Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1719675 / SP
0006094-10.2006.4.03.6183
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. MOTORISTA. RUÍDO. PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO.
COMPROVAÇÃO DO LABOR SUBMETIDO A CONDIÇÕES ESPECIAIS. CONJUNTO
PROBATÓRIO SUFICIENTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO. TERMO INICIAL. DATA DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO.
EXECUÇÃO DO JULGADO SOMENTE SE A OPÇÃO FOR PELO BENEFÍCIO CONCEDIDO
EM JUÍZO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS CONHECIDA
EM PARTE E PARCIALMENTE PROVIDA E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE
PROVIDA.
1 - Pretende a parte autora a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição, mediante o reconhecimento da especialidade de labor.
2 - Cumpre destacar ter a r. sentença incorrido em erro material ao mencionar, no dispositivo,
que foi concedida "aposentadoria proporcional por tempo de contribuição", quando o correto, de
acordo com conteúdo da fundamentação e planilha encartada na r. sentença (fls. 260/264),
seria a concessão de "aposentadoria integral por tempo de contribuição".
3 - Apelação autárquica conhecida em parte, eis que a r. sentença já fixou os honorários
advocatícios em 10% sobre o valor da condenação, incidente até a data da sentença, e isentou-
a das custas processuais; razão pela qual inexiste interesse recursal nestes aspectos.
4 - Insta salientar que nesta fase processual a análise do pedido de suspensão da antecipação
da tutela será efetuada juntamente com o mérito das questões trazidas a debate pelos recursos
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
de apelação e pela remessa necessária.
5 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
6 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
7 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
8 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
9 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
10 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
11 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
12 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
13 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
14 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
15 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
16 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
17- A r. sentença de fls. 260/264 julgou procedente o pedido, para reconhecer o tempo de
serviço especial, no tocante aos períodos de 01.10.1974 a 03.03.1975, 01.08.1975 a
01.08.1977, 15.06.1979 a 03.11.1997, 04.11.1997 a 29.09.2000 e 01.10.2000 a 07.04.2005 e
conceder aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo
(07.04.2005).
18 - Considerando que somente o INSS interpôs apelação, passo a analisar os períodos
reconhecidos como tempo de labor sob condições especiais.
19 - Para comprovar o labor em condições especiais, o autor coligiu aos autos as "Informações
Sobre Atividades Exercidas em Condições Especiais" (fls. 22/23), em que consta que laborou
no cargo de "motorista de caminhão", junto às empresas: a) "Dimibu Ind. Art. Eratos de Papel e
Papelão Ltda (de 01.10.1974 a 03.03.1975), b) "Moya Martinez e Cia Ltda" (de 01.08.1975 a
01.08.1977).
20 - Por sua vez, juntou ainda o Perfil Profissiográfico Previdenciário (fls. 25/27), em que consta
que, nos períodos de 15.06.1979 a 03.11.1997, 04.11.1997 a 28.09.2000 e 01.10.2000 a
04.04.2005 (data da emissão do PPP), o demandante trabalhou na empresa "Transportes Della
Volpe S/A - Comércio e Indústria" e esteve exposto a ruído variável de 68/82 dB (A), ocasião
em que laborou nos cargos de: "Motorista truck" (de 15.06.1979 a 03.11.1997), "Motorista
carreteiro" (de 04.11.1997 a 28.09.2000) e "Motorista Carreteiro" (de 01.10.2000 a 04.04.2005 -
data de emissão do PPP), atividades essas exercidas no setor "Operacional".
21 - A documentação apresentada evidencia o trabalho do autor como motorista de caminhão e
motorista carreteiro, nos períodos descritos, enquadrando-se na categoria profissional prevista
no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e no Código 2.4.2 do Anexo II do
Decreto 83.080/79, sendo passível de reconhecimento como atividade especial pelo mero
enquadramento da categoria profissional até 28/04/1995.
22 - A partir de 29/04/95, é vedado enquadramento legal por categoria profissional, cabendo à
parte autora a comprovação a exposição a agentes nocivos, de forma habitual e permanente,
não ocasional nem intermitente.
23 - Nesse particular, é certo que, até então, aplicava-se o entendimento no sentido da
impossibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade, na hipótese de submissão do
empregado a nível de pressão sonora de intensidade variável, em que aquela de menor valor
fosse inferior ao limite estabelecido pela legislação vigente.
24 - Ao revisitar os julgados sobre o tema, tormentoso, percebe-se nova reflexão
jurisprudencial, que se passa a adotar, para admitir a possibilidade de se considerar, como
especial, o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído em sua maior intensidade, na medida
em que esta acaba por mascarar a de menor intensidade, militando em favor do segurado a
presunção de que uma maior pressão sonora prevalecia sobre as demais existentes no mesmo
setor.
25 - Registre-se, a esse respeito, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo o
qual "não sendo possível aferir a média ponderada, deve ser considerado o maior nível de ruído
a que estava exposto o segurado, motivo pelo qual deve ser reconhecida a especialidade do
labor desenvolvido pelo segurado no período, merecendo reforma, portanto, a decisão
agravada que considerou equivocadamente que o labor fora exercido pelo segurado com
exposição permanente a ruído abaixo de 90dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003" (AgRg no
REsp nº 1.398.049/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, decisão monocrática, DJe
13/03/2015). Esta 7ª Turma, em caso análogo, decidiu nesse mesmo sentido.
26 - De igual sorte, no caso de "atenuação" do ruído em decorrência do uso de Equipamento de
Proteção Individual - EPI, é certo que a sua utilização não reflete a real sujeição a mencionado
agente agressivo e, bem por isso, há que se considerar, por coerência lógica, hipótese em que
há atenuação apontada, a qual seria somada ao nível de ruído constante do laudo, para fins de
aferição da efetiva potência sonora existente no ambiente laboral.
27 - Dessa forma, a partir de 29.04.1995, possível enquadrar como especial o interregno entre
29.04.1995 a 05.03.1997, eis que o maior ruído atestado é de 82 dB (A), no setor "Operacional",
considerando a legislação aplicável ao caso.
28 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputa-se enquadrado como
especial os períodos de 01.10.1974 a 03.03.1975, 01.08.1975 a 01.08.1977 e 15.06.1979 a
05.03.1997.
29 - Conforme planilha e CNIS em anexo, considerando a atividade especial reconhecida nesta
demanda (01.10.1974 a 03.03.1975, 01.08.1975 a 01.08.1977 e 15.06.1979 a 05.03.1997),
somada aos períodos de atividades comuns, constantes do "Resumo de Documentos Para
Cálculo de Tempo de Contribuição" (fls. 48/52 e 179/183) e da CTPS (fls. 14/21 e 78/85),
verifica-se que o autor contava com 37 anos, 2 meses e 7 dias de serviço na data do
requerimento administrativo (07.04.2005), fazendo jus, portanto, à aposentadoria integral por
tempo de contribuição, não havendo que se falar em aplicação do requisito etário, nos termos
do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal.
30 - O requisito carência restou também completado, consoante anotações na CTPS e extrato
do CNIS.
31 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo
(07.04.2005 - fl. 13).
32 - Conforme Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, verifica-se a parte autora
recebe o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Sendo assim, faculta-se ao
demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais vantajoso, vedado o
recebimento em conjunto de duas aposentadorias, nos termos do art. 124, II, da Lei nº
8.213/91, e, com isso, condiciona-se a execução dos valores atrasados à opção pelo benefício
concedido em Juízo, uma vez que se permitir a execução dos atrasados concomitantemente
com a manutenção do benefício concedido administrativamente representaria uma
"desaposentação" às avessas, cuja possibilidade - renúncia de benefício - é vedada por lei - art.
18, §2º da Lei nº 8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C. Supremo Tribunal
Federal na análise do RE autuado sob o nº 661.256/SC.
33 - A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob
a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de
variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
34 - Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por
refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
35 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restou perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
36 - Isenta a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais, registrando ser a parte
autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
37 - Apelação do INSS conhecida em parte e parcialmente provida e remessa necessária
parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, corrigir o erro
material presente na r. sentença, para que passe a constar em seu dispositivo a concessão de "
aposentadoria integral por tempo de contribuição" ao invés de "aposentadoria proporcional por
tempo de contribuição" e dar parcial provimento à remessa necessária e conhecer em parte da
apelação do INSS, e na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, para deixar de reconhecer
os períodos de 06.03.1997 a 29.09.2000 e 01.10.2000 a 07.04.2005, como laborados sob
condições especiais, bem como para determinar que sobre os valores em atraso incidirá
correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos
na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada
pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de
acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, a r. sentença, na forma da fundamentação,
facultando-se ao autor a opção de percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso, e, por
maioria, decidiu condicionar a execução dos valores atrasados à necessária opção por aquele
cujo direito foi reconhecido em Juízo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
