
| D.E. Publicado em 02/05/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, e dar parcial provimento à remessa necessária, a fim de estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000928-72.2008.4.03.6103/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação previdenciária, ajuizada por KAZUNAO YUI, objetivando o restabelecimento da aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de trabalho especial, com consequente conversão em tempo comum, bem como de períodos comuns, não averbados pelo INSS.
Às fls. 474/480 foi deferida a antecipação dos efeitos da tutela.
A r. sentença de fls. 535/538-verso julgou procedente o pedido, para reconhecer a especialidade do labor no período de 13/07/1979 a 30/12/1991, bem como a atividade comum exercida nos períodos de 27/12/1965 a 31/03/1968 e de 02/12/1960 a 03/03/1961, condenando a Autarquia a restabelecer o benefício do autor (NB 109.226.254-4), desde a data da cessação indevida (01/07/2005), acrescidas as parcelas em atraso de correção monetária e juros de mora. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observada a Súmula 111 do C. STJ. Sentença submetida ao reexame necessário.
Em razões recursais de fls. 544/552, o INSS pleiteia a reforma da sentença, ao fundamento de que não teria sido comprovado o exercício de atividade especial no período questionado na inicial. Aduz, ainda, a impossibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum antes de 01/01/1981.
Contrarrazões da parte autora às fls. 570/571.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de restabelecimento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 109.226.254-4), com reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais (13/07/1979 a 30/12/1991), bem como de períodos de atividade comum, não averbados pelo INSS (02/12/1960 a 03/03/1961, 27/12/1965 a 31/03/1968 e 22/08/1966 a 15/03/1967).
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
A propósito do tema:
Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 15/04/2013).
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Do caso concreto.
Para melhor compreensão da quaestio, necessário traçar breve histórico das ocorrências processuais.
Pretende o autor, com a presente demanda, restabelecer benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido em 06 de março de 1998, e cessado em julho de 2005.
O compulsar dos autos do processo administrativo, trazido por cópia às fls. 277/473, revela que o Grupo de Trabalho, no vigor da Portaria MPAS/GM 3.700 de 08/03/00, detectou suposta irregularidade no processo concessório, tendo o segurado sido intimado para apresentar defesa. O processo de revisão transcorreu na forma prevista, com a observância do princípio do contraditório, oportunidade em que restou confirmada a irregularidade, ante a não comprovação do vínculo empregatício mantido no interregno de 01/01/1957 a 04/02/1964 (fl. 400).
Expurgado o lapso temporal tido por inverídico, a totalização do tempo de contribuição revelou-se insuficiente à concessão do benefício (29 anos, 05 meses e 26), razão pela qual o mesmo fora cessado a partir da competência julho/2005.
Daí a propositura desta ação, por meio da qual pretende o requerente o restabelecimento do benefício indevidamente suspenso, aduzindo, em prol de sua tese, que exerceu atividade especial no período compreendido entre 13/07/1979 e 30/12/1991, que os períodos de atividade comum, de 02/12/1960 a 03/03/1961, 27/12/1965 a 31/03/1968 e 22/08/1966 a 15/03/1967, não foram computados pela Autarquia e, por fim, que, devidamente comprovados e somados aos demais períodos incontroversos, tais interregnos se mostrariam suficientes à reativação da aposentadoria.
Para comprovar suas alegações, a parte autora instruiu a presente demanda com a sua própria CTPS (fls. 79/108), com o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP de fls. 229/230 e com os documentos de fls. 181/188.
Quanto aos períodos de atividade comum, mantidos com o "Banco Itaú S/A" e com o "Governo do Estado de São Paulo" (02/12/1960 a 03/03/1961, 27/12/1965 a 31/03/1968 e 22/08/1966 a 15/03/1967), verifica-se que restaram comprovados pelos documentos carreados às fls. 181/188, os quais foram apresentados pelo segurado ainda na pendência de julgamento do seu recurso administrativo (vide fls. 444/451 e 456/457). Conforme bem salientado pelo Digno Juiz de 1º Grau, "ainda que tais períodos não estivessem propriamente compreendidos no âmbito de devolução dos recursos administrativos interpostos, só mesmo um excesso de formalismo impediria que os órgãos julgadores também considerassem tais períodos, com a exclusão dos períodos concomitantes, já que poderiam resultar na manutenção do benefício, e não na cassação, como foi o caso" (fl. 537).
No que diz respeito ao período de 13/07/1979 e 30/12/1991, a CTPS (fl. 84) e o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (fls. 229/230) indicam que o autor trabalhou como "Dentista" junto ao "Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e Materiais Elétricos de São José dos Campos e Região", sujeito a "resíduos orgânicos", o que permite o reconhecimento da especialidade do labor, uma vez que a ocupação do autor encontra subsunção no item 2.1.3 do Decreto nº 53.831/64 e no item 2.1.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
A citada Emenda Constitucional também manteve a aposentadoria proporcional para os que já se encontravam filiados ao RGPS na data de sua publicação e não possuíam tempo suficiente para requerê-la, porém estabeleceu na regra de transição, verbis:
Conforme planilha constante de fl. 537-verso, somando-se a atividade especial e os períodos de atividade comum reconhecidos nesta demanda, àqueles considerados incontroversos ("resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição" - fls. 62/63), verifica-se que a parte autora contava com 35 anos, 10 meses e 17 dias de tempo de serviço na data do requerimento administrativo (06/03/1998).
Como se vê, o autor faz jus ao restabelecimento do benefício NB 42/109.226.254-4, bem como ao pagamento das prestações atrasadas, desde a data da suspensão indevida (01/07/2005), nos moldes assentados pela r. sentença.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, e dou parcial provimento à remessa necessária, a fim de estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º grau.
É como voto.
Desembargador Federal
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