
| D.E. Publicado em 13/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo retido interposto pela Fazenda do Estado de São Paulo, para reconhecer a sua ilegitimidade passiva, e extinguir o processo sem resolução do mérito, condenando o INSS no pagamento dos honorários advocatícios no montante de R$ 1.000,00; negar provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, tida por interposta; e dar parcial provimento à apelação da parte autora, para determinar a expedição de tempo de serviço pelo INSS, a fim de reconhecer como períodos especiais os interregnos de 03/09/1980 a 06/08/1984, 18/04/1985 a 09/07/1985 e 30/10/1985 a 20/11/1985, além de admitir o período de labor rural de 02/01/1975 a 28/02/1978, com o registro da ausência do recolhimento de contribuições previdenciárias no respectivo período, para fins de contagem recíproca, dando os honorários por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca, restando prejudicada a apelação da Fazenda do Estado de São Paulo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018201-79.2009.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e pela parte autora, em ação previdenciária ajuizada por JOAQUIM TAVARES DE OLIVEIRA, objetivando o reconhecimento de labor rural no período entre 02/01/75 a 28/02/1978, bem como de trabalho exercido em condições especiais, com consequente conversão em comum, entre 21/03/1978 a 02/05/1978, 03/09/1980 a 06/08/1984, 18/04/1985 a 09/07/1985 e 30/10/1985 a 20/11/1985, a fim de obter a respectiva certidão de tempo de serviço perante a autarquia, para que seja averbada perante o Estado de São Paulo, por integrar o Regime Próprio.
A r. sentença de fls. 151/156 julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer como especiais os períodos entre 03/09/1980 a 06/08/1984, 18/04/1985 a 09/07/1985 e 28/10/1963 a 26/05/1982, e determinou a expedição de certidão de tempo de serviço para sua averbação junto ao Estado de São Paulo. Não houve condenação no pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, ante a sucumbência recíproca.
Em razões recursais de fls. 159/165, a Fazenda do Estado de São Paulo reiterou o agravo retido de fls. 138/139, no qual sustenta a sua ilegitimidade para constar no polo passivo da demanda, para o reconhecimento do tempo de serviço perante o Regime Geral da Previdência Social. No recurso propriamente dito, alega a impossibilidade do reconhecimento do tempo especial do requerente.
Em seu recurso de fls. 168/179, o INSS alega que não restou comprovado, por meio de laudo pericial, que o requerente estava exposto, de modo habitual e permanente, a atividades consideradas especiais. Sustenta a impossibilidade da conversão do período especial em comum após 28/05/1998. Afirma que a atividade de vigilante/vigia não está prevista como especial, sendo que a ausência da exigida habilitação para o seu desempenho profissional impede qualquer reconhecimento de trabalho nestas condições.
A parte autora, por sua vez, às fls. 180/191, sustenta que restou demonstrado o período rural trabalhado, por prova material e testemunhal. Pleiteia o reconhecimento da atividade campesina entre 02/01/1975 a 28/02/1978, além da conversão do período trabalhado em condições especiais, com a consequente expedição de certidão totalizando 10 anos e 10 meses de tempo de serviço.
Não foram apresentadas contrarrazões.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de expedição de certidão de tempo de serviço formulado perante o INSS, para averbação do labor rural e especial junto ao Estado de São Paulo.
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 14/12/2008, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475 do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS a reconhecer e averbar, em favor da parte autora, tempo de serviço especial. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Diante da regular reiteração do agravo retido interposto às fls. 138/139, de rigor a sua análise em primeiro lugar.
Com efeito, não faz sentido a integração do Estado de São Paulo no polo passivo, eis que a aferição exclusiva do período trabalhado perante o Regime Geral da Previdência Social é de competência da autarquia previdenciária (INSS), que após o seu exame, expedirá certidão de tempo de serviço com o resultado de sua análise, a fim de que o Estado proceda a averbação dos interregnos reconhecidos no Regime Próprio.
Desta feita, reconhecida a ilegitimidade passiva do Estado de São Paulo, pela aplicação do princípio da causalidade, o INSS deve ser responsabilizado pelos honorários advocatícios da Fazenda Estadual, que arbitro em R$ 1.000,00.
Passo ao exame do labor rural.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
Do caso concreto.
Para a comprovação do labor rural no campo, o autor trouxe comprovante de inscrição no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Sarapuí, no qual consta que, em 11/01/1975, era qualificado profissionalmente como trabalhador rural (fl. 39).
A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal.
A testemunha Sr. Horácio Miguel de Oliveira (fl. 147) afirmou que "conhece o autor" e "trabalharam juntos por um tempo, na lavoura", sendo que "de 1975 a 1978 trabalharam na lavoura para Juvêncio" .
O depoente Sr. Joaquim de Fátima Sousa (fl. 148) disse que "conhece o autor do serviço" e "trabalharam juntos com JUVENCIO PIRES, que era um sitiante". Afirmou que "esse trabalho foi por volta de 1975 a 1978", sendo que "no sítio trabalhavam com carpideira e mexiam com lavoura e plantação".
A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino no período de 02/01/1975 a 28/02/1978.
Imperioso notar que o autor, atualmente servidor público estadual (policial militar), está vinculado ao regime estatutário, Regime Próprio da Previdência Social. Pretende com esta demanda, para fins de aposentadoria, contabilizar como tempo de serviço (rural e especial) o período trabalhado no Regime Geral.
A respeito do tema da contagem recíproca, o artigo 96, IV, da Lei nº 8.213/1991, exige o recolhimento das contribuições previdenciárias no período que pretende comprovar, "com acréscimo de juros moratórios de zero vírgula cinco por cento ao mês, capitalizados anualmente, e multa de dez por cento". Cumpre notar que, para o trabalho rural, não foram vertidas contribuições no caso presente.
A ausência do pagamento da contribuição correspondente, no entanto, não inviabiliza a emissão da certidão de tempo de serviço pela entidade autárquica, desde que o INSS registre no documento aludida situação, observado, desta forma, o comando inserto no art. 96, IV, da Lei nº 8.213/1991.
Nesse sentido é o entendimento da E. Terceira Seção deste Tribunal. Confira-se:
Vale lembrar que a controvérsia referente à possibilidade de reconhecimento de tempo de serviço prestado em condições especiais sob o regime celetista, para fins de contagem recíproca com tempo de serviço público, encontra-se pacificada na jurisprudência do colendo Supremo Tribunal Federal:
Nessa mesma toada, as seguintes decisões monocráticas daquela Corte Superior: ARE 953015, Relator: Min. Dias Toffoli, julgado em 01/08/2017, publicado em 10/08/2017, RE 1068026, Relatora: Min. Rosa Weber, julgado em 28/08/2017, publicado em 06/09/2017 e RE 968486, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 16/03/2017, publicado 22/03/2017.
Este também o posicionamento desta Egrégia Corte Regional, conforme ementas que seguem:
Consigne-se que a Constituição Federal, em seu art. 5º, XXXIV, assevera ser direito fundamental individual a obtenção de certidões perante o Poder Público, de modo que a expedição de Certidão de Tempo de Serviço é manifestação de tal preceito, configurando declaração do Poder Público acerca da existência (ou inexistência) de relação jurídica pré-existente. Importante ser dito que o conteúdo de tal certidão não comporta qualquer tipo de ressalva no tocante à extensão de sua utilidade no sentido de que ela não poderá ser utilizada para fins de contagem recíproca.
Dessa forma, diante de um legítimo interesse (qual seja, declaração judicial a respeito de tempo de serviço exercido sob condições especiais nos termos da legislação aplicável), somente é possível ao julgador, após reconhecer e asseverar a existência desse tal direito, impor que se expeça a certidão (sob o pálio do direito fundamental individual anteriormente descrito), o que não significa que, de posse dela, automaticamente seu detentor obtenha direito à percepção de benefício previdenciário, sendo necessário, ainda, o adimplemento dos requisitos legais a ser perquirido no momento em que pugnada a benesse (inclusive se a adição de tempos de filiação em regimes diversos restou suficiente).
Conforme já acenado nos julgados acima transcritos, cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social emitir a certidão de tempo de serviço - mencionando os lapsos especiais reconhecidos ao segurado - e, ao órgão a que estiver vinculado o servidor, a averbação do conteúdo certificado e a soma do tempo de labor para fins de concessão da aposentadoria.
Passo a analisar os períodos de atividade especial suscitados na inicial.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Do caso concreto.
Para comprovar que suas atividades foram exercidas em condições especiais, o autor trouxe cópia da CTPS (fls. 15/16) e os documentos de fls. 40/42, que comprovam que, nos períodos de 03/09/1980 a 06/08/1984, 18/04/1985 a 09/07/1985 e 30/10/1985 a 20/11/1985, exerceu a função de vigilante.
Entendo que a profissão de guarda patrimonial, vigia, vigilante e afins, para a qual se comprove o efetivo porte de arma de fogo no exercício das atribuições, é considerada de natureza especial durante todo o período a que está a integridade física do trabalhador sujeita aos riscos de seu dever de proteger o bem alheio e inibir eventual ação ofensiva, inclusive com a possibilidade de resposta armada.
Alie-se como robusto elemento de convicção, nesse sentido, a reforma legislativa realizada pela Lei nº 12.740/2012, que alterou o art. 193 da CLT, para considerar a atividade de vigilante como perigosa, com o adicional de 30%, em virtude da exposição da categoria a roubos ou outras espécies de violência, mesmo não fazendo menção a uso de armas.
Ademais, reputa-se perigosa tal função por equiparação da categoria àquelas previstas no item 2.5.7 do Decreto nº 53.831/64, ainda que não tenha sido incluída pelos Decretos nº 83.090/79 e nº 89.312/84, cujos anexos regulamentares encerram classificação meramente exemplificativa.
Ressalte-se que essa presunção de periculosidade perdura mesmo após a vigência do Decreto nº 2.172/97, independentemente do laudo técnico a partir de então exigido.
Aliás, a despeito da necessidade de se comprovar esse trabalho especial mediante estudo técnico ou perfil profissiográfico, entendo que tal exigência não se mostra adequada aos ditames da Seguridade Social pois, ao contrário das demais atividades profissionais expostas a agentes nocivos, o laudo pericial resulta inviável no caso dos vigias, na medida em que a avaliação do grau de periculosidade se dá no mesmo âmbito da presunção adotada pelo enquadramento no Decreto nº 53.831/64, vale dizer, somente seria possível avaliar a efetiva exposição de risco numa situação real de defesa ao patrimônio tutelado, justamente o que se procura prevenir com contratação dos profissionais da área da segurança privada.
A propósito da continuidade das circunstâncias de perigo a que exposto o segurado, bem decidiu este E. Tribunal que "Diferentemente do que ocorre com a insalubridade, na qual ganha importância o tempo, por seu efeito cumulativo, em se tratando de atividade perigosa, sua caracterização independe da exposição do trabalhador durante toda a jornada, pois que a mínima exposição oferece potencial risco de morte, justificando o enquadramento especial, não havendo que se falar em intermitência, uma vez que o autor exerce a função de vigia durante toda a jornada de trabalho, assim sendo, a exposição ao risco é inerente à sua atividade profissional" (10ª Turma, AC nº 2007.03.99.038553-3, Rel. Des. Fed. Sérgio Nascimento, j. 23/06/2009, DJF3 01/07/2009, p. 889).
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo enquadrados como especiais os períodos de 03/09/1980 a 06/08/1984, 18/04/1985 a 09/07/1985 e 30/10/1985 a 20/11/1985.
Por outro lado, afasto a especialidade no período entre 21/03/1978 a 02/05/1978, quando trabalhou na empresa "Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - Sabesp", no cargo de pedreiro. Isso porque a atividade de pedreiro e a de seus auxiliares, por si só, sem maiores contornos, não está caracterizada na legislação como atividade profissional a merecer o enquadramento como trabalho especial. Não bastasse isso, não há nos autos qualquer prova a amparar o pedido do autor.
Por fim, esclareço que se sagrou vencedora a parte autora ao ver reconhecido parcialmente o período especial vindicado. Por outro lado, foi afastada outra parte da especialidade pretendida e o tempo de serviço rural restou apenas condicionado ao pagamento de contribuições previdenciárias. Desta feita, dou os honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixo de condenar qualquer delas no reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS delas isento.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo retido interposto pela Fazenda do Estado de São Paulo, para reconhecer a sua ilegitimidade passiva, e extinguir o processo sem resolução do mérito, condenando o INSS no pagamento dos honorários advocatícios no montante de R$ 1.000,00; nego provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, tida por interposta; e dou parcial provimento à apelação da parte autora, para determinar a expedição de tempo de serviço pelo INSS, a fim de reconhecer como períodos especiais os interregnos de 03/09/1980 a 06/08/1984, 18/04/1985 a 09/07/1985 e 30/10/1985 a 20/11/1985, além de admitir o período de labor rural de 02/01/1975 a 28/02/1978, com o registro da ausência do recolhimento de contribuições previdenciárias no respectivo período, para fins de contagem recíproca, dando os honorários por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca, restando prejudicada a apelação da Fazenda do Estado de São Paulo.
É como voto.
Desembargador Federal
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