Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1685330 / SP
0039545-48.2011.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. REMESSA NECESSÁRIA TIDA POR INTERPOSTA.
INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVAS TESTEMUNHAIS. RECONHECIMENTO.
INDEPENDENTEMENTE DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. PPP.
RECONHECIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. TEMPO ESPECIAL.
CONVERSÃO EM COMUM. BENEFÍCIO CONCEDIDO. APOSENTADORIA INTEGRAL.
TERMO INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA.
JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA DE
BENEFÍCIO - OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. EXECUÇÃO DO JULGADO
SOMENTE SE A OPÇÃO FOR PELO BENEFÍCIO CONCEDIDO EM JUÍZO. REMESSA
NECESSÁRIA, TIDA POR INTERPOSTA, PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS
DESPROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR PROVIDA.
1 - Não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita
ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo retro mencionado e da Súmula nº 490
do STJ.
2 - Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, com
reconhecimento e cômputo de trabalho em lides rurais, 11/01/1978 a 20/08/1989, e
desempenhado sob condições especiais, no período de 21/08/1989 a 14/02/2011.
3 - O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior
Tribunal de Justiça.
4 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ.
5 - Os documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no
sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes.
7 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação
do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar
apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as
Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
8 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
9 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
10 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes.
11 - A Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida
Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº
1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o
artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a
edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997,
que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico
do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
12 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
13 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
14 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
15 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
16 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
17 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
18 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
19 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
20 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
21 - A pretensa prova material juntada aos autos, a respeito do labor no campo do autor,
consiste em: a) CTPS (fls. 15/18) com 03 (três) registros em empresas agropecuárias nos anos
de 1981, 1982 e 1983, na função de auxiliar de armazém; b) Certidão de casamento (fl. 25)
realizado em 29/06/1984, em que consta a profissão do autor como "lavrador"; c) Certidão de
nascimento do filho do autor, nascido em 11/11/1986, com a profissão do autor como "lavrador"
(fl. 26).
22 - A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos
carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino no período de
11/01/1978 (de acordo com o pedido inicial) a 11/05/1981 (véspera do primeiro registro na
CTPS - fl. 17).
23 - Possível reconhecer também o período de 16/07/1983 (data posterior ao último registro na
CTPS em estabelecimento agrícola) a 20/08/1989 (véspera do primeiro registro em atividade
urbana). Isso porque, os 03 registros posteriores ao período acima reconhecido, se deram em
estabelecimentos agrícolas e compreenderam pequenos vínculos (aproximadamente 2 meses
cada), sempre na mesma época do ano. No mais, a documentação juntada mostrou-se
suficiente e foi satisfatoriamente corroborada pelos depoimentos coerentes e firmes das
testemunhas.
24 - No que se refere ao período de atividade especial, o autor juntou o Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP (fl. 19/22), que comprova o labor em condições insalubres no período de
01/07/1990 a 17/09/2010, laborado na empresa Ítalo Lanfredi SA Indústrias Mecânicas, nas
funções de montador implementos I, rebarbador, vazador e operador equipamento de fundição
III, exposto a ruído, nas intensidades de 92 a 97 dB(A).
25 - Enquadrado como especial o período de 01/07/1990 a 17/09/2010, eis que desempenhado
com sujeição a níveis de pressão sonora superiores ao limite de tolerância vigente à época da
prestação dos serviços.
26 - Conforme planilha em anexo, somando-se os períodos como rurícola sem registro
(11/01/1978 a 11/05/1981 e 16/07/1983 a 20/08/1989) e o período de atividade especial
(01/07/1990 a 17/09/2010) reconhecidos nesta demanda aos períodos considerados
incontroversos, constantes do "resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição"
de fl. 42, verifica-se que, até 11/10/2010, data do requerimento administrativo, o autor contava
com 39 anos, 02 meses e 17 dias de serviço, o que lhe assegura o direito ao benefício de
aposentadoria integral por tempo de contribuição, não havendo que se falar em aplicação do
requisito etário, nos termos do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal.
27 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo
(11/10/2010 - fl. 36), ocasião em que o INSS tomou conhecimento da pretensão.
28 - Verifica-se, conforme extratos do CNIS ora anexados, que houve concessão administrativa
do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde 18/05/2017 (NB 1761183866).
Sendo assim, faculta-se ao demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe
afigurar mais vantajoso, vedado o recebimento em conjunto de duas aposentadorias, nos
termos do art. 124, II, da Lei nº 8.213/91, e, com isso, condicionada a execução dos valores
atrasados à opção pelo benefício concedido em Juízo, uma vez que se permitir a execução dos
atrasados concomitantemente com a manutenção do benefício concedido administrativamente
representaria uma "desaposentação" às avessas, cuja possibilidade - renúncia de benefício - é
vedada por lei - art. 18, §2º da Lei nº 8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C.
Supremo Tribunal Federal na análise do RE autuado sob o nº 661.256/SC.
29 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
30 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
31 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
32 - Isenta a Autarquia do pagamento de custas processuais.
33 - Remessa necessária, tida por interposta, parcialmente provida. Apelação do INSS
desprovida. Apelação do autor provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação do INSS, dar provimento à apelação do autor, para fixar o termo inicial do benefício na
data do requerimento administrativo (11/10/2010), dar parcial provimento à remessa necessária,
tida por interposta, para determinar que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária
de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de
variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o
mesmo Manual; mantendo-se, no mais, a r. sentença de 1º grau de jurisdição, facultando-se ao
autor a opção de percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso, e, por maioria, decidiu
condicionar a execução dos valores atrasados à necessária opção por aquele cujo direito foi
reconhecido em Juízo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
