Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1911619 / SP
0037796-25.2013.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. ATIVIDADE ESPECIAL.
EXPOSIÇÃO A RISCO BIOLÓGICO. CONJUNTO PROBATÓRIO. RECONHECIMENTO
PARCIAL. BENEFÍCIO INTEGRAL CONCEDIDO. DATA DE INÍCIO. CITAÇÃO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. DIREITO DE OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS
VANTAJOSO. EXECUÇÃO DO JULGADO SE OPTADO PELO BENEFÍCIO CONCEDIDO NA
VIA ADMINISTRATIVA. JUÍZO DA EXECUÇÃO. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA
NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 08/05/2013, sob a égide,
portanto, do Código de Processo Civil de 1973. No caso, a r. sentença reconheceu, em favor da
parte autora, tempo de serviço especial e concedeu-lhe a aposentadoria por tempo de
contribuição. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos
do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
3 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
4 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese
da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a
harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial,
o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de
conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
7 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até
a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
8 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
9 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
10 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
11 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
12 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
13 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
14 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
15 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
16 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
17 - Quanto ao período laborado no "Hospital e Maternidade Presidente Prudente S/C Ltda." de
05/10/1991 a 30/06/1995, o Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 26/28, com indicação
dos responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, demonstra que a
autora, no exercício do cargo de "serviços gerais", cujas funções eram essencialmente de
"serviços gerais de limpeza, higienização, desinfecção e arrumação", estava exposta a risco
biológico (vírus, bactérias, fungos), portanto, cabendo o seu enquadramento no código 1.3.2 do
Anexo do Decreto 53.831/64 e item 1.3.4 do Anexo I do Decreto 83.080/79.
18 - Durante as atividades realizadas na "Clínica de Repouso Nosso Lar", de 08/08/1997 a
15/04/2004, e na "Unicom Sociedade de Nefrologia Ltda.", de 01/04/2005 a 28/02/2009, os
Perfis Profissiográficos Previdenciários de fls. 29/31 e 32/33, com indicação dos responsáveis
pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, juntamente com o laudo pericial
produzido em juízo, juntado às fls. 55/61, demonstram que a requerente, ao se dedicar às
funções de auxiliar de limpeza e de encarregada, estava exposta a risco biológico, ao "realizar
as atividades de limpeza geral em todas as áreas do hospital", "a lavagem das roupas dos
pacientes e do hospital, com serviços de desinfecção, lavar, passar e separar as mesmas" e
"limpeza diária da clínica em geral, tal como banheiros, sala de espera, corredores,
higienização de paredes", além de "supervisionar a coleta de lixo comum e infectante",
cabendo, portanto, o seu enquadramento nos itens 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos nº 2.172/97
e nº 3.048/99.
19 - Nos casos em que resta comprovada a exposição a agente biológico em razão de tarefas
de limpeza hospitalar, a natureza de suas atividades já revela, por si só, que mesmo nos casos
de utilização de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional.
20 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de
05/10/1991 a 30/06/1995, 08/08/1997 a 15/04/2004 e 01/04/2005 a 28/02/2009.
21 - Por outro lado, durante o interregno trabalhado de 01/07/1995 a 28/02/1997 no "Hospital e
Maternidade Prudente S/C Ltda.", ainda que haja menção genérica acerca de sua exposição a
risco biológico ("vírus, bactérias, fungos, etc...") no Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls.
26/28 e no laudo apresentado em juízo, tal circunstância não fica caracterizada no exercício do
cargo de recepcionista, consoante análise detida da descrição das atividades da requerente:
"tem por atribuição atender ao telefone, recepcionar o público em geral, fazer o preenchimento
de fichas de pacientes fazendo uso do computador, encaminhar pacientes aos setores
competentes, ou seja, para consulta, exame, internações".
22 - Situações como a presente, de desempenho de atribuições que não se relacionam
diretamente com fatores de risco, somente poderiam ser admitidas no caso de maior
detalhamento, com relato das particularidades que justificariam o trato da atividade como
especial, o que não ocorreu no caso em apreço. Portanto, afastada a especialidade
reconhecida no período de 01/07/1995 a 28/02/1997.
23 - Somando-se o labor especial reconhecido nesta demanda aos períodos constantes na
CTPS e no CNIS, que passa a integrar a presente decisão, verifica-se que a autora contava
com 30 anos e 15 dias de contribuição na data do ajuizamento (10/08/2012), o que lhe
assegura o direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição, não havendo que se falar
em aplicação do requisito etário, nos termos do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal.
24 - O requisito carência restou também completado.
25 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da citação (11/01/2013 - fl. 87).
26 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
27 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
28 - A parte autora recebe benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, sendo assim,
faculta-se à demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais
vantajoso.
29 - A controvérsia sobre a possibilidade de execução das prestações do benefício concedido
judicialmente na hipótese de opção pelo obtido na via administrativa, mais vantajoso, deverá ser
apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do Tema nº 1.018 pelo
E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado. Observância da
garantia constitucional da duração razoável do processo. Ressalva quanto aos honorários
advocatícios.
30 - No caso de opção pelo benefício judicial, os valores devidos por força da presente
condenação deverão ser compensados com aqueles já pagos administrativamente no período
concomitante.
31 - Apelação do INSS e remessa necessária parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação do INSS, para afastar a especialidade de 01/07/1995 a 28/02/1997, bem como à
remessa necessária, tida por interposta, esta última em maior extensão, para também
determinar que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a
promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do
IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados
de acordo com o mesmo Manual, facultando ao autor a opção de percepção pelo benefício que
lhe for mais vantajoso, observando-se o acima expendido quanto à execução dos valores
atrasados, mantida, no mais, a r. sentença proferida em 1º grau de jurisdição, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
