Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2054730 / SP
0007904-49.2008.4.03.6183
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. ATIVIDADE ESPECIAL.
EXPOSIÇÃO A RISCO BIOLÓGICO. CONJUNTO PROBATÓRIO. RECONHECIMENTO.
BENEFÍCIO INTEGRAL CONCEDIDO. DATA DE INÍCIO. REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. VERBA HONORÁRIA.
OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. EXECUÇÃO DOS ATRASADOS. AGRAVO
RETIDO DA PARTE AUTORA NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA
NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - Inicialmente, não conheço do agravo retido interposto pela parte autora, eis que não
reiterado em sede de apelo ou contrarrazões.
2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
3 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
4 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese
da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a
harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial,
o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de
conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
7 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até
a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
8 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
9 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
10 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
11 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
12 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
13 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
14 - A r. sentença monocrática reconheceu a especialidade do labor desempenhado pela autora
nos períodos de 20/04/1976 a 10/08/1977, 10/09/1979 a 13/08/1980, 05/01/1989 a 24/05/1989
e de 25/05/1989 a 08/11/2007. No tocante ao período de 20/04/1976 a 10/08/1977, a CTPS da
autora de fls. 17/24, demonstra que ela laborou como atendente de enfermagem junto ao
Hospital e Maternidade Modelo de Tamandaré. Sendo assim, é possível o reconhecimento da
especialidade por enquadramento profissional, uma vez que a atividade se equipara à prevista
no item 2.1.3 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no item 2.1.3 do Anexo II do Decreto nº
83.080/79. Não obstante conste o PPP de fls. 37, inviável a conversão com base no referido
documento, uma vez que não foi elaborado por profissional legalmente habilitado, requisito
necessário a sua validação.
15 - No que tange ao interregno de 10/09/1979 a 13/08/1980, o laudo técnico pericial de fls.
47/49 comprova que a requerente laborou como atendente de enfermagem junto à Intermédica
Sistema de Saúde S/A., exposta a agentes biológicos, cabendo o seu enquadramento no
código 1.3.2 do Anexo do Decreto 53.831/64 e item 1.3.4 do Anexo I do Decreto 83.080/79.
16 - Quanto ao lapso de 05/01/1989 a 24/05/1989, o PPP de fls. 42/43 relata que a postulante
trabalhou como atendente de enfermagem junto ao SBSC - Hospital e Maternidade São Camilo,
exposta a agentes biológicos, sendo possível, portanto, o enquadramento no código 1.3.2 do
Anexo do Decreto 53.831/64 e item 1.3.4 do Anexo I do Decreto 83.080/79.
17 - Quanto à 25/05/1989 a 08/11/2007, o PPP de fls. 44/45 relata que a postulante exercia a
função DE atendente, realizando as seguintes atividades: "...recolhe urina, fezes e escarro em
pacientes adequados, seguindo rotina estabelecida para possibilitar a realização dos exames
de laboratório requisitados; efetua a chamada do paciente e o posicionamento adequado do
mesmo, seguindo as instruções recebidas para auxiliar o médico na realização do exame;
executa atividades de apoio, como a lavagem e preparo do material para esterilização...". O
referido documento relata a exposição da requerente à agentes microbiológicos, razão pela qual
possível o enquadramento no código 1.3.2 do Anexo do Decreto 53.831/64 e item 1.3.4 do
Anexo I do Decreto 83.080/79.
18 - Nos casos em que resta comprovada a exposição a agente biológico em razão de tarefas
de aux. de enfermagem, téc. de enfermagem e enfermeira, a natureza de suas atividades já
revela, por si só, que mesmo nos casos de utilização de equipamentos de proteção individual,
tido por eficazes, não é possível afastar a insalubridade a que fica sujeito o profissional.
19 Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrado como especial os períodos de
20/04/1976 a 10/08/1977, 10/09/1979 a 13/08/1980, 05/01/1989 a 24/05/1989 e de 25/05/1989
a 08/11/2007.
20 - Conforme planilha elabora pelo magistrado de primeiro grau, somando-se o labor especial
reconhecido nesta demanda, aos períodos constantes na CTPS de fls. 17/24 e 70/76, dos
extratos do CNIS de fl. 118 e do Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de
Contribuição de fls. 61/63, verifica-se que a autora contava com 30 anos, 02 meses e 25 dias de
contribuição, na data do requerimento administrativo (22/04/2008 - fl. 25), o que lhe assegura o
direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição.
21 - O requisito carência restou também completado.
22 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo
(22/04/2008 - fl. 25).
23 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
24 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
25 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
26 - A parte autora recebe benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, sendo assim,
faculta-se à demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais
vantajoso.
27 - A controvérsia sobre a possibilidade de execução das prestações do benefício concedido
judicialmente na hipótese de opção pelo obtido na via administrativa, mais vantajoso, deverá ser
apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do Tema nº 1.018 pelo
E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado. Observância da
garantia constitucional da duração razoável do processo. Ressalva quanto aos honorários
advocatícios.
28 - No caso de opção pelo benefício judicial, os valores devidos por força da presente
condenação deverão ser compensados com aqueles já pagos administrativamente no período
concomitante.
29 - Agravo retido da parte autora não conhecido. Apelação do INSS e remessa necessária
parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do agravo
retido da parte autora e dar parcial provimento ao apelo do INSS e à remessa necessária para
determinar que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a
promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do
IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados
de acordo com o mesmo Manual, facultando ao autor a opção de percepção pelo benefício que
lhe for mais vantajoso, observando-se o acima expendido quanto à execução dos valores
atrasados, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Referência Legislativa
***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-52 ART-57 PAR-4 PAR-5 ART-58***** TR-JEF-3R
SÚMULA DA TURMA RECURSAL DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª R
LEG-FED SUM-13***** RPS-99 REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ART-70 PAR-1LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-
611 ANO-1992 ART-292LEG-FED DEC-53831 ANO-1964 ITE-2.1.3 ITE-1.3.2***** RBPS-79
REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-2.1.3 ITE-1.3.4LEG-FED LEI-6887 ANO-1980LEG-FED
MPR-1523 ANO-1996
REEDIÇÃO Nº 13 DE 255/10/1997LEG-FED LEI-9528 ANO-1997LEG-FED DEC-2172 ANO-
1997LEG-FED MPR-1596 ANO-1997
EDIÇÃO Nº 14 DE 10/11/1997LEG-FED LEI-9711 ANO-1998 ART-28LEG-FED LEI-11960
ANO-2009***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-20 PAR-4***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL
DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-111
Veja
STF RE 870.947/SEREPERCUSSÃO GERALTEMA 810;
STJ RESP 1.767.789/PRREPETITIVOTEMA 1018.
