
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006290-55.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO HERNANDEZ
Advogado do(a) APELADO: JULIANO SARTORI - SP243509-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006290-55.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO HERNANDEZ
Advogado do(a) APELADO: JULIANO SARTORI - SP243509-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS e por ANTONIO HERNANDEZ, em ação previdenciária ajuizada por este, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença (ID 97552184 - Págs. 48/50) julgou procedente o pedido, para reconhecer o labor rural de 27/12/1968 a 30/05/1974 e 01/01/1975 a 28/03/2016. Condenou o INSS em honorários advocatícios, fixados em 10% do valor da condenação.
Em razões recursais (ID 97552184 - Págs. 56/59), a parte autora requer o deferimento da aposentadoria por tempo de contribuição.
O INSS, em sede recursal (ID 97552184 - Págs. 67/80), suscita, inicialmente, a prescrição e, no mérito, argumenta não comprovado o trabalho rural nos interregnos admitidos. Subsidiariamente, defende que o período não poderia ser computado para fins de carência. Por fim, requer que o termo inicial do benefício seja fixado na data da audiência de instrução e se insurge contra os parâmetros para liquidação fixados.
Devidamente processados os recursos, com contrarrazões da parte autora, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006290-55.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO HERNANDEZ
Advogado do(a) APELADO: JULIANO SARTORI - SP243509-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS. 1. (...). 3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento.(...)" (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº 0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/12/2015 - grifos nossos).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória. (...)" (AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP
, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(omissis)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS PARA SANAR OMISSÃO SEM EFEITO MODIFICATIVO.
(...)
2. No presente caso, impõe-se sanar omissão para asseverar que a jurisprudência do STJ possui entendimento no sentido de que é dispensável o recolhimento de contribuições previdenciárias, para fins de reconhecimento de tempo de serviço rural, quanto ao labor exercido antes da Lei 8.213/1991
.(...)" (EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 05/11/2015)."AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 485, V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 55, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. OCORRÊNCIA. SEGURADA VINCULADA AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL-RGPS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. APOSENTADORIA. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. ANTES DA VIGÊNCIA DA REFERIDA LEI. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A autora sempre esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social.
2. Não é exigível o recolhimento das contribuições previdenciárias, relativas ao tempo de serviço prestado como trabalhador rural, antes da vigência da Lei n 8.213/91, para fins de aposentadoria urbana pelo Regime Geral de Previdência Social. Precedentes da Terceira Seção.
Ação rescisória procedente" (AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015, DJe 04/12/2015 - grifos nossos).
"APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR A PROVA DOCUMENTAL.
1. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de vigência da Lei n.º 8.213/1991, é de ser computado e averbado, independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, mas não se presta para efeito de carência.(...)
" (AC nº 0029462-51.2003.4.03.9999, 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/12/2015).Contudo, o tempo de serviço do trabalhador rural poderá ser computado, independentemente do recolhimento de contribuição, exceto para fins de carência, até o dia 31/10/1991, conforme o disposto no art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99,
in verbis
:"Art. 60. Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição, entre outros:
(...)
X - o tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior à competência novembro de 1991;"
Do caso concreto.
Controvertido na demanda o trabalho rural nos intervalos de 27/12/1968 a 30/05/1974 e 01/01/1975 a 28/03/2016.
As provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo, são: certidão de nascimento do autor (ID 97552182 - Pág. 14); CTPS do requerente apenas com o vínculo de "serralheiro" em 1974 (ID 97552182 - Págs. 16/17); escritura pública, lavrada em 1994, de doação com reserva de usufruto do imóvel rural denominado "Chácara Panderossa", de um imóvel urbano e de uma área de terras designada como "Gleba E-3", localizada da "Fazenda Santa Margarida", em favor do autor e na qual ele é qualificado como lavrador, e ITBI relativo (ID 97552182 - Págs. 18/28); declaração para cadastro de imóvel rural, datada de 1972, em que o pai do requerente é identificado como "agricultor" (ID 97552182 - Págs. 29/34); notas de controle de entrada de mercadoria (1209 caixas de laranja rio) vendida pelo genitor do requerente à "Citrosantos Ltda", emitidas em 27/08/1991 e 28/08/1991 (ID 97552182 - Págs. 35/38); escritura de venda e compra do imóvel rural denominado "Chácara Ponderossa", a qual passou a denominar-se "Chácara Santa Cruz", datada de 2005, na qual o autor (comprador) é qualificado como lavrador (ID 97552182 - Págs. 39/43); certificado de cadastro de imóvel rural referente à "Chácara Ponderossa" emitido nos exercícios de 2010 a 2014 (ID 97552182 - Pág. 44); Darf emitida no nome do autor, referente à "Chácara Santa Cruz", datada de 2015 (ID 97552182 - Pág. 45); recibo de entrega de declaração de ITR do exercício 2015, referente à "Chácara Santa Cruz" (ID 97552182 - Págs. 46/50).
A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material. Passo à análise da prova oral.
A testemunha Sr. Carlos disse que conhece o autor desde a infância, pois são vizinhos de sítio. Esclareceu que o requerente divide uma propriedade de cerca de 2-3 alqueires com quatro pessoas de sua família. Informou que o postulante possui outro imóvel, uma chácara, também próxima à propriedade do depoente, onde planta milho, “tem alguns animais, vaca, bezerro”, sem o auxílio de empregados, possuindo apenas um trator e uma carreta como maquinários.
A testemunha Sr. Elias disse que conhece o autor há 50 anos, mais ou menos, porque são vizinhos. Declarou que o requerente tem uma chácara, onde “tem umas 2 vaquinhas, planta uns pezinhos de milho, coisinha pouca, sem empregados”. Relatou que a propriedade pertencia ao pai do autor e que foi partilhada quando este faleceu.
Após o vínculo do autor como serralheiro, de 01/06/1974 a 30/11/1974 (ID 97552182 - Págs. 16/17), não há evidências de que o requerente tenha retornado às lides campesinas em regime de economia familiar até 31/10/1991. Ao contrário, as notas de controle de entrada de mercadoria vendidas pelo pai do postulante, emitidas pela empresa “Citrosantos Ltda” em agosto de 1991, dão conta do fornecimento de 1209 caixas de laranja em apenas dois dias do mês.
Desta forma, embora haja indicativo de exercício da atividade rural pela família do autor no lapso de 01/01/1975 a 31/10/1991, não o fazia na forma de agricultura de subsistência, indispensável à sobrevivência, sustento próprio e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar, mas, sim, de forma lucrativa e organizada como verdadeiro empreendimento rural.
Não se está a dizer que o pequeno produtor rural, qualificado como segurado especial, não possa comercializar, inclusive de forma lucrativa, o excedente da produção agropecuária ou extrativista realizada para subsistência do grupo, em regime de economia familiar. O que se pretende diferenciar é o segurado especial daquele produtor rural cuja produção, agropecuária ou extrativista, é organizada e voltada quase que exclusivamente ao comércio e/ou indústria, desvinculando-se daquele regime direcionado à sobrevivência do grupo familiar.
Dada a riqueza de fundamentação, destaco trecho do voto proferido pelo Ministro Og Fernandes no julgamento da Ação Rescisória n.º 1411, cuja ementa consta acima transcrita:
"[...] entende-se como regime de economia familiar, ex vi do art. 12, inc. VII, § 1.º, da Lei n.º 8.212/91, a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, na medida em que o trabalho desenvolvido pelos próprios familiares verte em prol da sobrevivência do núcleo familiar
Também a respeito do tema, o autor Roberto Gil Leal Faria (in: Aposentadoria Rural por Idade), ao discorrer sobre a extensão do conceito de regime de economia familiar, asseverou que: "Dentro dessa realidade, cria-se uma relação simbiótica entre os membros do núcleo familiar, de tal forma que as atividades de um são essenciais às dos outros, e todos, em conjunto, sobrevivem. Essa é a idéia de 'mútua dependência e colaboração' mencionada no texto legal" .
Para o autor Dárcio Guimarães de Andrade, "O trabalho em regime de economia familiar é, portanto, a atividade doméstica de pequeno porte, que se restringe à economia de consumo de uma comunidade familiar
, onde os membros de uma família laboram, sem vínculo empregatício, agindo com espírito comunitário, visando a garantir a subsistência do grupo".É de se observar, outrossim, que esta Terceira Seção já assentou idêntico ponto de vista, a exemplo das decisões proferidas no Recurso Especial n.º 819.002/MG, com relatoria do Ministro Nilson Naves (DJ 28.03.06), nos Embargos de Divergência n.º 246.844/RS, de que Relator o Ministro Gilson Dipp (DJ 08.06.05), assim também no Recurso Especial n.º 412.187, da relatoria da Ministra Laurita Vaz (DJ 13.12.04).
Nessa mesma esteira, é válido afirmar que a produção agrícola, a depender de determinados aspectos, poderá, sim, descaracterizar o conceito de "regime de economia familiar", parecendo certo, também, que, em se constatando produção razoável, que se demonstre incompatível com o regime familiar (caracterizado, registre-se, por culturas de subsistência), não há que se falar no direito à aposentadoria por idade do trabalhador rural.
Neste particular, trago, novamente, o posicionamento do autor Roberto Gil Leal Faria, para quem é: "(...) é importante destacar que o regime de economia familiar apto a caracterizar o trabalhador do campo como 'segurado especial' deve se diferenciar do conceito de empresa (...) Creio, portanto, que a pedra de toque entre a atividade 'em regime de economia familiar' e a atividade 'empresarial' está na organização da produção e na expectativa de terceiros em face de tal organização".
No caso dos autos, como bem asseverou a em. Relatora, as provas documentais fornecidas pela autora indicam que as atividades econômicas desempenhadas pelo seu cônjuge eram organizadas e habituais [...]
Merece ainda ser registrado que dos autos consta prova documental segundo a qual o cônjuge da autora, em um só negócio, transacionou 3.885 kg de caroços de algodão, assim também, em duas oportunidades, 275 (fl. 51) e 270 (fl. 53) sacos do mesmo produto
Por fim, o bloco de notas fiscais do produtor (fl. 56) também demonstra a forma organizada, expressiva e habitual dos negócios celebrados pelo referido produtor, sendo certo que, em diversas vendas realizadas, observa-se a expressiva quantidade de algodão comercializado
Registro, por necessário, que a dispensa de recolhimentos à Previdência para a obtenção do benefício em exame pressupõe as elevadas dificuldades enfrentadas pelo trabalhador rural em garantir a sua própria subsistência e a de sua família, não se demonstrando, pois, compatível com o desempenho de reiteradas atividades econômicas
A necessidade de comprovação da atividade agrícola, extrativista e/ou pecuária indispensável e voltada à subsistência do grupo familiar, para caraterização do pequeno produtor rural como segurado especial, se encontra entalhada em diversos precedentes desta Corte, dentre os quais colaciono:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL NA CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. NÃO COMPROVAÇÃO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. INVIABILIDADE. JULGAMENTO ULTRA PETITA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. [...] IV - No caso, alega-se o exercício de atividade rural em regime de economia familiar, no qual o trabalho é exercido pelos membros da família, em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados, tido como indispensável à própria subsistência, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei nº 8.213/91, sendo tal conceito já esboçado no art. 160 do Estatuto do Trabalhador Rural (Lei nº 4.214, de 02 de março de 1963) Conquanto admita-se a prova produzida por meio de documento expedido em nome do pai do interessado, para fins de demonstração de sua condição de segurado especial, os elementos presentes no procedimento administrativo não são suficientes para informar sobre a natureza do trabalho realizado, vale dizer, se com ou sem o concurso de empregados, o que é essencial para afirmar a existência do regime de economia familiar Note-se que, ao contrário, os documentos em comento tendem a indicar que a atividade desenvolvida na área rural pelo pai do apelado não detinha o mero caráter de indispensabilidade para a subsistência da família relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, DJ 20.10.2005
Ainda, digno de ênfase a impossibilidade de reconhecimento do tempo de serviço sem o devido recolhimento da contribuição previdenciária após 31/10/1991.
Desta forma, a prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino apenas durante o interregno de 27/12/1968 a 30/05/1974.
Quanto ao tempo que o autor verteu aportes como contribuinte individual, observa-se que nem todas as contribuições quitadas foram contabilizadas pela autarquia previdenciária no resumo de documentos (ID 97552184 - Pág. 19). Diante disso, devem ser computados, além daqueles já registrado pelo INSS, os seguintes lapsos: 06/2003, 05/2007, 03/2008, 05 a 09/2008, 11/2010 a 10/2011, 12/2011 a 04/2012, 06/2012 a 07/2015, 09/2015 e 10/2015.
Por fim e ao cabo, vale notar que o intervalo ora reconhecido não pode ser computado para fins de carência e, conforme planilha anexa, o postulante verteu 13 anos e 8 meses de contribuição até a data do requerimento administrativo (11/12/2015 – ID 97552184 - Pág. 29), tempo insuficiente para o preenchimento da carência exigida. Assim sendo, inviável a concessão do benefício vindicado, tal como requerido pela parte autora em seu apelo.
Nos termos dos artigos 85, §§2º e 3º, e 86, ambos do Código de Processo Civil, os honorários advocatícios, (ora) arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, serão distribuídos entre as partes sucumbentes, na seguinte proporção: 60% em favor do patrono da autarquia e 40% em favor do patrono da parte autora.
Em relação à parte autora, havendo a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no §3º do art. 98 do CPC, ficará a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que a fundamentou.
Ante o exposto,
nego provimento à apelação da parte autora e dou parcial provimento à apelação do INSS,
para expurgar do tempo de contribuição os períodos de 01/01/1975 a 31/03/2002, 01/11/2004 a 30/11/2004, 01/04/2008 a 30/04/2008 e 01/10/2010 a 31/10/2010, 01/05/2012 a 31/05/2012, 01/08/2015 a 31/08/2015 e 01/11/2015 a 28/03/2016, assim como distribuir os honorários advocatícios na forma da fundamentação, mantendo, no mais, a r. sentença prolatada em primeiro grau de jurisdição.É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. INÍCIO DE PROVA DOCUMENTAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. RECONHECIMENTO PARCIAL. LIMITAÇÃO AO PERÍODO ANTERIOR A NOVEMBRO DE 1991. CONTRIBUIÇÕES INDIVIDUAIS. QUITAÇÃO. CARÊNCIA NÃO PREENCHIDA. APOSENTADORA NÃO CONCEDIDA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA.
1 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
2 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
3 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
4 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
5 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91.
6 - Controvertido na demanda o trabalho rural nos intervalos de 27/12/1968 a 30/05/1974 e 01/01/1975 a 28/03/2016.
7 - As provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo, são: certidão de nascimento do autor (ID 97552182 - Pág. 14); CTPS do requerente apenas com o vínculo de "serralheiro" em 1974 (ID 97552182 - Págs. 16/17); escritura pública, lavrada em 1994, de doação com reserva de usufruto do imóvel rural denominado "Chácara Panderossa", de um imóvel urbano e de uma área de terras designada como "Gleba E-3", localizada da "Fazenda Santa Margarida", em favor do autor e na qual ele é qualificado como lavrador, e ITBI relativo (ID 97552182 - Págs. 18/28); declaração para cadastro de imóvel rural, datada de 1972, em que o pai do requerente é identificado como "agricultor" (ID 97552182 - Págs. 29/34); notas de controle de entrada de mercadoria (1209 caixas de laranja rio) vendida pelo genitor do requerente à "Citrosantos Ltda", emitidas em 27/08/1991 e 28/08/1991 (ID 97552182 - Págs. 35/38); escritura de venda e compra do imóvel rural denominado "Chácara Ponderossa", a qual passou a denominar-se "Chácara Santa Cruz", datada de 2005, na qual o autor (comprador) é qualificado como lavrador (ID 97552182 - Págs. 39/43); certificado de cadastro de imóvel rural referente à "Chácara Ponderossa" emitido nos exercícios de 2010 a 2014 (ID 97552182 - Pág. 44); Darf emitida no nome do autor, referente à "Chácara Santa Cruz", datada de 2015 (ID 97552182 - Pág. 45); recibo de entrega de declaração de ITR do exercício 2015, referente à "Chácara Santa Cruz" (ID 97552182 - Págs. 46/50). A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
8 - Após o vínculo do autor como serralheiro, de 01/06/1974 a 30/11/1974 (ID 97552182 - Págs. 16/17), não há evidências de que o requerente tenha retornado o labor em regime de economia familiar até 31/10/1991. Ao contrário, as notas de controle de entrada de mercadoria vendidas pelo pai do postulante, emitidas pela empresa “Citrosantos Ltda” em agosto de 1991, dão conta do fornecimento de 1209 caixas de laranja em apenas dois dias do mês.
9 - Desta forma, embora haja indicativo de exercício da atividade rural pela família do autor no lapso de 01/01/1975 a 31/10/1991, não o fazia na forma de agricultura de subsistência, indispensável à sobrevivência, sustento próprio e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar, mas, sim, de forma lucrativa e organizada como verdadeiro empreendimento rural.
10 - Não se está a dizer que o pequeno produtor rural, qualificado como segurado especial, não possa comercializar, inclusive de forma lucrativa, o excedente da produção agropecuária ou extrativista realizada para subsistência do grupo, em regime de economia familiar. O que se pretende diferenciar é o segurado especial daquele produtor rural cuja produção, agropecuária ou extrativista, é organizada e voltada quase que exclusivamente ao comércio e/ou indústria, desvinculando-se daquele regime direcionado à sobrevivência do grupo familiar.
11 - Ainda, digno de ênfase a impossibilidade de reconhecimento do tempo de serviço sem o devido recolhimento da contribuição previdenciária após 31/10/1991.
12 - Desta forma, a prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino apenas durante o interregno de 27/12/1968 a 30/05/1974.
13 - Quanto ao tempo que o autor verteu aportes como contribuinte individual, observa-se que nem todas as contribuições quitadas foram contabilizadas pela autarquia previdenciária no resumo de documentos (ID 97552184 - Pág. 19). Diante disso, devem ser computados, além daqueles já registrado pelo INSS, os seguintes lapsos: 06/2003, 05/2007, 03/2008, 05 a 09/2008, 11/2010 a 10/2011, 12/2011 a 04/2012, 06/2012 a 07/2015, 09/2015 e 10/2015.
14 - Por fim e ao cabo, vale notar que o intervalo ora reconhecido não pode ser computado para fins de carência e, conforme planilha anexa, o postulante verteu 13 anos e 8 meses de contribuição até a data do requerimento administrativo (11/12/2015 – ID 97552184 - Pág. 29), tempo insuficiente para o preenchimento da carência exigida. Assim sendo, inviável a concessão do benefício vindicado, tal como requerido pela parte autora em seu apelo.
15 - Honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa e distribuídos proporcionalmente entre as partes sucumbentes, nos termos dos artigos 85, §§2º e 3º, e 86, ambos do Código de Processo Civil.
16 - Apelação do INSS parcialmente provida. Apelação da parte autora desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora e dar parcial provimento à apelação do INSS, para expurgar do tempo de contribuição os períodos de 01/01/1975 a 31/03/2002, 01/11/2004 a 30/11/2004, 01/04/2008 a 30/04/2008 e 01/10/2010 a 31/10/2010, 01/05/2012 a 31/05/2012, 01/08/2015 a 31/08/2015 e 01/11/2015 a 28/03/2016, assim como distribuir os honorários advocatícios na forma da fundamentação, mantendo, no mais, a r. sentença prolatada em primeiro grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
