D.E. Publicado em 03/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, anular, de ofício, a r. sentença de 1º grau, por se tratar de decisão citra petita e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgar improcedente o pedido, e condenar a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC, restando prejudicada a análise da apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0041617-08.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBAGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por SEVERINO BELARMINO SOBRINHO, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a citação, mediante o reconhecimento de labor rural sem registro, a partir dos 7 anos de idade, no período de janeiro/1965 a janeiro/1979; bem como reconhecimento da natureza especial do referido labor campesino.
A parte autora juntou aos autos cópia de formulário e laudo pericial relativo a vínculo empregatício exercido no período de 08/05/1984 a 308/11/1986.
A r. sentença de fls. 139/150, analisou apenas o pedido de averbação do labor rural e julgou procedente o pedido, condenando o INSS a conceder a aposentadoria por tempo de contribuição, desde a citação. Prestações em atraso acrescidas de juros de mora de 12% ao ano e correção monetária conforme os critérios do Provimento nº 26 da Corregedoria Geral da Justiça Federal da 3ª Região, incluindo-se os índices expurgados pacificados no STJ. Fixou honorários advocatícios em 10% das parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula 111 do STJ). Sem custas e despesas processuais.
Em suas razões recursais de fls. 153/156, o INSS alega que o período de labor rural sem registro, reconhecido na sentença, foi utilizado para carência, pois o autor trabalhou somente 5 anos com contribuições. Sustenta a impossibilidade de utilizar o tempo rural para efeito de carência, por expressa vedação legal. Pede a reforma da sentença.
Contrarrazões do autor.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELETÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de período de labor rural, no interregno de janeiro/1965 a janeiro/1979, bem como reconhecimento da natureza especial do aludido trabalho campesino, com conversão para tempo comum.
Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015.
Em sua decisão, o juiz a quo reconheceu o desempenho do labor rural sem registro em CTPS, mas não analisou o pedido de reconhecimento da especialidade do referido trabalho rural.
Logo, é cristalina a ocorrência de julgamento citra petita, eis que não foram analisados todos os pedidos formulados na inicial, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
Desta forma, reconheço que a sentença é citra petita e, portanto, declaro a sua nulidade, de ofício, restando prejudicada a análise da apelação do INSS.
O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil:
Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável, passo ao exame do mérito da demanda.
Passo ao exame do pedido.
Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a citação, mediante o reconhecimento de labor rural sem registro, no período de janeiro/1965 a janeiro/1969, bem como reconhecimento da natureza especial do referido trabalho rural.
Inicialmente, ressalto que a parte autora anexou aos autos cópia de formulário e laudo pericial (fls. 84/85), referente a período de labor urbano, exercido no interregno de 08/05/1984 a 30/11/1986. Tais documentos não merecem conhecimento, eis que na inicial não há pedido de reconhecimento de especialidade do período de labor urbano em questão.
Quanto ao labor rural, cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
No entanto, não há necessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Impende registrar que é pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Para comprovar o suposto labor rural, o autor apresentou os seguintes documentos:
a) Cópia da certidão de seu nascimento, em 10/01/1958, no Sítio Vertente Seca (fl. 19);
b) Cópia de certificado de dispensa de incorporação, expedido em 27/03/1979, constando sua profissão como agricultor (fl. 20);
c) Cópia de declaração firmada por particulares, datada de 10/01/2002, informando labor rural do autor no período de 05/01/1975 a 20/12/1978 (fl. 21);
d) Cópia da certidão de nascimento do genitor do autor, Sr. João Belarmino de Medeiros, em 11/07/1927, no Sítio Vertente Seca (fl. 22);
e) Cópia de declaração do exercício de atividade rural, não homologada, firmada pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Passira (fl. 23);
f) Cópias de escrituras de imóveis rurais, constando como adquirente o Sr. José Belarmino de Medeiros, lavradas em 06/10/1961e 26/01/1963 (fls.24/29), e
g) Cópias de "Documento de Informação e Atualização Cadastral", do Sítio Vertente Seca e Sítio Cafundó, relativas ao ano de 2001 (fls. 30/31).
A declaração extemporânea (fl. 21), assinada por particulares, não constitui início de prova material do período pretendido, pois se trata de mero documento particular, equivalente às provas testemunhais colhidas, cuja veracidade de seu teor se presume, apenas, em relação ao seu signatário, não gerando efeitos contra terceiros (art. 368, CPC/1973 e art. 408, CPC/2015), nesse sentido:
A declaração sindical (fls. 23) não foi homologada por órgão oficial, razão pela qual não tem aptidão como prova material do trabalho rural.
Nessa diretriz o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça e desta 3ª Seção:
A cópia da certidão de seu nascimento, em 10/01/1958 (fl. 19), e a cópia da certidão de nascimento do genitor do autor, em 11/07/1927 (fl. 22), não se referem ao período no qual a parte autora busca o reconhecimento do labor rural.
A cópia do certificado de dispensa de incorporação, expedido em 27/03/1979, constando sua profissão como agricultor (fl. 20), e as cópias de escrituras de imóveis rurais, constando como adquirente o Sr. José Belarmino de Medeiros, lavradas em 06/10/1961e 26/01/1963 (fls.24/29), configuram início de prova material do trabalho rural. Contudo, o início de prova material não vem corroborado por prova testemunhal.
No caso, houve oitiva de apenas uma testemunha. Ocorre que referida testemunha (fl. 135), Sr. Severino Belarmino de Medeiros, é parente próximo do autor, de modo que seu depoimento padece de isenção e, por isso, não tem força probante.
Ressalte-se, ainda, que no depoimento a testemunha se limitou a dizer que conhece o autor e sabe que ele trabalhou no campo porque trabalharam juntos, omitindo o fato de que o conhecia em razão de ser parente do mesmo.
Inviável, portanto, o reconhecimento do labor rural pretendido, restando prejudicada a análise do pedido de reconhecimento da natureza especial da atividade, sendo de rigor a decretação da improcedência do pedido.
Condeno a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Ante o exposto, anulo, de ofício, a r. sentença de 1º grau, por se tratar de decisão citra petita e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgo improcedente o pedido, e condeno a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC, restando prejudicada a análise da apelação do INSS.
Defiro a prioridade de tramitação requerida, ex vi do disposto nos arts. 1.048, I, do Código de Processo Civil e 71 da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso), devendo a Serventia proceder à identificação dos autos e anotação no sistema processual.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 26/09/2018 12:06:58 |