Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1953702 / SP
0008451-77.2014.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. ATIVIDADE ESPECIAL.
EXPOSIÇÃO A RISCO BIOLÓGICO. CONJUNTO PROBATÓRIO. RECONHECIMENTO.
BENEFÍCIO INTEGRAL CONCEDIDO. DATA DE INÍCIO. REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. DIREITO DE OPÇÃO
PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. EXECUÇÃO DO JULGADO SE OPTADO PELO
BENEFÍCIO CONCEDIDO NA VIA ADMINISTRATIVA. JUÍZO DA EXECUÇÃO. APELAÇÃO DO
INSS E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
2 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
3 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
4 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
5 - Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese
da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a
harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial,
o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de
conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
6 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até
a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
7 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
8 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
9 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
14 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
15 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
16 - A r. sentença monocrática reconheceu a especialidade do labor desempenhado pela autora
nos períodos de 01/07/1984 a 31/12/1984, 01/03/1986 a 30/04/1986, 06/03/1997 a 30/12/2004,
29/01/2002 a 31/07/2006 e de 03/05/2005 a 05/04/2011. No tocante ao período de 01/07/1984 a
31/12/1984, o formulário de fl. 76 e o laudo técnico pericial de fl. 77 informam que ela
desempenhou a atividade de estagiária de enfermagem junto à Fundação Espírita Américo
Bairral, exposta de maneira habitual e permanente a doenças infectocontagiosas, cabendo o
seu enquadramento no código 1.3.2 do Anexo do Decreto 53.831/64 e item 1.3.4 do Anexo I do
Decreto 83.080/79.
17 - No que tange ao lapso de 01/03/1986 a 30/04/1986, observo do Resumo de Documentos
para Cálculo de Tempo de Contribuição de fl. 101/107 que o próprio INSS já o reconheceu
como laborado sob condições especiais, razão pela qual resta incontroverso.
18 - Quanto ao período de 06/03/1997 a 30/12/2004, observo do PPP de fls. 89/91 que a autora
desempenhou as funções de atendente de enfermagem, auxiliar de enfermagem e técnico de
enfermagem junto à Irm. da Santa Casa de Misericórdia de Itapira, exposta a doenças
infectocontagiosas, o que permite o seu enquadramento nos mesmos itens acima mencionados.
19 - No tocante à 29/01/2002 a 31/07/2006, o PPP de fls. 92/94 dá conta que a postulante
laborou como técnico de enfermagem junto à Clínica de Repouso Santa Fé Ltda, exposta a
vírus, fungos e bactérias no exercício de seu mister, o que permite o seu enquadramento no
código 1.3.2 do Anexo do Decreto 53.831/64 e item 1.3.4 do Anexo I do Decreto 83.080/79.
Entretanto, a evitar a concomitância de períodos, limito o reconhecimento especial deste
interregno à 01/01/2005 (dia imediatamente posterior ao encerramento do vinculo precedente) a
31/07/2006.
20 - Por fim, quanto ao período de 03/05/2005 a 05/04/2011, o PPP de fl. 95/97, elaborado em
25/02/1998, demonstra que a autora exerceu a função de auxiliar de enfermagem junto à
Clínica de Repouso de Itapira Ltda., exposta a vírus, fungos e bactérias no exercício de seu
labor, o que permite o seu enquadramento no código 1.3.2 do Anexo do Decreto 53.831/64 e
item 1.3.4 do Anexo I do Decreto 83.080/79. Entretanto, limito o reconhecimento da
especialidade à 25/02/1998, data da elaboração do PPP de fls. 95/97. Não obstante conste dos
autos o PPP de fls. 214/215, comprovando a especialidade do referido labor, este fora
elaborado em 30/09/2011, ou seja, época posterior à data do requerimento administrativo do
benefício, razão pela qual não pode ser considerado para efeito de reconhecimento do trabalho
como especial.
21 - Nos casos em que resta comprovada a exposição a agente biológico em razão de tarefas
de limpeza hospitalar, a natureza de suas atividades já revela, por si só, que mesmo nos casos
de utilização de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional.
22 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de
01/07/1984 a 31/12/1984, 06/03/1997 a 30/12/2004, 01/01/2005 (dia imediatamente posterior ao
encerramento do vinculo precedente) a 31/07/2006 e de 03/05/2005 a 25/02/2008 (data do PPP
de fls. 95/97).
23 - Somando-se o labor especial reconhecido nesta demanda (já descontado o período de
recebimento de auxílio-doença previdenciário de 16/01/2006 a 01/04/2006), aos já considerados
especiais pelo próprio INSS, a saber: 01/09/1985 a 30/04/1986, 01/07/1986 a 30/011/1987,
01/11/1988 a 05/02/1990, 01/04/1990 a 17/09/1993, 03/12/1993 a 18/02/1995 e de 16/05/1995
a 05/03/1997 (Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição de fl. 101/107),
bem como aos períodos constantes na CTPS (fls. 56/75 e no CNIS de fls. 136/141, 296/2998 e
os extratos, que passam a integrar a presente decisão), verifica-se que a autora contava com
32 anos, 04 meses e 08 dias de contribuição, na data do requerimento administrativo
(10/03/2011 - fl. 50), o que lhe assegura o direito à aposentadoria integral por tempo de
contribuição.
24 - O requisito carência restou também completado.
25 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo
(10/03/2011 - fl. 50).
26 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
27 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
28 - A parte autora recebe benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, sendo assim,
faculta-se à demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais
vantajoso.
29 - A controvérsia sobre a possibilidade de execução das prestações do benefício concedido
judicialmente na hipótese de opção pelo obtido na via administrativa, mais vantajoso, deverá ser
apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do Tema nº 1.018 pelo
E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado. Observância da
garantia constitucional da duração razoável do processo. Ressalva quanto aos honorários
advocatícios.
30 - No caso de opção pelo benefício judicial, os valores devidos por força da presente
condenação deverão ser compensados com aqueles já pagos administrativamente no período
concomitante.
31 - Apelação do INSS e remessa necessária parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação do INSS, para limitar o reconhecimento do labor especial da autora aos lapsos de
01/07/1984 a 31/12/1984, 06/03/1997 a 30/12/2004, 01/01/2005 a 31/07/2006 e de 03/05/2005
a 25/02/2008, bem como à remessa necessária, tida por interposta, esta última em maior
extensão, para também determinar que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser
calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos
índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício
requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, facultando ao autor a opção de
percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso, observando-se o acima expendido quanto
à execução dos valores atrasados, mantida, no mais, a r. sentença proferida em 1º grau de
jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
