Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1892707 / SP
0007512-12.2008.4.03.6183
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/05/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL.
ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. PPP. RECONHECIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO
SUFICIENTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO. TERMO INICIAL. REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA E REMESSA NECESSÁRIA
PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Pretende a parte autora a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição, mediante o reconhecimento do labor rural e especial.
2 - Do labor rural. O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo
de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo
admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C.
Superior Tribunal de Justiça.
3 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça.
4 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
5 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais.
6 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação
do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar
apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as
Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
7 - Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o
desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos
genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando,
se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em
que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
8 - Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os
auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer
plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma
atividade tão desgastante.
9 - À exceção das certidões de nascimento dos filhos e dos documentos oriundos do Sindicato
dos Trabalhadores Rurais, a documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início
de prova material. Ademais, foi corroborada por idônea e segura prova testemunhal (fls.
236/237 e mídia de fl. 293), colhida em audiências realizadas em 22 de fevereiro de 2011 (fl.
235) e em 1º de março de 2011 (fl. 291).
10 - Desta feita, possível o reconhecimento do labor rural de 02/01/1968 a 30/12/1979.
11 - Da atividade especial. O pedido formulado pela parte autora, consubstanciado na
conversão do benefício, encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim,
devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio,
desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
12 - Da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91,
conclui-se que permanece a possibilidade da conversão do tempo especial em comum,
independentemente da data do exercício da atividade especial.
13 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
14 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
15 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
16 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
17 - Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes
físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria
especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos
enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
18 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
19 - A permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a
jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
20 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
21 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
22 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
23 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
24 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
25 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
26 - Para comprovar a especialidade nos períodos de 28/01/1980 a 02/04/1989 e de 24/04/1989
a 23/04/1999 (data do laudo), laborados na empresa "Nestlé Brasil Ltda;", anexou o autor
Formulário de Informações sobre as Atividades exercidas em Condições Especiais (fl. 57) e
laudo técnico (fls. 58/65), do qual se extrai que exerceu, respectivamente, as funções de
"auxiliar geral" e de "líder fabr. gibi vacuísta", estando submetido a nível de ruído acima de 84
dB e de 93 dB, nível superior ao previsto pela legislação.
27 - Enquadrados como especiais os períodos de 28/01/1980 a 02/04/1989 e de 24/04/1989 a
23/04/1999.
28 - Conforme planilha anexa, somando-se o labor rural e as atividades especiais reconhecidas
nesta demanda, aos demais períodos incontroversos constantes da CTPS de fls. 68/99, das
contribuições recolhidas (fls. 100/105) e do CNIS de fls. 67, verifica-se que a parte autora
alcançou 39 anos, 06 meses e 27 dias de serviço na data do requerimento administrativo
(20/07/2001 - fl. 37), o que lhe assegura o direito à aposentadoria integral por tempo de
contribuição.
29 - O termo inicial do benefício deve ser estabelecido na data do requerimento administrativo
(20/07/2001 - fl. 37).
30 - A correção monetária dos valores em atraso, respeitada a prescrição quinquenal, deverá
ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal vigente quando da elaboração da conta, aplicando-se o IPCA-E nos moldes do
julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº
870.947/SE), com efeitos prospectivos.
31 - Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por
refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
32 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser mantida ao percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da
condenação, incidindo sobre as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença,
consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
33 - Apelação do INSS desprovida e remessa necessária parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação do INSS e dar parcial provimento à remessa necessária, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-149
***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-11 INC-7 ART-55 PAR-3 ART-57 PAR-4 PAR-5
***** CF-1967 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1967
LEG-FED ANO-1967
LEG-FED LEI-9711 ANO-1998 ART-28
LEG-FED LEI-9032 ANO-1995
LEG-FED DEC-53831 ANO-1964
LEG-FED DEC-611 ANO-1992 ART-292
***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979
***** RPS-99 REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ART-70
LEG-FED LEI-9528 ANO-1997
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-111
Veja
STF RE 870.947/SE REPERCUSSÃO GERAL TEMA 810.
