Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1946782 / SP
0002183-02.2012.4.03.6111
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
24/06/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/07/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL REGISTRADO EM CTPS. CÔMPUTO PARA FINS DE
CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. RECONHECIMENTO
PARCIAL. PROVA EMPRESTADA REJEITADA. PROVA PERICIAL. PRECLUSÃO. TEMPO
INSUFICIENTE PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº
20/98. APOSENTADORIA PROPORCIONAL. REGRAS DE TRANSIÇÃO. REQUISITOS
CUMPRIDOS DE FORMA CUMULATIVA E A QUALQUER TEMPO. DESCUMPRIMENTO DAS
EXIGÊNCIAS REFERENTES A IDADE MÍNIMA E TEMPO ADICIONAL. BENEFÍCIO
INDEFERIDO. AVERBAÇÃO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. REMESSA
NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - No caso, a r. sentença condenou o INSS a reconhecer e averbar, em favor da parte autora,
tempo de serviço rural registrado em CTPS, bem como tempo de serviço exercido em
condições especiais. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos
termos do inciso I, do artigo 475 do CPC/75 e da Súmula 490 do STJ.
2 - Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
com reconhecimento e cômputo de labor rural registrado em CTPS (01/01/1984 a 30/03/1985) e
de trabalho desempenhado sob condições especiais nos períodos de 01/01/1984 a 30/03/1985
e de 15/09/1986 a 28/02/2012.
3 - Embora tenha o autor trabalhado como rurícola no interregno de 01/01/1984 a 30/03/1985,
seu vínculo foi formalmente registrado em CTPS, cingindo-se a controvérsia na possibilidade de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
aproveitamento, para efeito de carência, do contrato de trabalho firmado anteriormente à edição
da Lei de Benefícios (Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991).
4 - Nesse sentido, firmou-se o entendimento no sentido da possibilidade de se computar, para
todos os fins - carência e tempo de serviço - a atividade rural devidamente registrada em
Carteira de Trabalho. Julgado proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso
representativo de controvérsia repetitiva.
5 - Dessa forma, não há qualquer reparo a ser feito na r. sentença que determinou o cômputo
do período em questão (01/01/1984 a 30/03/1985) "inclusive para efeito de carência".
6 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
7 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. Precedente do STJ.
8 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
9 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
10 - Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela
categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer
modalidade de prova.
11 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
12 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
13 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
14 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
15 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
16 - Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma
extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o
passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas.
Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado
pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
17 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
18 - Tendo em vista a devolutividade da matéria a este E. Tribunal (balizada pelos temas que
foram ventilados pelo autor e pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em seus apelos),
resta incontroverso o período de 01/01/1984 a 30/03/1985, no qual a parte autora pugnava pelo
assentamento da especialidade do labor e foi refutado pelo Digno Juiz de 1º grau, devendo,
portanto, ser computado como tempo de serviço comum.
19 - Quanto ao período de 15/09/1986 a 28/02/2012, laborado na empresa "Sasazaki - Indústria
e Comércio Ltda", o autor coligiu aos autos os formulários DIRBEN 8030, o Perfil
Profissiográfico Previdenciário - PPP e os Laudos Técnicos, os quais revelam a submissão ao
agente agressivo ruído nas seguintes intensidades: 1) 80 a 83 dB(A), no período de 15/09/1986
a 31/12/1992, ao exercer a função de "Auxiliar Geral/Operador de Produção"; 2) 83 a 91dB(A),
no período de 01/01/1993 a 31/10/1995, ao exercer a função de "Operador de Produção"; 3)
88,2 dB(A), no período de 01/11/1995 a 30/09/1996, ao exercer a função de "Operador de
Produção"; 4) 89,4 dB(A), no período de 01/10/1996 a 31/12/2003, ao exercer a função de
"Preparador de Máquinas de Produção"; 5) 91,1 dB(A), no período de 01/01/2004 a 31/12/2005,
ao exercer a função de "Preparador Maq. Prod."; 6) 88,3 dB(A), no período de 01/01/2006 a
31/12/2008, ao exercer a função de "Preparador Maq. Prod."; 7) 87,6 dB(A), no período de
01/01/2009 a 28/02/2012, ao exercer as funções de "Preparador Maq. Prod." e "Op.
Maq./Montador Esquadrias".
20 - Enquadrados como especiais os períodos de 15/09/1986 a 05/03/1997 e 01/01/2004 a
28/02/2012, eis que laborados com sujeição a nível de pressão sonora superior ao limite de
tolerância vigente à época da prestação dos serviços, cabendo ressaltar que os formulários
apresentados foram devidamente corroborados pelos Laudos Técnicos e PPP já citados.
21 - Por sua vez, no que diz respeito aos lapsos de 06/03/1997 a 18/11/2003 e de 19/11/2003 a
31/12/2003, mostra-se inviável o reconhecimento pretendido, eis que não se enquadram nas
exigências legais acima mencionadas (ruído abaixo do limite legal no tocante no intervalo de
06/03/1997 a 18/11/2003 e ausência de documento comprobatório hábil para o intervalo entre
19/11/2003 e 31/12/2003, uma vez que os Laudos Técnicos foram elaborados em 16/05/1986 e
09/09/1999, respectivamente, e o PPP refere-se a período de trabalho com início em
01/01/2004).
22 - Não serão considerados os documentos apresentados - laudo técnico pericial e processo
judicial com reconhecimento de atividade especial relativos a terceiros -, uma vez que os
documentos juntados de outra pessoa, como prova emprestada, servem apenas como início de
prova que precisa ser reforçada, o que não ocorreu na hipótese em tela, razão pela qual
conclui-se pela inexistência de provas do alegado labor especial nos períodos em referência.
Precedente.
23 - Ademais, de todo imprópria a juntada dos documentos nesta avançada fase processual, na
medida em que os mesmos não se destinam a fazer prova de fatos ocorridos depois dos
articulados, ou mesmo para contrapô-los aos que foram produzidos, a contento do disposto nos
artigos 396 e 397 e do CPC/73 (arts. 434 e 435 CPC).
24 - Por fim, não há que se falar em produção de prova pericial para comprovação da exposição
a agentes químicos, tal como pleiteia o autor em seu apelo. O d. Magistrado a quo indeferira a
realização da prova pericial, porquanto, em seu entender, "a realização de perícia em empresas
já encerradas ou quanto a vínculos que o(a) autor(a) não faz mais parte há mais tempo, torna-
se inviável, uma vez que as condições trabalhadas à época não serão as mesmas atualmente".
25 - Decerto que, contra decisão proferida no curso do feito, na égide do CPC/73, o recurso
cabível seria o de agravo - na forma retida ou por instrumento - sendo que, na situação
considerada, não houvera impugnação do autor no tocante a tal indeferimento, operando-se, a
toda evidência, a preclusão. Logo, defeso trazer-se à tona debate sobre o tema, em sede de
apelação.
26 - Com o advento da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, extinguiu-se
a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então,
assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema,
desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
27 - O atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a
qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da
alteração legislativa em comento.
28 - Somando-se a atividade rural e especial reconhecidas nesta demanda aos demais
períodos de atividade comum constantes da CTPS e do CNIS, verifica-se que, na data do
requerimento administrativo (28/02/2012), o autor perfazia 34 anos, 01 mês e 29 dias de
serviço, tempo insuficiente para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição,
mesmo que na modalidade proporcional com base nas regras transitórias estabelecidas pela
Emenda Constitucional nº 20/98, considerando o descumprimento das exigências referentes à
idade mínima e ao tempo adicional (pedágio).
29 - Da mesma forma, não prospera o pedido de concessão da aposentadoria especial, sendo
de rigor a manutenção da r. sentença nesse ponto.
30 - De outra parte, merece acolhimento o pedido do autor a fim de que a autarquia
previdenciária seja compelida a reconhecer o tempo de serviço rural registrado em CTPS
(01/01/1984 a 30/03/1985), inclusive para fins de carência, bem como o tempo de serviço
trabalhado em regime especial, sujeito a conversão em tempo comum, nos períodos de
15/09/1986 a 05/03/1997 e 01/01/2004 a 28/02/2012, em razão da atividade exercida sob o
agente agressivo ruído.
31 - Apelação da parte autora desprovida. Remessa necessária e apelação do INSS
parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação da parte autora, e dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, e
à apelação do INSS, para excluir da condenação o período de 19/11/2003 a 31/12/2003,
mantendo, no mais, íntegra, a r. sentença de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
