
| D.E. Publicado em 22/05/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do autor e prover parcialmente o apelo do INSS e a remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0001636-06.2011.4.03.6140/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelações interpostas por SEBASTIÃO SOARES VIEIRA e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária pelo rito ordinário, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do trabalho rural exercido sem registro em CTPS, e especial, com consequente conversão em tempo comum.
Agravo retido interposto pelo autor às fls. 168/172, em face da r. decisão que determinou o envio dos autos ao Contador, para a elaboração de simulação de contagem de tempo desconsiderando-se o período anterior a 1º de janeiro de 1981 (fl. 164).
A r. sentença de fls. 178/182 julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a autarquia a reconhecer a atividade rural no período de 01/01/72 a 30/3/77, averbar como especial o trabalho exercido pelo autor no período de 01/01/81 a 30/08/96, com a consequente concessão da aposentadoria por tempo de serviço proporcional a partir do requerimento administrativo (14/05/97), observada a prescrição quinquenal, acrescidas as parcelas em atraso de correção monetária de acordo com a Súmula nº 08 desta Corte, bem como juros de mora fixados em 1% ao mês, a contar da citação. Fixou a verba honorária em 10% sobre as parcelas devidas até a sentença. Sentença submetida à remessa necessária.
Em razões recursais de fls. 186/194, pugna o autor, inicialmente, pela apreciação do agravo retido. No mérito, pleiteia o reconhecimento, como especial, da atividade exercida anteriormente a 1º de janeiro de 1981, bem como o trabalho rural desempenhado no período de 16/06/60 a 31/12/71.
Igualmente inconformado, apela o INSS às fls. 197/206, oportunidade em que se insurge quanto ao reconhecimento do trabalho especial, seja ao fundamento da ausência de documentação contemporânea ao desempenho da atividade, seja em decorrência da utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPI. Subsidiariamente, requer a fixação do termo inicial do benefício na data da citação, a redução da verba honorária para 5% e a incidência, nos juros de mora, da Lei nº 11.960/09.
Contrarrazões da autarquia às fls. 215/220.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, observo que a matéria ventilada no agravo retido (limitação temporal para o reconhecimento de trabalho especial) se confunde com o mérito, e com ele será objeto de apreciação.
Passo ao exame do labor rural.
Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
As pretensas provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo do autor:
a) Escrituras Públicas de Venda e Compra emitidas pelo Registro de Imóveis da Comarca de Ivaiporã/PR, por meio das quais o autor, qualificado como lavrador, adquiriu, em 03 de agosto de 1973, um imóvel rural (lote 159), alienando-o em 13 de abril de 1976 (fls. 17/19).
Registro que a Declaração de Exercício de Atividade Rural emitida pelo Sindicato dos assalariados, empregados e diaristas rurais de Lunardelli e região (fl. 16), não será aqui considerada, à míngua de homologação por parte do INSS (art. 106, III, da Lei nº 8.213/91); idêntica solução se aplica aos documentos de fls. 20/24, uma vez que se tratam de declarações de terceiros.
A documentação juntada, no entanto, é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal colhida em audiência realizada em 24 de julho de 2009.
Levi Moreira, inquirido à fl. 161, afirmou ter residido na cidade de Lunardelli no período de 1963 a 1966, local em que teria conhecido o autor, então com aproximadamente 10 anos de idade, trabalhando como diarista em propriedade de terceiros. Disse, também, saber que o requerente ali trabalhou, juntamente com a família, nas culturas de arroz, café, milho e feijão, sendo que moravam em uma colônia rural na fazenda conhecida como "Água do Correio", produziam para consumo próprio com a comercialização do excedente.
Benedito Rovirson Moreira declarou, à fl. 162, que desde 1966 sua família residia em um sítio na cidade de Lunardelli, ocasião em que conheceu o autor, o qual trabalhava na "Fazenda da Gema", distante quatro quilômetros e passava, com frequência, defronte ao sítio com uma carroça puxada por burros. Asseverou, igualmente, acreditar que o requerente teria deixado o labor no ano de 1977, e que o trabalho, até então, se dera inicialmente como diarista e, após a aquisição de um pequeno sítio na região, em regime de subsistência nas lavouras de milho, feijão, café e arroz.
Por fim, Maria Doroti Moreira, em depoimento prestado à fl. 163, afirmou ter residido em Lunardelli no período de 1960 a 1978, tendo conhecido o autor quando ainda em tenra idade. Disse que a família do requerente possuía uma chácara, onde trabalhavam em regime de economia familiar cultivando café, feijão e milho.
O digno Juízo de 1º grau acolheu o trabalho no campo de 01/01/1972 a 30/03/1977, sendo que a prova oral reforça o labor campesino durante todo o período pleiteado, sendo possível, portanto, reconhecer o trabalho desde 16/06/1960 (data em que completou 12 anos de idade) a 30/03/1977.
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Passo à apreciação do trabalho exercido em condições especiais.
Quanto ao período laborado na empresa Fiat Lux Fósforos de Segurança, o formulário DSS-8030, bem como o laudo técnico pericial informam que o autor esteve exposto a ruído de 84 decibéis, na condição de servente junto ao setor VPO - Aplicação de Lixas/Empacotamento, de 06 de abril de 1977 a 02 de maio de 1979 (fls. 55/76).
Por sua vez, o formulário e laudo pericial de fls. 77/79 (documentos renovados às fls. 107/112) dão conta de que o requerente, na condição de ajudante prático e operador de empilhadeira junto à Elevadores Otis Ltda. esteve sujeito, no período de 04 de junho de 1979 a 30 de agosto de 1996, a nível de pressão sonora da ordem de 85 decibéis.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Assim sendo, reputo enquadrados como especiais todos os períodos indicados na inicial.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Acresce-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Quanto aos requisitos etário e contributivo estabelecidos pela EC nº 20/98, em seu art. 9º, temos:
Conforme planilha anexa, somando-se as atividades rural e especial reconhecidas nesta demanda aos períodos incontroversos constantes da CTPS de fls. 10/11, verifica-se que o autor contava com 44 anos, 01 mês e 23 dias de contribuição na data da entrada do requerimento (14/05/1997 - fl. 97), anteriormente à edição da Emenda Constitucional nº 20/98.
Tem o autor, portanto, direito ao benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição.
O requisito carência restou também completado, considerados os vínculos empregatícios constantes do resumo de documentos para cálculo de tempo de serviço de fl. 151
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo (14/05/97 - fl. 97), observada a prescrição quinquenal.
Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Cálculos e Procedimentos aplicável à Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Já a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Cálculos e Procedimentos da Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Mantenho os honorários advocatícios, fixados adequada e moderadamente em 10% sobre o valor das parcelas devidas até a data de prolação da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do C. STJ.
Ante o exposto, dou provimento ao apelo do autor para reconhecer a atividade rural, sem registro em CTPS, de 16/06/1960 a 31/12/1971, a especialidade do trabalho desempenhado nos períodos de 06/04/77 a 02/05/79 e 04/06/79 a 31/12/80 e condenar o INSS à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço integral. Dou parcial provimento à apelação do INSS para fixar os juros de mora de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Dou parcial provimento à remessa necessária para determinar que as parcelas em atraso sejam acrescidas de correção monetária, de acordo com o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009, mantendo no mais a r. sentença de primeiro grau.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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