
| D.E. Publicado em 03/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa necessária, tida por interposta, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de decisão citra petita e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgar procedente o pedido, para reconhecer o exercício do labor rural no período de 01/01/1971 a 30/12/1981 e condenar o INSS a implantar, em favor da autora, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a data do requerimento administrativo (10/12/2010), acrescidas as parcelas em atraso de correção monetária calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o mesmo Manual; além de fixar os honorários advocatícios em 10% sobre o valor das parcelas devidas até a sentença; restando prejudicada a análise da apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0027062-49.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por MARIA BENEDITA CARNEIRO, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de fls. 140/141 julgou procedente o pedido inicial. Reconheceu a atividade rural no período de 01/01/1971 a 30/12/1971 e condenou o INSS a implantar, em favor da autora, o benefício de aposentadoria por tempo de serviço, conforme requerido, desde a data do indeferimento do pedido administrativo, com prestações vencidas pagas de uma só vez, devidamente corrigidas e acrescidas de juros de mora a partir de cada vencimento. Concedida a antecipação dos efeitos da tutela. Condenou, ainda, a autarquia no pagamento de honorários advocatícios, fixados em 15% das prestações vencidas até a data da sentença. Isenção de custas processuais.
Em razões recursais de fls. 154/162, o INSS requer, preliminarmente, a suspensão dos efeitos da tutela. No mérito, pleiteia a reforma da sentença, alegando ausência de tempo mínimo para a aposentadoria por tempo de serviço mesmo com o período rural de 01/01/1971 a 30/12/1971 reconhecido na ação judicial. Subsidiariamente, reque a fixação do termo inicial na data da citação (14/04/2011), a redução dos honorários advocatícios, além de insurgir-se em relação aos juros de mora e à correção monetária. Por fim, prequestiona a matéria.
Devidamente processado o recurso, com contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 26/10/2011, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, § 2º do CPC/73:
No caso, o INSS foi condenado a reconhecer o labor rural e a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao autor.
Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Ressalte-se que, fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015.
Em sua decisão, o juiz a quo não analisou o labor rural no período de 31/12/1971 a 30/12/1981.
Logo, é cristalina a ocorrência de julgamento citra petita, eis que não foi analisado o pedido formulado na inicial, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
Desta forma, reconheço que a sentença é citra petita e, portanto, declaro a sua nulidade, restando prejudicada a análise da apelação do INSS.
O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil:
Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável.
Passo ao exame do labor rural.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.
Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
No entanto, não há necessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Impende registrar que é pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Do caso concreto.
Pretende a autora o reconhecimento do labor rural no período de 01/01/1971 a 30/12/1981, com a consequente concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Para comprovar o suposto labor rural, a autora apresentou:
a) "demonstração do ponto" com "recibo mensal", referente a labor na Fazenda Nova - Iacanga, de propriedade do Sr. José Tercio Costa, dos anos de 1971 a 1976 (fls. 20/79);
b) certidão de casamento, realizado em 19/11/1977, em que a autora foi qualificada como "do lar" e seu marido como "lavrador" (fl. 80); e
c) certidão de nascimento de Cassiane de Fátima Gomes, lavrada em 08/10/1981, em que o marido da autora foi qualificado como "lavrador" (fl. 82).
Além da documentação trazida como início de prova material hábil para comprovar o exercício de labor rural, em audiência realizada em 26/10/2011, foram ouvidas duas testemunhas, Maria Aparecida Tavares Gomes (fls. 142/142-verso) e Pedro Tavares (fls. 143/143-verso).
Maria Aparecida informou que "conhece a autora desde que ambas eram crianças. Tanto a declarante quanto a requerente começaram a trabalhar na fazenda Nova, no município de Iacanga, na qual residiam com seus familiares, que também trabalhavam naquela propriedade rural. A declarante não se recorda a época exata em que saiu da fazenda Nova, mas a autora ainda continuou trabalhando naquela propriedade rural. A autora casou-se com José Flávio Gomes, o qual também morava e trabalhava na fazenda nova. A autora teve dois filhos, sendo um casal, os quais nasceram também na fazenda Nova. O proprietário da fazenda Nova era o sr José Tercio Costa, o qual posterioremente criou a empresa JTC Agropecuária. (...) Quando mudou-se da fazenda Nova, foi para outra propriedade próxima, também em Iacanga, continuando a ter contato com a autora. Tanto a declarante quanto a autora na fazenda Nova, trabalhavam nas lavouras de café".
Pedro relatou que "conhece a autora desde que ambos eram crianças. Tanto o declarante quanto a requerente começaram a trabalhar na fazenda Nova, no município de Iacanga, na qual residiam com seus familiares, que também trabalhavam naquela propriedade rural. O declarante ficou na fazenda Nova até por volta de 1988, sendo que naquela época a autora ainda ficou trabalhando na citada propriedade rural. (...) A autora casou-se com José Flávio Gomes, o qual também morava e trabalhava na fazenda nova. A autora teve dois filhos, sendo um casal os quais nasceram também na fazenda Nova. O proprietário da fazenda nova era o sr José Tercio Costa, o qual posteriormente criou a empresa JTC Agropecuária".
Assim, a prova oral reforça o labor no campo, ampliando a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, tornando possível o reconhecimento do labor rural, no período de 01/01/1971 a 30/12/1981, conforme pedido inicial, exceto para fins de carência.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe:
Conforme planilha anexa, somando-se o labor rural, reconhecido nesta demanda, àqueles constantes nas cópias da CTPS (fls. 13/14) e extrato do sistema CNIS (fls. 109/115), verifica-se que a autora, na data do requerimento administrativo (10/12/2010 - fl. 91), contava com 31 anos, 03 meses e 04 dias de tempo de serviço, o que lhe assegura o direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir desta data, não havendo que se falar em aplicação do requisito etário, nos termos do art. 201, §7º, inciso I, da Constituição Federal.
O requisito carência restou também completado, consoante anotação em CTPS e extrato do CNIS.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas devidas até a sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente, conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido.
No que se refere às custas processuais, delas está isenta a autarquia, a teor do disposto no §1º do art. 8º da Lei n. 8.620/93.
Ante o exposto, dou provimento à remessa necessária, tida por interposta, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de decisão citra petita e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgar procedente o pedido, para reconhecer o exercício do labor rural no período de 01/01/1971 a 30/12/1981 e condenar o INSS a implantar, em favor da autora, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a data do requerimento administrativo (10/12/2010), acrescidas as parcelas em atraso de correção monetária calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o mesmo Manual; além de fixar os honorários advocatícios em 10% sobre o valor das parcelas devidas até a sentença; restando prejudicada a análise da apelação do INSS.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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