Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2023598 / SP
0002781-97.2011.4.03.6140
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
23/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ART. 52 E SEGUINTES DA LEI Nº 8.213/91. REMESSA NECESSÁRIA TIDA
POR INTERPOSTA. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. CONJUNTO PROBATÓRIO
PARCIALMENTE SUFICIENTE. RECONHECIMENTO. TEMPO SUFICIENTE PARA A
CONCESSÃO DE APOSENTADORIA INTEGRAL POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TERMO
INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE
PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDAS.
1 - No caso, o INSS foi condenado a reconhecer períodos laborados sob condições especiais.
Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e
sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula
490 do STJ.
2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
3 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
4 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese
da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a
harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial,
o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de
conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
7 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até
a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
8 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
9 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
10 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
11 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
12 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
13 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
14 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
15 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
16 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
17 - A r. sentença monocrática reconheceu o labor especial do autor no interregno de
01/12/1978 a 01/08/1991, bem como ele requer o reconhecimento da especialidade do trabalho
desempenhado de 07/10/1977 a 16/12/1977, 06/01/1978 a 21/11/1978 e de 20/01/1993 até a
data de entrada do requerimento administrativo. Quanto aos períodos de 07/10/1977 a
16/12/1977, 06/01/1978 a 21/11/1978, laborados junto à Berma Engenharia e Comércio Ltda. e
Sbil Segurança Bancária e Industrial, inviável o reconhecimento pretendido, uma vez que não
há nos autos qualquer documento que demonstre a sua ocupação nas referidas empresas e,
tampouco, que estivesse exposto a qualquer agente nocivo no exercício de seu labor.
18 - No tocante ao interregno de 01/12/1978 a 01/08/1991, o formulário de fl. 133, o laudo
técnico pericial de fls. 134 e o PPP de fls. 14/15 informam que o postulante trabalhou como
ajudante geral junto à União dos Refinadores de Açúcar e Café, exposto a ruído de 91,5dB, o
que permite a conversão por ele pretendida.
19 - No que se refere ao lapso de 20/01/1993 a 07/05/2007, o PPP de fls. 16/17 informa que o
autor desempenhou a função de varredor junto à Trasbraçal - Prest. Serv. Ind. Com. Ltda.
sujeito a pressão sonora de 74,6dB a 84,8dB, o que permite o reconhecimento como especial
até a data de 05/03/1997, quando passou a ser necessária à exposição a ruído acima de 90dB
para caracterização do labor como especial até 18/11/2003 e, a partir de então, superiores à
85dB.
20 - Ao revisitar os julgados sobre o tema, percebe-se nova reflexão jurisprudencial para admitir
a possibilidade de se considerar, como especial, o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído
em sua maior intensidade, na medida em que esta acaba por mascarar a de menor intensidade,
militando em favor do segurado a presunção de que uma maior pressão sonora prevalecia
sobre as demais existentes no mesmo setor.
21 - Não merece prosperar o pleito de enquadramento do lapso de 20/01/1993 a 07/05/2007,
mediante a apresentação do PPP de fl. 192, anexado aos autos após a prolação da sentença,
primeiro pela impossibilidade de modificação do objeto da demanda por meio da inovação
recursal, segundo por não restar demonstrada qualquer justificativa à juntada tardia dos
referidos documentos, de modo que se infere que o demandante, em verdade, busca suprir
deficiência do conjunto probatório, inadmissível no momento processual em que ventilada a
apreciação da prova; e terceiro porque os referidos PPP traz índices de medições diversos
daqueles apresentados no documento anterior de fl. 16/17, o que, por si só, é suficiente para
infirmá-lo.
22 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de
01/12/1978 a 01/08/1991 e de 20/01/1993 a 05/03/1997.
23 - Conforme tabela anexa, o cômputo de todos os períodos reconhecidos como especiais na
presente demanda com os períodos constantes em CTPS de fls. 10/13, do Resumo de
Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição de fls. 9 e dos extratos do CNIS de fls.
153/157, até a data do requerimento administrativo (07/05/2007 - fl. 09), o autor alcança 41
anos, 04 meses e 10 dias de labor, fazendo jus o autor à aposentadoria integral por tempo de
serviço.
24 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo
(07/05/2007 - fl. 09).
25 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
26 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
27 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
28 - Apelação do INSS e remessa necessária, tida por interposta, desprovidas. Apelação da
parte autora parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação da parte autora, para reconhecer como especial o período de 20/01/1993 a
05/03/1997 e para condenar o INSS na implantação do benefício de aposentadoria integral por
tempo de contribuição, a partir de 07/05/2007 (data do requerimento administrativo), sendo que
sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09,
a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a
expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, bem como fixar a verba
honorária em 10% das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença e negar
provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, mantida, no mais,
a r. sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
