Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1966822 / SP
0000136-04.2011.4.03.6107
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
12/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. ATIVIDADE RURAL.
DESCARACTERIZADO REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. EMPREGADOR RURAL.
NECESSIDADE DE CONTRIBUIÇÕES. ATIVIDADE ESPECIAL. ELETRICISTA. TEMPO
INSUFICIENTE PARA BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS COMPENSADOS
ENTRES AS PARTES. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APELOS E REMESSA NECESSÁRIA,
TIDA POR INTERPOSTA DESPROVIDAS
1 - A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 23/08/2013, sob a égide,
portanto, do Código de Processo Civil de 1973. No caso, a r. sentença reconheceu, em favor da
parte autora, tempo de serviço rural e especial. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao
reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do
STJ.
2 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
3 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
4 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
5 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
6 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais.
7 - Pretende o autor o reconhecimento do labor rural exercido de 01/01/1967 a 30/09/1979,
exercido em regime de economia familiar. As provas materiais juntadas aos autos, a respeito do
labor no campo do autor, dentre outros, são: a) Documentos relativos à imóvel rural, expedidos
em nome do genitor do autor, relativos aos anos de 1947 a 1949 (fls. 39/41 e 46/48) e os b)
Certificados de Cadastro em nome de seu genitor doas anos de 1977, 1979 e 1984 (fls. 44/45).
8 - É certo que a documentação apresentada demonstra que o genitor do autor realmente
exerceu a atividade rural, entretanto, esta não se deu em regime de economia familiar, como
alegado pelo autor.
9 - O referido regime caracteriza-se pela agricultura de subsistência, porém a documentação
acostada aos autos, mais especificamente, os certificados de cadastro de fls. 44/45 classificam
a propriedade rural de seu pai como latifúndio de exploração, bem como indicam a contratação
de 12 empregados, o que notadamente refoge à idéia de agricultura de subsistência. No mesmo
sentido, consta à fl. 58 que ele recebeu o benefício de aposentadoria por idade rural, na
condição de empregador rural.
10 - Assim, a bem da verdade, o genitor do autor, empregador rural, explorava a produção
obtida como meio de vida, de forma lucrativa, comercializando-a, situação diversa de
plantações precipuamente destinadas ao consumo familiar, como condição para subsistência.
11 - Nessa ótica, tendo em vista a condição de empregador rural do pai do autor, o
reconhecimento previdenciário do labor rural de seu filho, dependeria o efetivo registro da
atividade dele em CTPS com o recolhimento das respectivas das contribuições nessa condição,
o que não ocorreu no presente caso.
12 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
13 - Na realidade, pretende o autor que os depoimentos testemunhais suprissem a
comprovação de muitos anos de exercício de labor rural, o que não se afigura legítimo. Admitir
o contrário representaria burlar o disposto em lei, eis que o substrato material nela exigível deve
ser minimamente razoável, sob pena de aceitação da comprovação do período laborado
exclusivamente por prova testemunhal. Desta feita, fica afastado o reconhecimento do alegado
labor rural.
14 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
15 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
16 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
17 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
18 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
19 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
20 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
21 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
22 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
23 - No mais, importante ser dito que restou superada a questão relacionada à supressão do
agente "eletricidade" do rol do Decreto n.º 2.172/97, nos termos do entendimento adotado no
REsp nº 1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo
Superior Tribunal de Justiça.
24 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
25 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
26 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
27 - A r. sentença monocrática reconheceu o labor especial no período de 15/07/1980 a
05/03/1997. A comprovar a referida especialidade, o autor trouxe aos autos o formulário de fl.
32 e o laudo técnico pericial de fls. 33/35 que informam que ele desempenhou as funções de
técnico de eletrônica, técnico de manutenção eletrônica, técnico de eletrônica III e técnico de
eletrônica IV junto à Cia. De Transmissão de Energia Elétrica Paulista, exposto a tensão elétrica
acima de 250 volts, o que permite o enquadramento no item 1.1.8 do Anexo do Decreto
53.831/64. Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrado como especial o período
de 15/07/1980 a 05/03/1997.
28 - Procedendo ao cômputo do labor especial reconhecido nesta demanda (15/07/1980 a
05/03/1997), acrescido dos períodos incontroversos constantes do Resumo de Documentos
para Cálculo de Tempo de Contribuição (fls. 52/53) e do CNIS de fl. 50, verifica-se que, até a
data do requerimento administrativo (17/10/2006), não havia cumprido o requisito etário
(nascimento em 21/07/1954), não fazendo jus à aposentadoria proporcional por tempo de
contribuição, conforme disposição do art. 9º, §1º, da Emenda Constitucional nº 20/98.
29 - Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários
advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a
gratuidade da justiça conferida à parte autora (fl. 29) e por ser o INSS delas isento.
30 - Apelações e remessa necessária, tida por interposta desprovidas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento aos
apelos e à remessa necessária, tida por interposta, mantendo a r. sentença proferida em 1º
grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
