Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2047783 / SP
0008804-05.2013.4.03.6103
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS.
INFLAMÁVEIS. COMPROVAÇÃO DO LABOR SUBMETIDO A CONDIÇÕES ESPECIAIS.
CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PROVA EMPRESTADA. POSSIBILIDADE.
REVISÃO CONCEDIDA. DIB NA DATA DO REQUERIMENTO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TERMO
FINAL PARA A SUA INCIDÊNCIA. DATA DA PROLAÇÃO DA SENTENÇA. ISONOMIA
CONSTITUCIONAL. PRECEDENTES DA TURMA. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO
DO INSS DESPROVIDAS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA.
1 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição
(NB 42/144.167.570-9, DER em 18/06/2007), para que seja convertido em aposentadoria
especial, mediante o reconhecimento da especialidade do labor no período de 06/03/1997 a
18/06/2007.
2 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
3 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26/08/1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
4 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
5 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91.
6 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
7 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06/03/1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
8 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
9 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas.
14 - A parte autora pretende o reconhecimento da especialidade de 06/03/1997 a 18/06/2007,
trabalhado na empresa "General Motors do Brasil Ltda". Para comprovar que exerceu atividade
prejudicial à saúde/integridade física, trouxe aos autos o Perfil Profissiográfico Previdenciário -
PPP e o Laudo Técnico produzido em demanda trabalhista.
15 - O PPP mencionado revela que o autor, ao desempenhar as funções de "Movimentador
Materiais", "Operador Empilhadeira A" e "Operador Veículos Industriais A", esteve exposto a
ruído nas seguintes intensidades: a) 81 dB(A), de 06/03/1997 a 31/08/1997; b) 85 dB(A), de
01/09/1997 a 31/01/2002; c) 83 dB(A), de 01/02/2002 a 18/06/2007. A considerar unicamente o
documento em questão, restaria inviabilizado o reconhecimento pretendido, porquanto o nível
de pressão sonora aferido encontra-se abaixo do limite de tolerância vigente à época da
prestação dos serviços.
16 - Ocorre que, conforme acenado, consta dos autos laudo pericial, realizado em 1º/10/2010
por perito de confiança do juízo (engenheiro), em reclamação trabalhista ajuizada pelo autor em
face da "General Motors do Brasil Ltda", no qual houve a constatação de que "o reclamante
exercia e permanecia em área onde se armazenava inflamáveis gasosos liquefeitos".
17 - Conforme relato do expert, "o reclamante para desempenho de suas atividades diárias
realizava o abastecimento da empilhadeira ou do rebocador movidos a GLP em sistema pit
stop", esclarecendo, ainda, que "o reclamante realizava o abastecimento diariamente" e que
pode ser indicado "como risco acentuado neste caso a própria empilhadeira e suas peças
aquecidas, tais como escapamento, disco de freio, bloco do motor e outras partes metálicas,
sem contar com faíscas próprias dos equipamentos elétricos como alternadores e velas de
ignição". Consigna, por fim, que "quanto ao tempo desprendido pelo reclamante na área de
risco com inflamáveis, a legislação não determina tempo de exposição ao risco, mesmo porque
o infortúnio com inflamáveis pode ser medido em mili-segundos (denominação utilizada para
retardadores de explosão)".
18 - Desta forma, por ser considerada perigosa, com risco à integridade física em razão do
contato habitual e permanente com produtos inflamáveis, reputo demonstrada a especialidade
da atividade no período questionado (06/03/1997 a 18/06/2007).
19 - Anote-se, por oportuno, que a questão da supressão de agentes perigosos do rol do
Decreto n.º 2.172/97 restou superada, nos termos do entendimento adotado no REsp nº
1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior
Tribunal de Justiça, cabendo ressaltar a menção feita naquele julgado quanto ao caráter
exemplificativo das atividades nocivas elencadas na legislação previdenciária e a possibilidade
de caracterização da especialidade com base em elementos técnicos e na legislação
trabalhista.
20 - Assim, possível o enquadramento da especialidade no período de 06/03/1997 a
18/06/2007.
21 - Saliente-se que embora a perícia tenha sido realizada em outra demanda, referida prova
técnica merece total credibilidade, sendo admissível no caso em apreço como prova
emprestada, eis que atendidos os requisitos da prova atípica previstos no art. 332 do CPC
1973, vigente à época da prolação da sentença, e também ao regramento específico disposto
no art. 372 do CPC/2015. Precedentes jurisprudenciais.
22 - A permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a
jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
23 - Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda àquela já assim considerada
pelo próprio INSS, verifica-se que o autor contava com 27 anos, 11 meses e 15 dias de
atividade desempenhada em condições especiais, por ocasião da data da entrada do
requerimento administrativo (18/06/2007), fazendo jus, portanto, à aposentadoria especial
pleiteada.
24 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da concessão da benesse em sede
administrativa (DIB 18/06/2007), uma vez que se trata de revisão do coeficiente de cálculo e da
renda mensal inicial (pela conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em
aposentadoria especial), em razão do reconhecimento do período laborado em atividade
especial, observada a prescrição quinquenal, conforme posicionamento majoritário desta
Turma, ressalvado o entendimento pessoal deste Relator.
25 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
26 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
27 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da
condenação, incidindo sobre as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença,
consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
28 - O termo ad quem a ser considerado continua sendo a data da prolação da sentença, ainda
que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Explico. Na hipótese
de procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o
trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não
transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos
atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos distintos em relação
ao que foi decidido. Portanto, não considero lógico e razoável referido discrímen, a ponto de
justificar o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que
exercem suas funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação.
29 - Isenção da Autarquia Securitária do pagamento das custas processuais.
30 - Remessa necessária e apelação do INSS desprovidas. Apelação da parte autora provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
remessa necessária e à apelação do INSS, e dar provimento à apelação da parte autora, para
reconhecer a especialidade do labor no período de 06/03/1997 a 18/06/2007 e condenar o INSS
na implantação e pagamento da aposentadoria especial, a partir do requerimento
administrativo, observada a prescrição quinquenal, sendo que sobre os valores em atraso
incidirão correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será
apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora, até a expedição do ofício
requisitório, de acordo com o mesmo Manual, bem como para condenar a autarquia no
pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas
até a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
