Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1716823 / SP
0011322-23.2008.4.03.6109
Relator(a) para Acórdão
DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. CONDIÇÕES DE JULGAMENTO
IMEDIATO PELO TRIBUNAL. ATIVIDADE RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA
MATERIAL. EXTINÇÃO PARCIAL DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
ATIVIDADE ESPECIAL. ELETRICIDADE. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA
PROFISSIONAL. POSSIBILIDADE ATÉ O ADVENTO DA LEI Nº 9.032/95. APOSENTADORIA
PROPORCIONAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ISENÇÃO DE CUSTAS. REMESSA
NECESSÁRIA PROVIDA PARA ANULAR A SENTENÇA, PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE
PROCEDENTE E APELAÇÃO DO INSS PREJUDICADA.
1 - Juízo a quo reconheceu a especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de
09/12/1985 a 31/03/1987 e de 07/08/1987 a 16/11/1987, concedendo ao autor a aposentadoria
por tempo de contribuição, sem efetuar, contudo, o respectivo cálculo do tempo de contribuição,
condicionando-a, para a sua implantação, ao preenchimento dos demais requisitos legais a
serem analisados pela autarquia, reproduzindo, na tutela antecipada, esse mesmo teor
condicional. Não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida
e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Súmula 490 do STJ.
2 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do
CPC/2015. Em sua decisão, o juiz a quo, apesar do reconhecimento de parte dos períodos
especiais, determinou que a autarquia procedesse à concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição, se preenchidos os demais requisitos legais, desde a data do requerimento
administrativo. Desta forma, está-se diante de sentença condicional, eis que expressamente
não foi analisado o pedido formulado na inicial, restando violado o princípio da congruência
insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015. O caso, entretanto, não é de
remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o
julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai
do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil. Considerando que a causa encontra-se
madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde - e que o
contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida do ente autárquico
- e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável, passa-se ao exame do mérito da
demanda.
3 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal,
especificamente na Lei de Benefícios.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
7 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91.
8 - Pretende o autor o reconhecimento do labor rural no período de 07/03/1970 a 30/10/1974; e
do labor especial, nos períodos de 09/12/1985 a 09/12/1985 a 31/03/1987 e de 07/08/1987 a
16/11/1987; com a consequente concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição.
9 - Para comprovar o suposto labor rural o autor apresentou: a) Certificado de Dispensa de
Incorporação, com dispensa do Serviço Militar Inicial em 1975, em que foi qualificado como
"lavrador" (fl. 40); e b) Livro de Matrícula do ano de 1961, em que o genitor do autor foi
qualificado como "lavrador" (fls. 68/69).
10 - Ante a ausência de prova material do labor rural no período de 07/03/1970 a 30/10/1974,
imperiosa a extinção da demanda neste ponto, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a
propositura de nova ação, caso o requerente venha a conseguir documentos que comprovem o
labor desenvolvido na qualidade de rurícola.
11 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
12 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
13 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
14 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
15 - A permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a
jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de
habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como
especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação
anterior. Precedente do C. STJ.
16 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
17 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
18 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
19 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
20 - Restou superada a questão relacionada à supressão do agente "eletricidade" do rol do
Decreto n.º 2.172/97, nos termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC,
representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
21 - No período de 09/12/1985 a 31/03/1987, em que laborou na empregadora CTM CITRUS
S/A, exercendo a função de "eletricista de manutenção", no setor de "manutenção elétrica",
dedicando-se à "manutenção preventiva e corretiva", instalação, montagem, manutenção,
conserto e reparos de peças, paíneis (CCM), quadro, motores, máquinas e equipamentos fabris
(todos alimentados com tensão de 220, 380 ou 440 volts, corrente alternada), instalação de
fiação elétrica para alimentar máquinas, manutenção de termômetro, controladores
eletropneumático, cartões eletrônicos e controladores digitais", com exposição habitual e
permanente ao agente nocivo, conforme atesta o formulário de fls.44.
22 - Em relação ao período de 07/08/1987 a 16/11/1987, em que laborou na empregadora
SUCOCITRICO CUTRALE LTDA., exercendo a função de "eletricista B" em toda área industrial,
junto à "oficina mecânica/ elétrica, produção de suco, farelo, caldeira, câmaras frias,
executando periodicamente manutenção em todo sistema elétrico de alta tensão (11.450 Volts)
e baixa tensão (380, 220 e 110 volts)".
23 - Dessa forma, é possível o enquadramento, por categoria profissional, dos períodos de
09/12/1985 a 31/03/1987 e de 07/08/1987 a 16/11/1987. Frise-se que o caso em tela não requer
comprovação quanto à exposição do autor ao agente nocivo, exigência está que passou a
incidir apenas a partir da edição da Lei nº 9.032, de 28/04/1995.
24 - A atividade especial reconhecida nesta demanda (09/12/1995 a 31/03/1987 e 07/08/1987 a
16/11/1987) aos períodos especiais incontroversos lançados às fls. 93 e aos períodos (comuns)
de 14/10/1975 a 30/03/1977 e 14/03/1991 a 02/07/1991, constantes do CNIS em anexo,
verifica-se que o autor alcançou 30 anos, 2 meses e 12 dias de tempo de serviço na data em
que pleiteou o benefício de aposentadoria, em 05/11/1998 (DER - fls. 89), o que lhe assegura o
direito ao benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, com base na
legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98 (direito adquirido, art. 3º da citada
emenda constitucional).
25 - O termo inicial dos efeitos financeiros do reconhecimento do direito à aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição deve ser fixado na data do respectivo requerimento
administrativo, observada a prescrição quinquenal.
26 - A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob
a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de
variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
27 - Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por
refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
28 - Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das
parcelas devidas até a sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações
pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente, conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido.
29 - No que se refere às custas processuais, delas está isenta a autarquia, a teor do disposto
no §1º do art. 8º da Lei n. 8.620/93.
30 - Remessa necessária provida. Sentença anulada. Pedido parcialmente procedente.
Apelação do INSS prejudicada.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa
necessária, tida por interposta, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de sentença
condicional e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgar
parcialmente extinto o processo, sem resolução de mérito quanto ao reconhecimento do labor
rural, em atenção ao determinado no REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do
CPC/1973, e no que sobeja, julgar parcialmente procedente, para reconhecer a atividade
especial nos períodos de 09/12/1985 a 31/03/1987 e de 07/08/1987 a 16/11/1987 e condenar o
INSS a implantar em seu favor o benefício de aposentadoria proporcional por tempo de
contribuição, com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98 (direito
adquirido, art. 3º da citada emenda constitucional), acrescidas as parcelas em atraso de
correção monetária calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para
os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será
apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora, incidentes até a expedição do
ofício requisitório, fixados de acordo com o mesmo Manual; além do pagamento de honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor das parcelas devidas até a sentença, e, por maioria,
decidiu fixar o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo, observada a
prescrição quinquenal e, por unanimidade, julgou prejudicada a apelação do INSS.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
