Processo
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1881323 / SP
0026086-08.2013.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/05/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA CITRA PETITA INTEGRADA. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
LAUDO PERICIAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. RECONHECIMENTO.
ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. NÃO
ADMISSÃO. BENEFÍCIO PROPORCIONAL NÃO CONCEDIDO. EMENDA CONSTITUCIONAL
Nº 20/98. FALTA DE CUMPRIMENTO DO REQUISITO PEDÁGIO. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS COMPENSADOS ENTRE AS PARTES. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA
PARCIALMENTE CONHECIDA E DESPROVIDA.
1 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do
CPC/2015.
2 - Todavia, em sua decisão, o MM. Juiz a quo, não analisou pedido formulado na inicial, no
tocante ao reconhecimento do labor especial entre 19/11/2003 e 05/02/2010, limitando-se a
analisar o labor rural sem registro, restando violado o princípio da congruência insculpido no art.
460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
3 - Conveniente esclarecer que a violação ao princípio da congruência traz, no seu bojo,
agressão ao princípio da imparcialidade e do contraditório.
4 - Assim, é de ser integrada a sentença, procedendo-se à análise do pedido expressamente
formulado na inicial, porém não enfrentado pelo decisum.
5 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
6 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
7 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
8 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
9 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
10 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
11 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
12 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
13 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
14 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
15 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
16 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
17 - Quanto ao período trabalhado na "Usina Santa Fé SA" entre 19/11/2003 a 05/02/2010, o
Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 91/93, com indicação dos responsáveis pelos
registros ambientais e pela monitoração biológica, demonstra que o autor estava exposto a
ruído de 86,3dB.
18 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, enquadrado como especial
o período de 19/11/2003 a 05/02/2010, eis que desempenhados com sujeição a nível de
pressão sonora superior ao limite de tolerância vigente à época da prestação dos serviços
(85dB).
19 - Labor rural. O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo
de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo
admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
20 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
21 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
22 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
23 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais.
24 - A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
25 - Observa-se que a audiência realizou-se no ano de 2011 e as testemunhas informaram
conhecer o autor desde 1986 e 1989, períodos posteriores ao discutidos nestes autos (1963 a
outubro de 1981), motivo pelo qual não restou comprovada o alegado labor no campo.
26 - Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda aos períodos incontroversos
de fls. 101/105, verifica-se que a parte autora contava com 32 anos, 05 meses e 16 dias de
tempo de serviço na data do requerimento administrativo (17/02/2010), no entanto, à época não
havia completado o requisito do "pedágio" (34 anos, 5 meses e 17 dias de serviço) para fazer
jus à aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, conforme disposição do art. 9º, §1º,
da Emenda Constitucional nº 20/98.
27 - Sagrou-se vitorioso o autor ao ver reconhecida a especialidade vindicada. Por outro lado,
não foi admitido o labor rural e também não foi concedida a aposentadoria, restando vencedora
nesses pontos a autarquia. Desta feita, honorários advocatícios por compensados entre as
partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e sem condenação de qualquer
delas no reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da
justiça gratuita e o INSS delas isento.
28 - Sentença citra petita integrada. Apelação da parte autora parcialmente conhecida e
desprovida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, integrar a r.
sentença, citra petita, para admitir como tempo de serviço especial o período entre 19/11/2003
e 05/02/2010, e conhecer parcialmente da apelação da parte autora, e na parte conhecida,
negar-lhe provimento, dando os honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante
a sucumbência recíproca, mantida, no mais, a r. sentença prolatada em 1º grau de jurisdição,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
