Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2020083 / SP
0001020-35.2013.4.03.6116
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
23/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. EXTINÇÃO DO FEITO SEM
ANÁLISE DO MÉRITO QUANTO AO PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE ESPECIALIDADE
DO LABOR DESEMPENHADO JUNTO À PREFEITURA MUNICIPAL DE ASSIS.
ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA
REJEITADA. INOVAÇÃO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
IMPRESSOR. TINTAS E SOLVENTES. RECONHECIMENTO PARCIAL. CONJUNTO
PROBATÓRIO SUFICIENTE. ADMISSÃO. BENEFÍCIO INTEGRAL CONCEDIDO. TERMO
INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS
DE MORA. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
APELO DA PARTE AUTORA CONHECIDO EM PARTE, E NA PARTE CONHECIDA, MATÉRIA
PRELIMINAR REJEITADA E PARCIALMENTE PROVIDO.
1 - O INSS foi condenado a reconhecer períodos de labor especial, bem como a conceder o
benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição. Assim, não havendo como
se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário,
nos termos do inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula 490 do STJ.
2 - Rejeitada a preliminar de nulidade da sentença em razão do alegado cerceamento de defesa
por ausência de produção probatória, eis que a prova documental juntada aos autos mostra-se
suficiente para o julgamento da causa, sendo, portanto, desnecessária a realização da perícia
requerida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
3 - Pretende o requerente o reconhecimento como especial, dentre outros, do período em que
laborou junto à Prefeitura Municipal de Assis, sob regime próprio, de 14/03/1996 a 27/01/1997.
Trouxe aos autos para comprovação da atividade especial, a Certidão de Tempo de
Contribuição expedida pelo referido órgão, demonstrando sua qualificação profissional como
gráfico, de 14/03/1996 a 27/01/1997, o que totaliza 320 dias de labor. Infere-se, pois, do exame
documental, que o autor ingressara na Prefeitura Municipal de Assis, vertendo contribuições a
regime próprio de previdência, com matrícula de número 5011. Todavia, o desiderato do
litigante encontra óbice na própria legislação previdenciária, a qual não admite a conversão da
atividade especial em comum, consoante artigo 125, § 1º, do Decreto nº 3.048/99.
4 - Não compete à autarquia securitária a apreciação da especialidade aventada e sim ao
próprio ente federativo, no qual o autor desenvolvera atribuições vinculadas ao regime
previdenciário próprio, que, in casu, corresponde à Prefeitura Municipal de Assis. Assim, resta
patente a ilegitimidade passiva da autarquia previdenciária quanto ao referido pleito.
5 - Tendo em vista que a legitimidade das partes é uma das condições da ação, sendo matéria
de ordem pública, a ser reconhecida em qualquer fase processual, independentemente de
requerimento das partes, de rigor a extinção do feito, sem resolução de mérito, nos termos do
artigo 267, VI, do Código de Processo Civil, quanto ao pedido de reconhecimento da
especialidade do labor desempenhado de 14/03/1996 a 27/01/1997.
6 - Não conhecido o pedido de concessão da aposentadoria especial, requerido pela parte
autora em sede de apelo, por tratar-se de inovação recursal.
7 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
8 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
9 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
10 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
11 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na
legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo
comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um
comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser
desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do
sistema.
12 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada
até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
13 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
14 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
15 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
16 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
17 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
18 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
19 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
20 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
21 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
22 - A r. sentença monocrática reconheceu a especialidade dos períodos de labor do autor de
01/02/1976 a 25/02/1980, 01/04/1980 a 31/10/1987, 01/12/1987 a 22/04/1991, 02/01/2003 a
08/10/2004 e de 01/10/2005 a 05/09/2011. Por outro lado, requer a parte autora o
reconhecimento da totalidade dos períodos em que exerceu labor de natureza especial. No que
tange aos interregnos de 01/02/1976 a 25/02/1980, de 01/04/1980 a 31/10/1987 e de
01/12/1987 a 22/04/1991, a CTPS do requerente de fls. 44/69 informa que ele desempenhou as
funções de auxiliar de blocagem, impressor e impressor off set, em estabelecimento de
tipografia, junto à Mendes, Bellini & Cia Ltda., atividade que podem ser incluídas no item 2.5.5
do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no 2.5.8 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79, sendo
possível a conversão pretendida.
23 - Quanto à 01/06/1999 a 05/11/2002, o PPP de fls. 76/77 informa que o autor desempenhou
a função de impressor off set, junto à Portes Pinheiro &Cia. Ltda., exposto a solventes no
exercício de seu labor, sem o uso de EPI eficaz, o que permite o enquadramento nos itens
1.2.11 do Decreto nº 53.831/64; 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79; 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97; e
2.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
24 - Não obstante conste do referido PPP que a exposição do autor ao agente nocivo se deu de
maneira intermitente, possível o reconhecimento da especialidade, isto porque os requisitos de
"habitualidade" e "permanência" devem ser interpretados com granus salis. Exigir-se do
trabalhador a exposição ininterrupta aos agentes agressivos, por toda a sua jornada de
trabalho, ficaria restrita somente àqueles que tivessem sua saúde esmigalhada. Habitualidade
pressupõe frequência, que, por sua vez, é atingida com o exercício cotidiano de determinado
trabalho ou função. Portanto, o conceito de moderado ou, até mesmo, alternado não são auto-
excludentes da ideia de habitualidade. A questão da permanência deve ser encarada da mesma
forma. A ideia é de que a exposição seja duradoura, capaz de prejudicar a saúde do
trabalhador. Mas não se exige seja ininterrupta, pois, a seguir esse raciocínio, somente faria jus
à aposentadoria especial o trabalhador doente. Por esta razão, é que a situação de
intermitência não afasta a especialidade do labor, desde que a exposição se dê rotineiramente,
de maneira duradoura.
25 - No tocante ao lapso de 02/01/2003 a 08/10/2004, o requerente juntou aos autos o PPP de
fls. 78/79 que informa que ele laborou como impressor, junto à Paraguaçu Gráfica e Editora
Ltda., exposto a ruído de 92dB, o que permite o reconhecimento por ele pretendido.
26 - Quanto à 01/10/2005 a 05/09/2011, o PPP de fls. 80/81 dá conta de que o postulante
exerceu a função de impressor, junto à Gráfica Kamelia Ltda. Me., com exposição à tintas e
solventes, sem o uso de EPI eficaz, o que permite o enquadramento nos itens 1.2.11 do
Decreto nº 53.831/64; 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79; 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97; e 2.0.1 do
Decreto nº 3.048/99, conforme já elucidado anteriormente nesta decisão.
27 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, enquadrados como
especiais os períodos de 01/02/1976 a 25/02/1980, 01/04/1980 a 31/10/1987, 01/12/1987 a
22/04/1991, 01/06/1999 a 05/11/2002, 02/01/2003 a 08/10/2004 e de 01/10/2005 a 05/09/2011.
28 - Somando-se o labor especial reconhecido nesta demanda aos períodos constantes da
CTPS de fls. 44/69, extratos do CNIS de fl. 123 e Resumo de Documentos para Cálculo de
Tempo de Contribuição de fls. 108/110, verifica-se que o autor contava com 43 anos, 05 meses
e 22 dias de contribuição na data do requerimento administrativo (25/04/2012 - fl. 83), o que lhe
assegura o direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição.
29 - O requisito carência restou também completado.
30 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo
(25/04/2012 - fl. 83).
31 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
32 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
33 - Pedido de reconhecimento de especialidade do labor desempenhado junto à Prefeitura
Municipal de Assis julgado extinto sem análise do mérito, ante a ilegitimidade passiva do INSS.
Apelação da parte autora conhecida parcialmente e, na parte conhecida, matéria preliminar
rejeitada e parcialmente provida. Apelação do INSS e remessa necessária parcialmente
providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar extinto o feito, sem
análise do mérito, quanto ao pedido de reconhecimento do labor especial desempenhado junto
à Prefeitura Municipal de Assis no interregno de 14/03/1996 a 27/01/1997, não conhecer de
parte da apelação do autor, e na parte conhecida, rejeitar a matéria preliminar e dar-lhe parcial
provimento, para reconhecer a especialidade do labor desempenhado de 01/06/1999 a
05/11/2002, bem como dar parcial provimento ao apelo do INSS para excluir da contagem de
tempo de serviço do requerente o labor desempenhado junto ao referido ente federativo e à
remessa necessária, tida por interposta, em maior extensão, também para determinar que a
correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, que os juros
de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o
mesmo Manual, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
