor (fls. 22/25);
f) Comprovantes de pagamentos efetuados ao genitor do autor, em razão da venda de café, nos anos de 1978 e 1981 (fls. 27/36);
A vasta documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal.
A testemunha do autor, Sr. Nirceu Janegitz (fl. 108/111), afirmou ter conhecido o autor no ano de 1977, quando foi "morar no sítio da família Vaccari e ele morava vizinho". Disse que o autor "trabalhava na roça como porcenteiro", juntamente com o pai, ficando com 40% da colheita do café, enquanto "sessenta por cento era do patrão". Declarou, ainda, que após 1985 o autor "veio pra cidade trabalhar na usina".
O depoente Sr. José Roberto Vaccari (fls. 112/113) afirmou que era proprietário do sítio onde o autor trabalhou junto com o pai, entre os anos de 1965 e 1985. Disse que após tal período o autor foi trabalhar na "usina".
Por fim, também a testemunha, Sr. Aparecido Pedro (fls. 114/115), afirmou ter conhecido o autor no período de 1975 até 1983, na "Fazenda São João, dos Vaccari", onde o autor, juntamente com sua família, trabalhou "como porcenteiro de café".
A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho desde 08/07/1966 (quando o autor completou 12 anos de idade), até 30/09/1985, em conformidade com os depoimentos das testemunhas e com o próprio relato contido na exordial.
Com efeito, narra o autor que desde os 11 anos de idade "começou a trabalhar juntamente com seus pais, na propriedade agrícola da família Vaccari", sendo que "do ano de 1971 até setembro do ano de 1985 (...) passaram a trabalhar na condição de porcenteiros agrícolas da Fazenda São João, propriedade agrícola esta também pertencente à família Vaccari" (fl. 04). A despeito da ausência de informações quanto ao labor praticado no período subsequente - de setembro de 1985 até a primeira anotação em CTPS, em 09/09/1987 - pede o reconhecimento do trabalho como rurícola até o dia anterior a tal registro. As testemunhas, entretanto, declaram que o autor, após 1985, foi trabalhar na "usina", não sendo possível inferir desta informação que o trabalho se dava nas lides rurais. Nesse contexto, resta indubitável a condição de rurícola até 30/09/1985, nos termos anteriormente expendidos.
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Conforme planilha anexa, procedendo ao cômputo do labor rural reconhecido nesta demanda (08/07/1966 a 30/09/1985), acrescido daqueles considerados incontroversos (CTPS de fls. 37/54 e CNIS em anexo), constata-se que o demandante alcançou 36 anos e 02 meses de serviço na data da citação (13/07/2011 - fl. 61), o que lhe assegura, a partir daquela data, o direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição, não havendo que se falar em aplicação do requisito etário, nos termos do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal.
O requisito carência restou também completado, consoante anotação em CTPS e extrato do CNIS, em anexo, cabendo ressaltar que o período de labor rural ora reconhecido não está sendo computado para tal finalidade, em observância ao disposto no art. 55, §2º da Lei nº 8.213/91.
Termo inicial deve ser mantido na data da citação (13/07/2011), momento em que consolidada a pretensão resistida, tendo em vista a inexistência de pedido administrativo.
Verifico, pelo Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, que a parte autora recebe o benefício de aposentadoria por invalidez. Sendo assim, faculto ao demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais vantajoso, vedado o recebimento em conjunto de duas aposentadorias, nos termos do art. 124, II, da Lei nº 8.213/91, e, com isso, condiciono a execução dos valores atrasados à opção pelo benefício concedido em Juízo, uma vez que se permitir a execução dos atrasados concomitantemente com a manutenção do benefício concedido administrativamente representaria uma "desaposentação" às avessas, cuja possibilidade - renúncia de benefício - é vedada por lei - art. 18, §2º da Lei nº 8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C. Supremo Tribunal Federal na análise do RE autuado sob o nº 661.256/SC.
Neste sentido também:
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restou perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Isento a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais, registrando ser a parte autora beneficiária da assistência judiciária gratuita (fl. 60).
Ante o exposto, dou parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, para restringir o reconhecimento do labor rural ao período de 08/07/1966 a 30/09/1985, mantida, entretanto, a concessão da aposentadoria integral por tempo de contribuição, devida desde a citação (13/07/2011), bem como para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e para que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, sejam fixados de acordo com o mesmo Manual, facultando-se ao autor a opção de percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso, condicionando, entretanto, a execução dos valores atrasados à necessária opção por aquele cujo direito foi reconhecido em Juízo, mantendo, no mais, íntegra a sentença de primeiro grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 01/03/2018 14:25:28 |