Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1955327 / SP
0000498-72.2012.4.03.6106
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO PARCIAL. ATIVIDADE
ESPECIAL. MOTORISTA DE CAMINHÃO. CONJUNTO PROBATÓRIO. ADMISSÃO PARCIAL.
TEMPO SUFICIENTE. BENEFÍCIO INTEGRAL CONCEDIDO. DATA DO INÍCIO. DATA DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDA. APELAÇÃO DA
PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 05/12/2013, sob a égide,
portanto, do Código de Processo Civil de 1973. No caso, a r. sentença reconheceu, em favor da
parte autora, tempo de serviço rural e comum. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao
reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do
STJ.
2 - Resta incontroverso o trabalho rural no período de 17/04/1969 a 30/12/1971 e 01/01/1982 a
31/12/1982, além do período urbano de 22/04/1977 a 11/05/1977, tendo em vista o seu
reconhecimento administrativo pelo INSS (fl. 123/125).
3 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
4 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
5 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
6 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
7 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais.
8 - Como prova da atividade campesina, o autor trouxe certidão do Instituto de Identificação
Ricardo Gumbleton Daunt, na qual consta que, em 24/08/1972, era lavrador (fl. 139), o que se
demonstra suficiente à configuração do exigido início de prova material..
9 - A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos
carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino de 23/11/1963 a
16/04/1969 e 01/01/1973 a 21/04/1977, período que antecede o primeiro vínculo urbano
registrado em sua CTPS.
10 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
11 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
12 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
13 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
14 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
15 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
16 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
17 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
18 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
19 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
20 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
21 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
22 - Durante as atividades realizadas na empresa "Santa Luzia Agropecuária Ltda." de
08/06/1987 a 02/12/1987, consoante informa a cópia da CTPS juntada à fl. 49, o autor exerceu
a atividade profissional de motorista carreteiro, que pode ser enquadrada no Código 2.4.4 do
Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e Código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79.
23 - Quanto ao período laborado para a mesma empregadora de 03/06/1985 a 28/04/1986, a
cópia de fl. 48 de sua CTPS comprova que o autor exerceu a função de tratorista, e, portanto,
enquadrando-se no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e no Código 2.4.2 do
Anexo II do Decreto 83.080/79, por ser esta atividade equiparada a de motorista. Precedentes.
24 - Por outro lado, quanto aos demais interregnos pleiteados como especiais, ainda que haja
menção na CTPS apresentada acerca do exercício da função de motorista (fls. 48/51), não há
qualquer evidencia adicional de que o autor era condutor de ônibus ou caminhões, portanto, o
que se demonstra insuficiente para o enquadramento no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do
Decreto 53.831/64 ("motorneiros e condutores de bondes"; "motorista e cobradores de ônibus";
e "motoristas e ajudantes de caminhão") e no Código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79
("motorista de ônibus e de caminhões de cargas").
25 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, enquadrados como
especiais apenas os períodos de 03/06/1985 a 28/04/1986 e 08/06/1987 a 02/12/1987.
26 - Somando-se o tempo de labor rural e especial, convertido em comum, além do tempo
comum, aos períodos constantes no "Resumo de Documentos para Cálculo do Tempo de
Contribuição" (fls. 123/125), verifica-se que o autor contava com 37 anos, 11 meses e 12 dias
de contribuição na data do requerimento administrativo (06/04/2011 - fls. 123/125), o que lhe
assegura o direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição, não havendo que se falar
em aplicação do requisito etário, nos termos do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal.
27 - O requisito carência restou também completado.
28 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo
(06/04/2011 - fls. 123/125).
29 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
30 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
31 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
32 - Remessa necessária desprovida. Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
remessa necessária, tida por interposta, e dar parcial provimento à apelação da parte autora,
para admitir o trabalho rural de 23/11/1963 a 16/04/1969 e 01/01/1973 a 21/04/1977, bem como
a especialidade de 03/06/1985 a 28/04/1986 e 08/06/1987 a 02/12/1987, e condenar o INSS na
implantação da aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir da data do
requerimento administrativo (06/04/2011), sendo que sobre os valores em atraso incidirá
correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos
na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada
pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de
acordo com o mesmo Manual, condenando-o, ainda, no pagamento dos honorários
advocatícios, arbitrados no montante de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da
prolação da sentença, mantida, no mais, a r. sentença de primeiro grau de jurisdição, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
