Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1986597 / SP
0000971-70.2013.4.03.6123
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
26/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/09/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. ATIVIDADE ESPECIAL.
RUÍDO. ÓLEO LUBRIFICANTE. TEMPO SUFICIENTE. BENEFÍCIO PROPORCIONAL
CONCEDIDO. DATA DO INÍCIO. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DA PARTE
AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
2 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
3 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
4 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
5 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
6 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
7 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
8 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
9 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização
do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento
não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C.
STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que
integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
10 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
11 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
12 - O requerente pretende ver reconhecido seu labor especial nos períodos de 20/06/2000 a
17/02/2004, 01/07/2004 a 07/10/2005, 10/10/2005 a 11/11/2009 e de 01/06/2010 a 06/01/2012.
No tocante ao período de 20/06/2000 a 17/02/2004, o PPP de fls. 31/32 informa que o autor
exerceu a função de encarregado de serraria junto à Serraria Poletti Ltda., exposto a óleo
lubrificante de corte e semi sintético, sem o uso de EPI eficaz. Assim, possível o
enquadramento no Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, em seu item 1.0.3. Precedentes.
13 - No tocante ao interregno de 01/07/2004 a 07/10/2005, o PPP de fls. 33/34, informa que ele
desempenhou a função de encarregado de serraria junto à Ind. E COM. DE Madeiras Jaguari,
exposto a ruído de 92dB, o que permite a conversão por ele pretendida.
14 - Quanto ao lapso de 10/10/2005 a 11/11/2009, o PPP de fls. 35/36 relata que o postulante
laborou como encarregado de serraria junto à Serraria Poletti Ltda., exposto a ruído de 73dB a
103,9dB. Quanto ao tema, destaco que havia entendimento no sentido da impossibilidade de
reconhecimento da especialidade da atividade, na hipótese de submissão do empregado a nível
de pressão sonora de intensidade variável, em que aquela de menor valor fosse inferior ao
limite estabelecido pela legislação vigente. Ao revisitar os julgados sobre o tema, tormentoso, a
nova reflexão jurisprudencial, passou a admitir a possibilidade de se considerar, como especial,
o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído em sua maior intensidade, na medida em que
esta acaba por mascarar a de menor intensidade, militando em favor do segurado a presunção
de que uma maior pressão sonora prevalecia sobre as demais existentes no mesmo setor.
15 - Precedente do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual "não sendo possível aferir a
média ponderada, deve ser considerado o maior nível de ruído a que estava exposto o
segurado, motivo pelo qual deve ser reconhecida a especialidade do labor desenvolvido pelo
segurado no período, merecendo reforma, portanto, a decisão agravada que considerou
equivocadamente que o labor fora exercido pelo segurado com exposição permanente a ruído
abaixo de 90dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003" (AgRg no REsp nº 1.398.049/PR, Rel.
Min. Napoleão Nunes Maia Filho, decisão monocrática, DJe 13/03/2015).
16 - Quanto ao interregno de 01/06/2010 a 06/01/2012, o PPP de fls. 37/38 informa que ele
desempenhou a função de encarregado de serraria junto à mesma empresa, exposto a óleo
lubrificante de corte e semi sintético, o que permite o enquadramento no Decreto nº 3.048/99,
Anexo IV, em seu item 1.0.3, conforme anteriormente explicitado.
17 - No tocante à fundamentação inserta na sentença de primeiro grau que deixou de
considerar os PPP de fls. 31/38 e julgou improcedente o pedido de reconhecimento do labor
especial, em razão da ausência de procuração outorgada pela Serraria Poletti Ltda. a Sra. Ivone
da Silva Bueno, a qual assinou o PPPs de fls. 31/32 e 37/38, bem como em função da
divergência de assinaturas do Sr. Ismael do Nascimento nos documentos de fls. 33/34 e 35/36,
tenho que tais assertivas não merecem prosperar. Senão vejamos:
18 - Verifica-se à fl. 28 dos autos que a Sra. Ivone da Silva Bueno, além de assinar os PPP de
fls. 31/32 e 37/38, também assina em nome da Serraria Poletti Ltda., por meio de procuração, a
CTPS do autor quando do registro de seu labor em 01/06/2010, o que comprova que, de fato,
ela representa a referida empresa e possui poderes para tanto, razão pela qual não há razões
que afastem a legitimidade do documento de fls. 31/32 e 37/38.
19 - Cumpre considerar, ainda, que a exigência da demonstração dos poderes do signatário do
Perfil Profissiográfico Previdenciário não consta como requisito legal para a sua validade, o qual
apenas deve indicar que está embasado em registros ambientais, bem como o responsável
técnico por sua aferição, como ocorreu no caso presente. Nessa linha, qualquer requisito
adicional estabelecido por meio de Instrução Normativa, excede os limites de sua edição,
tornando-a ilegal.
20 - No tocante à divergência de assinaturas do Sr. Ismael do Nascimento nos documentos de
fls. 33/34 e 35/36, observo a congruência das rubricas apostadas no PPP de fls. 35/36 (relativo
ao interregno de 10/10/2005 a 11/11/2009) e no registro constante da CTPS à fl. 77 dos autos,
datado de 10/10/2007 a 09/10/2008, bem como no PPP de fls. 33/34 (relativo ao lapso de
01/07/2004 a 07/10/2005) e no registro efetuado na CTPS e constante à fl. 27, demonstrando
que ambas as assinaturas referem-se ao Sr. Ismael do Nascimento, o que comprova a
veracidade dos referidos PPPs.
21 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrados como
especiais os períodos de 20/06/2000 a 17/02/2004, 01/07/2004 a 07/10/2005, 10/10/2005 a
11/11/2009 e de 01/06/2010 a 06/01/2012.
22 - Somando-se o trabalho especial, convertido em comum, aos períodos constantes da CTPS
de fls. 20/28 e 54/87, dos extratos do CNIS de fls. 29/30 e 111/112 e do Resumo de
Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição de fls. 150/153, verifica-se que o autor
contava com 34 anos, 08 meses e 19 dias de contribuição na data do requerimento
administrativo (26/01/2012 - fl. 39), fazendo jus, portanto, ao benefício de aposentadoria
proporcional por tempo de contribuição, uma vez cumpridos os requisitos referentes ao
"pedágio" e idade mínima (nascimento em 17/01/1958)
23 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo
(26/01/2012 - fl. 39).
24 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
25 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
26 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
27 - Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade dos períodos de 20/06/2000 a
17/02/2004, 01/07/2004 a 07/10/2005, 10/10/2005 a 11/11/2009 e de 01/06/2010 a 06/01/2012
e condenar o INSS na implantação da aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, a
partir da data do requerimento administrativo (26/01/2012 - fl. 39), sendo que sobre os valores
em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a
expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual e que os honorários
advocatícios sejam fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
