
| D.E. Publicado em 23/01/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, para reconhecer o exercício de labor rural no período de 01/01/1962 a 31/12/1975 e de atividade urbana nos períodos de 26/07/1976 a 01/08/1977, 04/01/1990 a 30/08/1990 e 12/03/1991 a 23/04/1992, e para condenar a Autarquia no pagamento e implantação do benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, a ser calculada com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98, devida a partir da data do requerimento administrativo (24/03/2005), facultando-se ao autor a opção pela aposentadoria por tempo de contribuição na modalidade integral, com base nas novas regras, a partir daquela data, estabelecendo, ainda, que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, bem como na verba honorária fixada em 10% sobre as parcelas vencidas, contadas estas até a data de prolação da sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012802-06.2008.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por CARLOS MAIOR RAMOS em ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural, bem como de períodos laborados em atividades comuns, não averbados pelo INSS.
A r. sentença de fls. 82/84 julgou improcedente o pedido, e condenou a parte autora no pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados no valor de R$500,00 (quinhentos reais), observados os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Em razões recursais de fls. 87/94, a parte autora sustenta ter comprovado o labor rural no período alegado na inicial, o qual, somado ao período de atividade urbana, lhe conferiria o direito à obtenção do beneficio pleiteado. Aduz, ainda, que o próprio INSS reconheceu administrativamente a existência de contribuições suficientes para o atendimento da carência exigida.
Contrarrazões do INSS às fls. 98/101.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural exercido entre os anos de 1961 e 1975, e averbação de períodos de trabalho urbano, devidamente anotados em CTPS e/ou registrados no seu CNIS.
Passo ao exame do labor rural.
Cumpre ressaltar que o art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
As pretensas provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo do autor, são:
a) Registro escolar (Livro de Matrícula), referente ao ano de 1962, no qual o genitor do autor é qualificado como lavrador (fls. 27/30);
b) Título Eleitoral, datado de 17/08/1968, no qual o autor é qualificado como lavrador (fl. 31);
c) Certificado de Dispensa de Incorporação, datado de 16/07/1971, no qual o autor também é qualificado como lavrador (fl. 32);
d) Atestado de residência, emitido pelo Delegado de Polícia de Tupi Paulista, no qual consta que a profissão exercida pelo requerente, em 15/10/1974, era a de lavrador (fl. 33);
e) Certidão de casamento, de 18/01/1975, na qual consta a profissão do autor como sendo agricultor (fls. 34);
f) Certidão de nascimento do filho, na qual consta que o nascimento ocorreu em 25/09/1975, em "domicílio Rural", sendo o autor ali qualificado como agricultor (fl. 35).
A vasta documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal.
A testemunha do autor, Sr. Antônio Taricani (fls. 78/79), afirmou que conheceu o autor "na época de 1963", sendo que "o autor na época tocava lavoura de café", assim como o próprio depoente. Declarou, ainda, que "o autor ficou mais ou menos de 1963 até os anos de 1975" e que, por todo esse período, teria trabalhado exclusivamente na lavoura, "na propriedade de Nilton de Souza". Por fim, esclareceu que "o autor trabalhava com a família como porcenteiro".
O depoente Sr. Alcides Nunes da Silva (fls. 80/81), corroborando as informações contidas na documentação trazida aos autos, afirmou ter conhecido o autor "em Nova Guataporanga, Cidade esta que fica próximo a Tupi Paulista", sendo que tal fato teria ocorrido no ano de 1962. Confirmou que "o autor trabalhava no Sítio Santo Antonio, na lavoura de café", cujo proprietário era Nilton Souza. Afirmou que ele próprio e o autor teriam permanecido neste sítio "até 1975". Esclareceu, por fim, que o autor "morava no sítio e era empregado", que "vivia com a família", que "durante esse período o autor trabalhou só na lavoura" e que "o pagamento era por porcentagem".
A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho desde 01/01/1962 (ano em que a prova testemunhal confirmou o labor do autor na condição de rurícola) até 31/12/1975, conforme requerido na exordial, cabendo ressaltar que, em sede administrativa, o próprio INSS já reconheceu o exercício de atividade campesina nos lapsos de 01/01/1968 a 31/12/1968 e 01/01/1974 a 31/12/1975 (fls. 16/17).
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Indo adiante, no que concerne ao trabalho urbano exercido nos períodos de 04/01/1990 a 30/08/1990 e 12/03/1991 a 23/04/1992, impõe-se registrar que as anotações dos contratos de trabalho na CTPS do autor (fls. 36/37) comprovam os vínculos laborais mantidos com as empresas "Condor - Engenharia e Comércio Ltda" e "Seplan Serviços de Segurança Ltda", de modo que tais interregnos devem integrar o cálculo do tempo de contribuição do autor, para fins de concessão da aposentadoria ora pleiteada.
Isso porque é assente na jurisprudência que a CTPS constitui prova do período nela anotado, somente afastada a presunção de veracidade mediante apresentação de prova em contrário, conforme assentado no Enunciado nº 12 do Tribunal Superior do Trabalho. E, relativamente ao recolhimento de contribuições previdenciárias, em se tratando de segurado empregado, essa obrigação fica transferida ao empregador, devendo o INSS fiscalizar o exato cumprimento da norma. Logo, eventuais omissões não podem ser alegadas em detrimento do trabalhador que não deve ser penalizado pela inércia de outrem. A propósito do tema, os julgados desta E. Corte a seguir transcritos:
Da mesma forma, o registro no CNIS do autor (em anexo) referente ao trabalho exercido na empresa "Sbil Segurança Bancária e Industrial Ltda" (26/07/1976 a 01/08/1977) constitui prova plena de tal labor, não havendo qualquer razão para que seja excluído do cálculo de tempo de serviço do requerente.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
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A aposentadoria proporcional, por sua vez, foi extinta pela Emenda Constitucional 20/98, que, de forma expressa, assegurou no art. 3º o direito aos que já haviam implementado, até a data de sua publicação, em 16/12/98, o requisito temporal, ou seja, 30 (trinta) anos de trabalho no caso do homem e 25 (vinte e cinco) no caso da mulher, independentemente de qualquer outra exigência (direito adquirido).
A citada Emenda Constitucional também manteve a aposentadoria proporcional para os que já se encontravam filiados ao RGPS na data de sua publicação e não possuíam tempo suficiente para requerê-la, porém estabeleceu na regra de transição, verbis:
Conforme planilha anexa, procedendo ao cômputo do labor exercido tanto no meio rural como no meio urbano, reconhecidos nesta demanda, acrescidos daqueles considerados incontroversos ("resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição" às fls. 16/17 e CNIS em anexo), verifica-se que, até 16/12/1998, data de publicação da Emenda Constitucional 20/98, o autor contava com 30 anos, 07 meses e 15 dias; por outro lado, na data do requerimento administrativo (24/03/2005), alcançou 36 anos, 03 meses e 19 dias de contribuição.
Tem o autor, portanto, direito ao benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98 (direito adquirido, art. 3º da citada emenda constitucional), ou aposentadoria com proventos integrais, com base nas novas regras.
Neste sentido, a opinião doutrinária de Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior inserta nos "Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social", 14ª ed., Ed. Atlas, 2016, p. 216:
Corroborando o entendimento acerca da existência de direito adquirido às regras legais de cálculo, anteriores à Emenda Constitucional nº 20 e à Lei nº 9.876/99, temos os julgados da 7ª e da 9ª Turmas desta Corte:
Dessa forma, tem direito à concessão do benefício pela sistemática mais vantajosa, cabendo ao INSS proceder às simulações, e ao autor, por ocasião da execução do julgado, a opção pela aposentadoria na modalidade que se afigurar mais benéfica, lembrando que os valores em atraso serão devidos somente em relação ao benefício optado.
O requisito carência restou também completado, consoante anotações em CTPS e extrato do CNIS, em anexo, cabendo ressaltar que o período de labor rural ora reconhecido não está sendo computado para tal finalidade, em observância ao disposto no art. 55, §2º da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício escolhido deve ser fixado na data do requerimento administrativo (24/03/2005 - fl. 18).
Verifico, pelo Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS que a parte autora recebe o benefício de aposentadoria por idade, desde 17/08/2013. Sendo assim, faculto ao demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais vantajoso, vedado o recebimento em conjunto de duas aposentadorias, nos termos do art. 124, II, da Lei nº 8.213/91, e, com isso, condiciono a execução dos valores atrasados à opção pelo benefício concedido em Juízo, uma vez que se permitir a execução dos atrasados concomitantemente com a manutenção do benefício concedido administrativamente representaria uma "desaposentação" às avessas, cuja possibilidade - renúncia de benefício - é vedada por lei - art. 18, §2º da Lei nº 8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C. Supremo Tribunal Federal na análise do RE autuado sob o nº 661.256/SC.
Neste sentido também:
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Isento a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais, registrando ser a parte autora beneficiária da assistência judiciária gratuita (fl. 52).
Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora, para reconhecer o exercício de labor rural no período de 01/01/1962 a 31/12/1975 e de atividade urbana nos períodos de 26/07/1976 a 01/08/1977, 04/01/1990 a 30/08/1990 e 12/03/1991 a 23/04/1992, e para condenar a Autarquia no pagamento e implantação do benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, a ser calculada com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98, devida a partir da data do requerimento administrativo (24/03/2005), facultando-se ao autor a opção pela aposentadoria por tempo de contribuição na modalidade integral, com base nas novas regras, a partir daquela data, estabelecendo, ainda, que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, bem como na verba honorária fixada em 10% sobre as parcelas vencidas, contadas estas até a data de prolação da sentença. Faculto ao autor a opção de percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso, condicionando, entretanto, a execução dos valores atrasados à necessária opção por aquele cujo direito foi reconhecido em Juízo.
É como voto.
Desembargador Federal
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