Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0009013-25.2013.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
03/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/02/2022
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. ENFERMEIRA. PPP.
AGENTES BIOLÓGICOS. DECRETOS NºS 2.172/97 E 3.048/99. COMPROVAÇÃO DO LABOR
SUBMETIDO A CONDIÇÕES ESPECIAIS. EPI EFICAZ. INDIFERENÇA. TEMPO SUFICIENTE
PARA APOSENTADORIA ESPECIAL. DIB NA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS CONHECIDA EM PARTE
E DESPROVIDA. DE OFÍCIO, ALTERAÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE
MORA.
1 - Quanto ao pleito de reconhecimento da prescrição quinquenal das parcelas vencidas antes do
quinquênio finalizado no aforamento da demanda, verificada a nítida ausência de interesse
recursal, eis que a questão já foi reconhecida pelo decisum ora guerreado.
2 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
para que seja convertida em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período
trabalhado em atividade sujeita a condições especiais.
3 - Trata-se, em suma, de pedido de conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em
aposentadoria especial.
4 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26/08/1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o
artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes
nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes
físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria
especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos
enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
6 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91.
7 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
8 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a
Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº
1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo
58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do
Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou
a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou
engenheiro de segurança do trabalho.
9 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
11/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário
(PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais
responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento
hábil para a avaliação das condições laborais.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui,
para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em
condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização
do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não
infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF
excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente
neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas.
14 - Pretende a parte autora o reconhecimento da especialidade nos interstícios 06/03/1997 a
18/06/2002, 05/05/2003 a 20/03/2009, 02/08/2010 a 20/02/2013.
15 - De início, refutada a alegação do INSS de que deve ser excluído o cômputo de eventual
período especial de 05/05/2003 a 20/03/2009 e 02/08/2010 a 20/02/2013, ao fundamento de que
a demandante laborou concomitantemente sob regime estatutário de 16/02/2006 a 12/08/2008,
eis que referido lapso não foi considerado na concessão da aposentadoria por tempo de
contribuição, não sendo, ademais, objeto da presente demanda.
16 - Para comprovar o alegado, relativamente ao lapso de 06/03/1997 a 18/06/2002, laborado
perante o “Hospital das Clínicas da FMUSP”, como “enfermeira”, coligiu aos autos Perfil
Profissiográfico Previdenciário, com indicação do responsável pelos registros ambientais, emitido
em 09/04/2009, que demonstra a exposição a agente biológico e descreve a atividade da
demandante como “Coordenar e supervisionar as atividades de enfermagem. Fazer prescrições
de enfermagem; Promover cuidados de enfermagem à pacientes portadores de moléstias Infecto-
contagiosas. Executar curativos cirúrgicos complexos. Puncionar veia para administração de
medicamentos, soro e coleta de sangue. Realizar sondagem e enteroclismas. Manusear materiais
cortantes contaminados com secreções orgânicas de pacientes infectados. Cumpre a jornada de
30 horas semanais. A execução das atividades e a exposição aos agentes (biológicos) foram de
modo permanente e habitual.”
17 - Quanto ao período de 05/05/2003 a 20/03/2009, trabalhado como “enfermeira assistencial”,
no setor de “hemodiálise”, para “Senesp – Serviço de Nefrologia de São Paulo”, o Perfil
Profissiográfico Previdenciário - PPP, com indicação do responsável pelos registros ambientais e
monitoração biológica, emitido em 28/04/2009, demonstra que, no desempenho das atividades de
“Coordenação e controle da Equipe de Enfermagem. Atendimento ao paciente, controle da
pressão e prescrição médica junto aos prontuários. Evolução técnica nos prontuários,
administração de medicamentos, coleta e punção de exames, atendimento ao paciente, controle
do peso e da pressão e das prescrições médicas junto aos prontuários”, havia exposição a agente
biológico (sangue e secreções possivelmente contaminados).
18 - Em razão da existência de Perfil Profissiográfico Previdenciário, emitido em 20/03/2009, no
qual não consta menção de sujeição a agentes biológicos, anexou-se aos autos Programa de
Controle Médico em Saúde Ocupacional e Laudo de Avaliação de Riscos Ambientais, nos quais,
para a função de “enfermagem assistencial”, no setor “hemodiálise”, há o risco biológico (contato
com secreções e sangue).
19 - Por fim, de 02/08/2010 a 20/02/2013, como “enfermeira”, no setor hemodiálise, para “Clinisa
Clínica Nefrológica de Itapecerica da Serra”, segundo o Perfil Profissiográfico Previdenciário –
PPP, emitido em 20/02/2013, com indicação do responsável pela monitoração biológica, a autora
ficava exposta a agentes biológicos (contato dérmico), eis que exercia as atividades de: “Orientar
o tratamento e o procedimento de enfermagem, Manusear cateteres e instalar em diálise,
Controlar diariamente o material de emergência, o estoque de medicamentos, o material de
consumo e as condições de funcionamento dos aparelhos e equipamentos, Coordenar, prever e
prover de material e pessoal da Unidade de Diálise, Controlar diariamente as tarefas
desenvolvidas pela equipe de Enfermagem, Estabelecer e reavaliar normas e rotinas de serviços
e atualizar técnicas de trabalho, Orientar os pacientes sobre fistula arteriovenosa (FAV),
curativos, medicamentos e dietas, Fazer o diferencial de perda e ganho de peso dos pacientes
em programa dialítico, Selecionar, treinar e acompanhar o paciente em CAPD, Coordenar o
programa de CAPD (Diálise Peritoneal Ambulatorial Contínua), Orientar e executar os cuidados
Pré e pós-confecção de F.A .V., implantação de cateter duplo hímen e cateter de tenckoff,
Preparar as máquinas (calibração e liberação para diálise), Realizar punções (arterial e venosa)
para ligar hemodiálise, Fazer curativo de F.A.V. e cateteres, Administrar as medicações
prescritas”.
20 - Cabe observar que o exercício da função de “enfermeira” está diretamente relacionada ao
desempenho de atividades prejudiciais à saúde, de modo que, pela descrição das atividades,
pode-se inferir que havia o contato com material infecto-contagiante, constando expressamente
no PPP a existência de agentes biológicos. Nessa linha, possível o reconhecimento da
especialidade pelo enquadramento nos itens 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº
3.048/99.
21 - Importante esclarecer que, nos casos em que resta comprovada a exposição do
"auxiliar/técnico de enfermagem", "atendente de enfermagem" e "enfermeiro" à nocividade do
agente biológico, a natureza de suas atividades já revela, por si só, que mesmo nos casos de
utilização de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional.
22 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, enquadrados como especiais
os períodos de 06/03/1997 a 18/06/2002, 05/05/2003 a 20/03/2009, 02/08/2010 a 20/02/2013.
23 - Cumpre mencionar que a ausência de informação, no Perfil Profissiográfico Previdenciário -
PPP, acerca da habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, em nada prejudica
o segurado, na medida em que tal campo específico não integra o formulário.
24 - Ademais, não é por demasiado acrescer que a permanência não pressupõe a exposição
contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador.
25 - Conforme tabela constante na sentença, somando-se a atividade especial ora reconhecida,
verifica-se que a autora alcançou 26 anos e 11 meses de serviço especial, na data do
requerimento administrativo (22/02/2013), tempo suficiente para a concessão da aposentadoria
pleiteada na inicial.
26 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo
(22/02/2013), uma vez que se trata de revisão da renda mensal inicial (pela conversão da
aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial), em razão do
reconhecimento do período laborado em atividade especial.
27 -A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
28 - Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
29 - A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de
atualização monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo
pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia
(Selic), acumulado mensalmente.
30 - Apelação do INSS conhecida em parte e desprovida. De ofício, alteração da correção
monetária e dos juros de mora.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0009013-25.2013.4.03.6183
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA NALDECI DE TORRES SANTOS
Advogado do(a) APELADO: GILMAR CANDIDO - SP243714-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0009013-25.2013.4.03.6183
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA NALDECI DE TORRES SANTOS
Advogado do(a) APELADO: GILMAR CANDIDO - SP243714-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em
ação previdenciária pelo rito ordinário, ajuizada por MARIA NALDECI DE TORRES SANTOS,
objetivando a conversão de sua aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria
especial, mediante o reconhecimento de período trabalhado em atividade sujeita a condições
especiais.
A r. sentença (ID 40280252 - Pág. 14/21) julgou procedente o pedido para reconhecer como
tempo especial os períodos de 06/03/1997 a 18/06/2002, 05/05/2003 a 20/03/2009, 02/08/2010
a 20/02/2013, e para condenar o INSS a converter o benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição da autora em aposentadoria especial, desde a dada da concessão, bem como no
pagamento dos atrasados, respeitada a prescrição quinquenal. Consignou que sobre os valores
devidos, incidirão correção monetária e juros de mora, na forma do Manual de Orientação de
Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal. Honorários advocatícios em percentuais a
serem definidos em liquidação, nos termos do inciso II do parágrafo 4º do artigo 85 do CPC e
Súmula 111 do STJ.
Em razões recursais (ID 40280252 - Pág. 25/37) postula, preliminarmente, o reconhecimento da
prescrição quinquenal. No mérito, pugna pela improcedência do pleito, ao fundamento, em
síntese, de ser vedado o reconhecimento da especialidade pelo enquadramento da categoria
profissional após 28/04/1995 e que a parte autora não demonstrou a exposição habitual e
permanente, não ocasional e nem intermitente, a agentes biológicos de natureza infecto-
contagiosa. Acrescenta que no período de 16/02/2006 a 12/2008, a demandante laborou regida
pelo regime estatutário, de modo que deve ser “excluído o cômputo de eventual período
especial parcialmente de 05-05-2003 a 20-03-2009 e 02-08-2010 a 20-02-2013, face a
concomitância com o vínculo estatutário”, eis que vedada a contagem recíproca pelos dois
sistemas. Subsidiariamente, insurge-se quanto aos critérios de correção monetária e de juros
de mora, requerendo a aplicação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei
nº 11.960/2009, e a fixação do termo inicial do benefício na data da citação. Prequestiona a
matéria.
Intimada, a parte autora apresentou contrarrazões (ID 40280252 - Pág. 40/49).
Devidamente processado o recurso,foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0009013-25.2013.4.03.6183
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA NALDECI DE TORRES SANTOS
Advogado do(a) APELADO: GILMAR CANDIDO - SP243714-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Inicialmente, quanto ao pleito de reconhecimento da prescrição quinquenal das parcelas
vencidas antes do quinquênio finalizado no aforamento da demanda, verifico a nítida ausência
de interesse recursal, eis que a questão já foi reconhecida pelo decisum ora guerreado.
Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
para que seja convertida em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período
trabalhado em atividade sujeita a condições especiais.
Trata-se, em suma, de pedido de conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em
aposentadoria especial.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos,
químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial,
sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto
que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja
redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao
segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser
a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a)
com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a
Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória
nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o
artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a
edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997,
que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico
do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
11/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº
9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico
por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação
de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o
laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face
de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no
cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des.
Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª
Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111,
Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3
Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que
o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de
repercussão geral, fixou duas teses:
"(...) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a
efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for
realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à
aposentadoria especial. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as
informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa
a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da
aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar
suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se
submete";
(...)
a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do
trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no
âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento
de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para
aposentadoria" (STF, ARE 664.335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJe n. 29,
de 11.02.2015, public. 12.02.2015)" (grifos nossos).
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas.
Do caso concreto.
Pretende a parte autora o reconhecimento da especialidade nos interstícios 06/03/1997 a
18/06/2002, 05/05/2003 a 20/03/2009, 02/08/2010 a 20/02/2013.
De início, refuto a alegação do INSS de que deve ser excluído o cômputo de eventual período
especial de 05/05/2003 a 20/03/2009 e 02/08/2010 a 20/02/2013, ao fundamento de que a
demandante laborou concomitantemente sob regime estatutário de 16/02/2006 a 12/08/2008,
eis que referido lapso não foi considerado na concessão da aposentadoria por tempo de
contribuição, não sendo, ademais, objeto da presente demanda.
Para comprovar o alegado, relativamente ao lapso de 06/03/1997 a 18/06/2002, laborado
perante o “Hospital das Clínicas da FMUSP”, como “enfermeira”, coligiu aos autos Perfil
Profissiográfico Previdenciário (ID 40280251 - Pág. 43/44), com indicação do responsável pelos
registros ambientais, emitido em 09/04/2009, que demonstra a exposição a agente biológico e
descreve a atividade da demandante como “Coordenar e supervisionar as atividades de
enfermagem. Fazer prescrições de enfermagem; Promover cuidados de enfermagem à
pacientes portadores de moléstias Infecto-contagiosas. Executar curativos cirúrgicos
complexos. Puncionar veia para administração de medicamentos, soro e coleta de sangue.
Realizar sondagem e enteroclismas. Manusear materiais cortantes contaminados com
secreções orgânicas de pacientes infectados. Cumpre a jornada de 30 horas semanais. A
execução das atividades e a exposição aos agentes (biológicos) foram de modo permanente e
habitual.”
Quanto ao período de 05/05/2003 a 20/03/2009, trabalhado como “enfermeira assistencial”, no
setor de “hemodiálise”, para “Senesp – Serviço de Nefrologia de São Paulo”, o Perfil
Profissiográfico Previdenciário (ID 40280251 - Pág. 45/47 e ID 40280268), com indicação do
responsável pelos registros ambientais e monitoração biológica, emitido em 28/04/2009,
demonstra que, no desempenho das atividades de “Coordenação e controle da Equipe de
Enfermagem. Atendimento ao paciente, controle da pressão e prescrição médica junto aos
prontuários. Evolução técnica nos prontuários, administração de medicamentos, coleta e
punção de exames, atendimento ao paciente, controle do peso e da pressão e das prescrições
médicas junto aos prontuários”, havia exposição a agente biológico (sangue e secreções
possivelmente contaminados).
Em razão da existência de Perfil Profissiográfico Previdenciário, emitido em 20/03/2009, no qual
não consta menção de sujeição a agentes biológicos (ID 40280251 - Pág. 180/181), anexou-se
aos autos Programa de Controle Médico em Saúde Ocupacional e Laudo de Avaliação de
Riscos Ambientais, nos quais, para a função de “enfermagem assistencial”, no setor
“hemodiálise”, há o risco biológico (contato com secreções e sangue).
Por fim, de 02/08/2010 a 20/02/2013, como “enfermeira”, no setor hemodiálise, para “Clinisa
Clínica Nefrológica de Itapecerica da Serra”, segundo o Perfil Profissiográfico Previdenciário –
PPP (ID 40280251 - Pág. 48/49), emitido em 20/02/2013, com indicação do responsável pela
monitoração biológica, a autora ficava exposta a agentes biológicos (contato dérmico), eis que
exercia as atividades de: “Orientar o tratamento e o procedimento de enfermagem, Manusear
cateteres e instalar em diálise, Controlar diariamente o material de emergência, o estoque de
medicamentos, o material de consumo e as condições de funcionamento dos aparelhos e
equipamentos, Coordenar, prever e prover de material e pessoal da Unidade de Diálise,
Controlar diariamente as tarefas desenvolvidas pela equipe de Enfermagem, Estabelecer e
reavaliar normas e rotinas de serviços e atualizar técnicas de trabalho, Orientar os pacientes
sobre fistula arteriovenosa (FAV), curativos, medicamentos e dietas, Fazer o diferencial de
perda e ganho de peso dos pacientes em programa dialítico, Selecionar, treinar e acompanhar
o paciente em CAPD, Coordenar o programa de CAPD (Diálise Peritoneal Ambulatorial
Contínua), Orientar e executar os cuidados Pré e pós-confecção de F.A .V., implantação de
cateter duplo hímen e cateter de tenckoff, Preparar as máquinas (calibração e liberação para
diálise), Realizar punções (arterial e venosa) para ligar hemodiálise, Fazer curativo de F.A.V. e
cateteres, Administrar as medicações prescritas”.
Cabe observar que o exercício da função de “enfermeira” está diretamente relacionada ao
desempenho de atividades prejudiciais à saúde, de modo que, pela descrição das atividades,
pode-se inferir que havia o contato com material infecto-contagiante, constando expressamente
no PPP a existência de agentes biológicos.
Nessa linha, possível o reconhecimento da especialidade pelo enquadramento nos itens 3.0.1
do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99.
Importante esclarecer que, nos casos em que resta comprovada a exposição do
"auxiliar/técnico de enfermagem", "atendente de enfermagem" e "enfermeiro" à nocividade do
agente biológico, a natureza de suas atividades já revela, por si só, que mesmo nos casos de
utilização de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional.
Na mesma linha, confira-se:
"PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
ATIVIDADES EXERCIDAS EM CONDIÇÕES ESPECIAIS DE TRABALHO. AGENTE
AGRESSIVO BIOLÓGICO. EXPOSIÇÃO. UTILIZAÇÃO DO EPI EFICAZ. CONFIGURADAS AS
CONDIÇÕES ESPECIAIS DE TRABALHO.- Apelação tempestiva, recebida no efeito previsto
no CPC/2015.- (...) As profissões de "auxiliar de enfermagem", "atendente de enfermagem" e
"enfermeira" constam dos decretos legais e a sua natureza especial pode ser reconhecida
apenas pelo enquadramento profissional até 05.03.1997, ocasião em que passou a ser
imprescindível a apresentação do laudo técnico ou do perfil profissiográfico previdenciário.- O
enquadramento foi realizado com base na exposição a vírus e bactérias, pelo exercício das
atividades de enfermagem em hospital.- A exposição ao agente agressivo biológico,
demonstrada no período abrangido pelo PPP, é suficiente para a concessão da aposentadoria
especial, uma vez que a utilização de EPI eficaz, no caso de tal agente, não neutraliza os
efeitos nocivos da exposição.- A natureza da atividade corrobora a exposição a agentes
biológicos, sendo viável a aferição da condição especial de trabalho, conforme se verifica nas
informações trazidas nos PPPs constantes do processo administrativo que indeferiu a
concessão do benefício.- Comprovada a exposição a agentes biológicos, de forma habitual e
permanente, até a expedição do PPP. (...).- Remessa oficial, tida por interposta, parcialmente
provida e Apelação provida.(AC 00059571820124036183, DESEMBARGADORA FEDERAL
MARISA SANTOS, TRF3 - NONA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/02/2017
.FONTE_REPUBLICACAO:.)"
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrados como
especiais os períodos de 06/03/1997 a 18/06/2002, 05/05/2003 a 20/03/2009, 02/08/2010 a
20/02/2013.
Cumpre mencionar que a ausência de informação, no Perfil Profissiográfico Previdenciário -
PPP, acerca da habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, em nada
prejudica o segurado, na medida em que tal campo específico não integra o formulário.
Confira-se, a respeito:
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
FRENTISTA. HIDROCARBONETO. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. ANÁLISE
QUALITATIVA
(...)
- Quanto à comprovação da habitualidade e permanência da exposição ao agente especial, é
necessário destacar que o PPP é formulário padronizado pelo próprio INSS conforme disposto
no §1º do artigo 58 da Lei 8.213/91.
- Dessa forma, é de competência do INSS a adoção de medidas para reduzir as imprecisões no
preenchimento do PPP pelo empregador. Como os PPPs não apresentam campo específico
para indicação de configuração de habitualidade e permanência da exposição ao agente, o
ônus de provar a ausência desses requisitos é do INSS e deve ser superado no momento da
contestação.
(...)
-Embargos de declaração a que se nega provimento."
(Emb Decl em AC nº 2009.61.20.001701-2/SP, Rel. Des. Federal Luiz Stefanini, 8ª Turma, DE
23/08/2017).
Ademais, não é por demasiado acrescer que a permanência não pressupõe a exposição
contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a
atividade desempenhada pelo trabalhador.
A propósito do tema:
"(...) Por fim, como afirmado pelo Tribunal de origem, o fundamento sustentado pela Autarquia,
de que a exposição aos agentes biológicos era eventual, não é suficiente para
descaracterização da especialidade.
Não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática
laboral, visto que habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é
protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho,
não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas,
químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho.
Tem-se, assim, que a avaliação no caso dos autos se torna qualitativa, independendo do tempo
de exposição"
(STJ, REsp. nº 1.610.099 - RS (2016/0168867-2), Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de
02/08/2016). (grifos nossos).
Conforme tabela constante na sentença, somando-se a atividade especial ora reconhecida,
verifica-se que a autora alcançou 26 anos e 11 meses de serviço especial, na data do
requerimento administrativo (22/02/2013), tempo suficiente para a concessão da aposentadoria
pleiteada na inicial.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo
(22/02/2013 – ID 8118953 - Pág. 78), uma vez que se trata de revisão da renda mensal inicial
(pela conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial), em
razão do reconhecimento do período laborado em atividade especial.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência
dominante.
A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de atualização
monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo
pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia
(Selic), acumulado mensalmente.
Ante o exposto, conheço em parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, nego-
lheprovimento ̧ e, de ofício, estabeleço que a correção monetária dos valores em atraso deverá
ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos
índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora serão fixados de acordo com o mesmo
Manual, sendo que a partir da promulgação da EC nº 113/2021 haverá a incidência, uma única
vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e
de Custódia (Selic), acumulado mensalmente, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º
grau de jurisdição.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. ENFERMEIRA. PPP.
AGENTES BIOLÓGICOS. DECRETOS NºS 2.172/97 E 3.048/99. COMPROVAÇÃO DO
LABOR SUBMETIDO A CONDIÇÕES ESPECIAIS. EPI EFICAZ. INDIFERENÇA. TEMPO
SUFICIENTE PARA APOSENTADORIA ESPECIAL. DIB NA DATA DO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS
CONHECIDA EM PARTE E DESPROVIDA. DE OFÍCIO, ALTERAÇÃO DA CORREÇÃO
MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA.
1 - Quanto ao pleito de reconhecimento da prescrição quinquenal das parcelas vencidas antes
do quinquênio finalizado no aforamento da demanda, verificada a nítida ausência de interesse
recursal, eis que a questão já foi reconhecida pelo decisum ora guerreado.
2 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
para que seja convertida em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período
trabalhado em atividade sujeita a condições especiais.
3 - Trata-se, em suma, de pedido de conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em
aposentadoria especial.
4 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26/08/1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91.
7 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
8 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até
a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
9 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
11/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas.
14 - Pretende a parte autora o reconhecimento da especialidade nos interstícios 06/03/1997 a
18/06/2002, 05/05/2003 a 20/03/2009, 02/08/2010 a 20/02/2013.
15 - De início, refutada a alegação do INSS de que deve ser excluído o cômputo de eventual
período especial de 05/05/2003 a 20/03/2009 e 02/08/2010 a 20/02/2013, ao fundamento de
que a demandante laborou concomitantemente sob regime estatutário de 16/02/2006 a
12/08/2008, eis que referido lapso não foi considerado na concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição, não sendo, ademais, objeto da presente demanda.
16 - Para comprovar o alegado, relativamente ao lapso de 06/03/1997 a 18/06/2002, laborado
perante o “Hospital das Clínicas da FMUSP”, como “enfermeira”, coligiu aos autos Perfil
Profissiográfico Previdenciário, com indicação do responsável pelos registros ambientais,
emitido em 09/04/2009, que demonstra a exposição a agente biológico e descreve a atividade
da demandante como “Coordenar e supervisionar as atividades de enfermagem. Fazer
prescrições de enfermagem; Promover cuidados de enfermagem à pacientes portadores de
moléstias Infecto-contagiosas. Executar curativos cirúrgicos complexos. Puncionar veia para
administração de medicamentos, soro e coleta de sangue. Realizar sondagem e enteroclismas.
Manusear materiais cortantes contaminados com secreções orgânicas de pacientes infectados.
Cumpre a jornada de 30 horas semanais. A execução das atividades e a exposição aos agentes
(biológicos) foram de modo permanente e habitual.”
17 - Quanto ao período de 05/05/2003 a 20/03/2009, trabalhado como “enfermeira assistencial”,
no setor de “hemodiálise”, para “Senesp – Serviço de Nefrologia de São Paulo”, o Perfil
Profissiográfico Previdenciário - PPP, com indicação do responsável pelos registros ambientais
e monitoração biológica, emitido em 28/04/2009, demonstra que, no desempenho das
atividades de “Coordenação e controle da Equipe de Enfermagem. Atendimento ao paciente,
controle da pressão e prescrição médica junto aos prontuários. Evolução técnica nos
prontuários, administração de medicamentos, coleta e punção de exames, atendimento ao
paciente, controle do peso e da pressão e das prescrições médicas junto aos prontuários”,
havia exposição a agente biológico (sangue e secreções possivelmente contaminados).
18 - Em razão da existência de Perfil Profissiográfico Previdenciário, emitido em 20/03/2009, no
qual não consta menção de sujeição a agentes biológicos, anexou-se aos autos Programa de
Controle Médico em Saúde Ocupacional e Laudo de Avaliação de Riscos Ambientais, nos
quais, para a função de “enfermagem assistencial”, no setor “hemodiálise”, há o risco biológico
(contato com secreções e sangue).
19 - Por fim, de 02/08/2010 a 20/02/2013, como “enfermeira”, no setor hemodiálise, para
“Clinisa Clínica Nefrológica de Itapecerica da Serra”, segundo o Perfil Profissiográfico
Previdenciário – PPP, emitido em 20/02/2013, com indicação do responsável pela monitoração
biológica, a autora ficava exposta a agentes biológicos (contato dérmico), eis que exercia as
atividades de: “Orientar o tratamento e o procedimento de enfermagem, Manusear cateteres e
instalar em diálise, Controlar diariamente o material de emergência, o estoque de
medicamentos, o material de consumo e as condições de funcionamento dos aparelhos e
equipamentos, Coordenar, prever e prover de material e pessoal da Unidade de Diálise,
Controlar diariamente as tarefas desenvolvidas pela equipe de Enfermagem, Estabelecer e
reavaliar normas e rotinas de serviços e atualizar técnicas de trabalho, Orientar os pacientes
sobre fistula arteriovenosa (FAV), curativos, medicamentos e dietas, Fazer o diferencial de
perda e ganho de peso dos pacientes em programa dialítico, Selecionar, treinar e acompanhar
o paciente em CAPD, Coordenar o programa de CAPD (Diálise Peritoneal Ambulatorial
Contínua), Orientar e executar os cuidados Pré e pós-confecção de F.A .V., implantação de
cateter duplo hímen e cateter de tenckoff, Preparar as máquinas (calibração e liberação para
diálise), Realizar punções (arterial e venosa) para ligar hemodiálise, Fazer curativo de F.A.V. e
cateteres, Administrar as medicações prescritas”.
20 - Cabe observar que o exercício da função de “enfermeira” está diretamente relacionada ao
desempenho de atividades prejudiciais à saúde, de modo que, pela descrição das atividades,
pode-se inferir que havia o contato com material infecto-contagiante, constando expressamente
no PPP a existência de agentes biológicos. Nessa linha, possível o reconhecimento da
especialidade pelo enquadramento nos itens 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº
3.048/99.
21 - Importante esclarecer que, nos casos em que resta comprovada a exposição do
"auxiliar/técnico de enfermagem", "atendente de enfermagem" e "enfermeiro" à nocividade do
agente biológico, a natureza de suas atividades já revela, por si só, que mesmo nos casos de
utilização de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional.
22 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, enquadrados como
especiais os períodos de 06/03/1997 a 18/06/2002, 05/05/2003 a 20/03/2009, 02/08/2010 a
20/02/2013.
23 - Cumpre mencionar que a ausência de informação, no Perfil Profissiográfico Previdenciário -
PPP, acerca da habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, em nada
prejudica o segurado, na medida em que tal campo específico não integra o formulário.
24 - Ademais, não é por demasiado acrescer que a permanência não pressupõe a exposição
contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a
atividade desempenhada pelo trabalhador.
25 - Conforme tabela constante na sentença, somando-se a atividade especial ora reconhecida,
verifica-se que a autora alcançou 26 anos e 11 meses de serviço especial, na data do
requerimento administrativo (22/02/2013), tempo suficiente para a concessão da aposentadoria
pleiteada na inicial.
26 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo
(22/02/2013), uma vez que se trata de revisão da renda mensal inicial (pela conversão da
aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial), em razão do
reconhecimento do período laborado em atividade especial.
27 -A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob
a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de
variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
28 - Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
29 - A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de
atualização monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o
efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de
Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
30 - Apelação do INSS conhecida em parte e desprovida. De ofício, alteração da correção
monetária e dos juros de mora. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer em parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, negar-lhe
provimento ̧ e, de ofício, estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá
ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos
índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora serão fixados de acordo com o mesmo
Manual, sendo que a partir da promulgação da EC nº 113/2021 haverá a incidência, uma única
vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e
de Custódia (Selic), acumulado mensalmente, mantendo, no mais, íntegra a r. sentença de 1º
grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
