Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1979117 / SP
0018339-70.2014.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
12/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADO. ATIVIDADE
ESPECIAL. RUÍDO ABAIXO DO LIMITE E RUÍDO VARIÁVEL. NÃO CUMPRIU REQUISITO
ETÁRIO PARA APOSENTADORIA PROPORCIONAL. APELAÇÃO DO AUTOR
PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Não vislumbrada a ocorrência do alegado cerceamento de defesa. Para comprovar o labor
sob condições especiais na empresa Usina São Martinho S/A (de 06/03/1997 a 25/05/1999) e
na Central Energética Moreno A. A. Ltda (23/08/2004 a 04/11/2010), o autor instruiu a inicial
com Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPs (fls. 23/29 e 31/32) e laudo técnico pericial
(fls. 112/115); documentos que se mostram suficientes ao deslinde da controvérsia.
2 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal,
especificamente na Lei de Benefícios.
3 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
4 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por
qualquer modalidade de prova.
5 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador.
6 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
7 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
8 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
9 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
10 - Possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
11 - Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do
Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
12 - Pretende o autor a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o
reconhecimento do labor especial nos períodos de 06/03/1997 a 25/05/1999 e de 23/08/2004 a
04/11/2010.
13 - Conforme Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPs (fls. 23/29 e 31/32) e laudo
técnico pericial (fls. 112/115): de 06/03/1997 a 25/05/1999, laborado na empresa Usina São
Martinho S/A, o autor esteve exposto a ruído de 76 a 94,7 dB(A); e de 23/08/2004 a 04/11/2010,
laborado na Central Energética Moreno A. A. Ltda, o autor esteve exposto a ruído de 82,5
dB(A).
14 - É certo que, até então, aplicava-se o entendimento no sentido da impossibilidade de
reconhecimento da especialidade da atividade, na hipótese de submissão do empregado a nível
de pressão sonora de intensidade variável, em que aquela de menor valor fosse inferior ao
limite estabelecido pela legislação vigente.
15 - Ao revisitar os julgados sobre o tema, tormentoso, percebe-se nova reflexão
jurisprudencial, que se passa a adotar, para admitir a possibilidade de se considerar, como
especial, o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído em sua maior intensidade, na medida
em que esta acaba por mascarar a de menor intensidade, militando em favor do segurado a
presunção de que uma maior pressão sonora prevalecia sobre as demais existentes no mesmo
setor.
16 - Registre-se, a esse respeito, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo o
qual "não sendo possível aferir a média ponderada, deve ser considerado o maior nível de ruído
a que estava exposto o segurado, motivo pelo qual deve ser reconhecida a especialidade do
labor desenvolvido pelo segurado no período, merecendo reforma, portanto, a decisão
agravada que considerou equivocadamente que o labor fora exercido pelo segurado com
exposição permanente a ruído abaixo de 90dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003" (AgRg no
REsp nº 1.398.049/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, decisão monocrática, DJe
13/03/2015). Esta 7ª Turma, em caso análogo, decidiu nesse mesmo sentido.
17 - No caso de "atenuação" do ruído em decorrência do uso de Equipamento de Proteção
Individual - EPI, é certo que a sua utilização não reflete a real sujeição a mencionado agente
agressivo e, bem por isso, há que se considerar, por coerência lógica, a atenuação apontada
(15 decibéis), a qual será somada ao nível de ruído constante do laudo, para fins de aferição da
efetiva potência sonora existente no ambiente laboral.
18 - Possível, portanto, enquadrar como especial o interregno entre 06/03/1997 a 25/05/1999,
eis que o maior ruído atestado é superior ao limite de tolerância legal no respectivo período.
19 - Impossível, entretanto, o reconhecimento da especialidade do labor no período de
23/08/2004 a 04/11/2010, eis que o autor esteve exposto a ruído inferior a 85 dB(A) exigidos à
época.
20 - Com o advento da emenda constitucional 20/98, extinguiu-se a aposentadoria proporcional
para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998),
assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema,
desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
21 - Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de
forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema
por ocasião da alteração legislativa em comento.
22 - Desta forma, convertendo o labor especial, reconhecido nesta demanda, em tempo
comum, e somando-o aos demais períodos já reconhecidos administrativamente pelo INSS
(Resumo de Documentos para Cálculo para Tempo de Contribuição - fls. 33/35 e CNIS de fl.
53); constata-se que, na data da publicação da EC 20/98 (16/12/1998), o autor contava com 23
anos, 6 meses e 21 dias de tempo de atividade; insuficiente para a concessão do benefício de
aposentadoria.
23 - Computando-se períodos posteriores, verifica-se que na data do requerimento
administrativo (04/11/2010 - fl. 21), o autor contava com 34 anos, 6 meses e 15 dias de tempo
de atividade; assim, apesar de ter cumprido o "pedágio", não havia cumprido o requisito etário
necessário para fazer jus ao benefício de aposentadoria proporcional por tempo de
contribuição.
24 - Ante a sucumbência recíproca, cada parte arcará com os respectivos honorários
advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73. Deixo de condenar qualquer das partes
nas custas e despesas processuais, eis que o autor é beneficiário da justiça gratuita e o INSS
delas se encontra isento.
25 - Apelação do autor parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria
preliminar e, no mérito, dar parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer o
labor especial no período de 06/03/1997 a 25/05/1999; deixando de condenar quaisquer das
partes nas custas e despesas processuais e, ante a sucumbência recíproca (art. 21, CPC/73),
dando a verba honorária por compensada entre os litigantes; mantendo, no mais, o julgado
proferido em 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
