D.E. Publicado em 21/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, e dar provimento à apelação da parte autora, para determinar ao INSS que proceda à revisão do benefício, reconhecendo a especialidade do labor exercido nos períodos de 1º/11/1976 a 30/04/1977 e 29/04/1995 a 05/06/2002, e implante o benefício de aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo (05/06/2002), com efeitos financeiros a partir da data da citação (13/06/2008), sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando, ainda, a Autarquia no pagamento da verba honorária, fixada em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas, contadas estas até a data de prolação da sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005320-46.2008.4.03.6106/SP
RELATÓRIO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pela parte autora e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação previdenciária ajuizada por HILDA BOSSI LEONARDO, objetivando a conversão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de períodos trabalhados em atividades sujeitas a condições especiais.
A r. sentença de fls. 88/97-verso julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a especialidade do labor nos períodos de 1º/11/1976 a 30/04/1977, 29/04/1995 a 30/04/1998 e 1º/05/1998 a 05/06/2002, rejeitando, entretanto, o pedido de concessão da aposentadoria especial ou revisão da aposentadoria por tempo de contribuição. Deixou de condenar a Autarquia no pagamento dos honorários advocatícios, "visto ter decaído a autora de parte dos seus pedidos".
Em razões recursais de fls. 101/104, pugna a parte autora pela concessão da aposentadoria especial, uma vez que teria sido comprovado nos autos o alegado labor exercido em condições prejudiciais à saúde e à integridade física, bem como o preenchimento dos requisitos para a obtenção da benesse.
O INSS, por sua vez, também apresenta apelação (fls. 107/112), pleiteando a reforma da sentença, ao fundamento de que a apelada "não trabalhava em contato direto com os pacientes" no serviço desempenhado como servente de lavanderia, aduzindo, ainda, que a partir de 06/03/1997 exige-se que a atividade seja "desenvolvida somente com portadores de doença infecto-contagiosa ou materiais contaminados", de modo que não estaria caraterizada a especialidade do trabalho nos períodos questionados. Sustenta a impossibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum antes de 01/01/1981 e após 28/05/1998.
Contrarrazões da parte autora às fls. 115/118.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 30/06/2009, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS a reconhecer e averbar, em favor da parte autora, tempo de serviço exercido em condições especiais. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Pretende a parte autora a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição, implantada em 05/06/2002, em aposentadoria especial, ou a "revisão de seu benefício, sendo alterado seu coeficiente de cálculo para 100% do salário de benefício", mediante o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de 1º/11/1976 a 30/04/1977 e 1º/05/1977 a 05/06/2002.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Do caso concreto.
De início, compulsando os autos, verifica-se que a autarquia previdenciária reconheceu a especialidade do labor desempenhado no período de 1º/05/1977 a 28/04/1995 ("resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição" à fl. 73), motivo pelo qual referido lapso deve ser tido como incontroverso.
No que diz respeito ao período de 1º/11/1976 a 30/04/1977, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP coligido às fls. 19/21 revela ter a autora desempenhado a função de "Servente de Lavanderia" junto à "Santa Casa São Vicente de Paulo de Tanabi", com exposição ao agente agressivo "umidade", intensidade "máxima", cabendo ressaltar as atividades desenvolvidas pela requerente, em razão da exposição excessiva à "umidade", são passíveis de reconhecimento do caráter especial pelo mero enquadramento no rol constante do Decreto nº 53.831/64 (código 1.1.3 do Quadro Anexo).
Por sua vez, quanto ao período de 29/04/1995 a 05/06/2002, o mesmo PPP acima mencionado aponta que a autora, ainda trabalhando na "Santa Casa São Vicente de Paulo de Tanabi", passou a desempenhar as funções de "Atendente de Enfermagem" (29/04/1995 a 30/04/1998) e "Auxiliar de Enfermagem" (01/05/1998 a 05/06/2002). Dentre as funções exercidas pela autora, descritas no documento em questão, destaco as seguintes: "desempenhava (...) atividades básicas de enfermagem no hospital, prestava assistência ao paciente", "realiza a instrumentação cirúrgica, realiza cateterismo vesical e sondagens, realiza tricotomia, degermação da pele do paciente", "auxilia no transporte do paciente, acondiciona roupas, realiza curativos".
Restou consignado no documento em questão que a requerente esteve exposta a "todos agentes biológicos (vírus, bactérias, fungos, protozoários, etc.)", seja no período de 29/04/1995 a 30/04/1998, como no de 01/05/1998 a 05/06/2002. Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrados como especiais referidos interregnos, por encontrarem subsunção nos itens 1.3.4 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
Conforme planilha em anexo, somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda (1º/11/1976 a 30/04/1977 e 29/04/1995 a 05/06/2002) àquela já assim considerada pelo próprio INSS (1º/05/1977 a 28/04/1995 - fl. 73), verifica-se que a autora contava com 25 anos, 07 meses e 05 dias de atividade desempenhada em condições especiais, por ocasião da data da entrada do requerimento administrativo (05/06/2002), fazendo jus, portanto, à aposentadoria especial pleiteada.
No que se refere à possibilidade, ou não, de conversão de tempo especial para comum antes da edição da Lei nº 6.887/80, e após 28/05/98, desnecessária qualquer consideração a respeito, porquanto a aposentadoria pleiteada pela autora é a especial, modalidade que se caracteriza pela exigência de que a integralidade do tempo computado para sua concessão seja especial, sem conversões de outros tempos de serviço.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da concessão da benesse em sede administrativa (DIB 05/06/2002 - fls. 13/16), uma vez que se trata de revisão do coeficiente de cálculo e da renda mensal inicial, em razão do reconhecimento dos períodos laborados em atividade especial.
Entretanto, os efeitos financeiros da revisão incidirão a partir da data da citação (13/06/2008 - fl. 42), tendo em vista que não se pode atribuir à autarquia as consequências da postura desidiosa do administrado que levou 6 (seis) anos para judicializar a questão, após ter deduzido seu pleito administrativamente. Impende salientar que se está aqui a tratar da extração ou não de efeitos decorrentes da conduta daquele que demora em demasia para buscar satisfação à sua pretensão. Os efeitos da sentença condenatória via de regra, retroagem à data da citação, eis que somente a partir dela é que se afigura em mora o devedor, situação que não se abala quando da existência de requerimento administrativo prévio, mas efetuado em data muito anterior ao ajuizamento da ação, como sói ocorrer no caso dos autos. Significa dizer, em outras palavras, que o decurso de tempo significativo apaga os efeitos interruptivos da prescrição, fazendo com que o marco inicial para o pagamento seja aquele considerado o da comunicação ao réu da existência de lide e de controvérsia judicial.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Isento a Autarquia do pagamento de custas processuais.
Ante o exposto, nego provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, e dou provimento à apelação da parte autora, para determinar ao INSS que proceda à revisão do benefício, reconhecendo a especialidade do labor exercido nos períodos de 1º/11/1976 a 30/04/1977 e 29/04/1995 a 05/06/2002, e implante o benefício de aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo (05/06/2002), com efeitos financeiros a partir da data da citação (13/06/2008), sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando, ainda, a Autarquia no pagamento da verba honorária, fixada em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas, contadas estas até a data de prolação da sentença.
É como voto.
Desembargador Federal
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