Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1844575 / SP
0009267-93.2013.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
26/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/09/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. NÃO CONHECIMENTO DE
PEDIDO QUE NÃO CONSTOU NA INICIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA.
ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL. LIMITAÇÃO ATÉ 28/04/1995. CONJUNTO
PROBATÓRIO SUFICIENTE. RECONHECIMENTO PARCIAL. BENEFÍCIO NÃO CONCEDIDO.
EC Nº 20/1998. NÃO CUMPRIMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. APELAÇÃO
PARCIALMENTE CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Não conhecido o pedido de aposentadoria especial, tendo em vista que, nos termos do que
constou da exordial, a demanda tem por objeto a concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição.
2 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
3 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
4 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
5 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
6 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na
legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo
comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um
comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser
desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do
sistema.
7 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até
a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
8 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
9 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
10 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
11 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
12 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
13 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
14 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
15 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
16 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
17 - Quanto ao período laborado na "Prefeitura Municipal de Porto Ferreira" de 16/03/1987 a
20/03/1990, consoante anotação na CTPS apresentada à fl. 22 dos autos, o autor
desempenhou a função de motorista, oportunidade em que operava "todos os tipos de veículos
automotores (automóveis, caminhões, ônibus", consoante restou esclarecido pela própria
empregadora por meio do documento de fl. 166.
18 - Com relação aos interregnos trabalhados na empresa "Turismo Saeletur Ltda." (Transporto
- Transporte Coletivos Porto Ferreira Ltda.) de 01/07/1990 a 15/12/1990 e de 01/03/1991 a
março de 1997, a CTPS de fl. 21 e o Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 23/25 indicam
que o requerente estava empregado em empresa de transportes rodoviário de passageiros, na
condição de motorista de ônibus.
19 - Desta feita, tanto no período trabalhado na Prefeitura de Porto Ferreira como na empresa
de turismo, os aludidos documentos reunidos nos autos são suficientes para o enquadramento
no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 ("motorneiros e condutores de
bondes"; "motorista e cobradores de ônibus"; e "motoristas e ajudantes de caminhão") e no
Código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79 ("motorista de ônibus e de caminhões de
cargas").
20 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador.
21 - Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de
habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como
especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação
anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA
TURMA, DJe de 15/04/2013).
22 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, enquadrados como
especiais os períodos de 16/03/1987 a 20/03/1990, 01/07/1990 a 15/12/1990 e de 01/03/1991 a
28/04/1995, data limite para a admissão da especialidade em razão da categoria profissional.
23 - Somando-se o tempo especial reconhecido nesta demanda, convertido em tempo comum,
aos períodos constantes na CTPS e no CNIS trazidos a juízo, verifica-se que o autor alcançou
33 anos, 5 meses e 20 dias de serviço na data do ajuizamento (15/12/2010), no entanto, à
época não havia completado o requisito etário (53 anos) para fazer jus à aposentadoria
proporcional por tempo de contribuição, conforme disposição do art. 9º, §1º, da Emenda
Constitucional nº 20/98.
24 - Sagrou-se vitorioso o autor ao ver reconhecida parte da especialidade vindicada. Por outro
lado, não foi concedida a aposentadoria, restando vencedora nesse ponto a autarquia. Desta
feita, honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca
(art. 21 do CPC/73), e sem condenação de qualquer delas no reembolso das custas e despesas
processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS delas isento.
25 - Apelação da parte autora parcialmente conhecida e parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer em parte do
recurso de apelação da parte autora, e na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, para
reconhecer a especialidade no período de 16/03/1987 a 20/03/1990, 01/07/1990 a 15/12/1990 e
de 01/03/1991 a 28/04/1995, dando os honorários advocatícios por compensados entre as
partes, ante a sucumbência recíproca, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
