Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1723835 / SP
0008013-22.2012.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. CONDIÇÕES DE JULGAMENTO
IMEDIATO PELO TRIBUNAL. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL IDÔNEA. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. RECONHECIMENTO.
APOSENTADORIA INTEGRAL. TERMO INICIAL. DATA DA CITAÇÃO. CONCESSÃO
ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO. OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO.
EXECUÇÃO DO JULGADO SOMENTE SE A OPÇÃO FOR PELO BENEFÍCIO CONCEDIDO
EM JUÍZO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
ISENÇÃO DE CUSTAS PROCESSUAIS. REMESSA NECESSÁRIA PROVIDA, SENTENÇA
ANULADA. JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO. PREJUDICADOS OS
RECURSOS DA PARTE AUTORA E DO INSS.
1 - Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o
reconhecimento de período de labor rural e reconhecimento da natureza especial de períodos
de labor.
2 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do
CPC/2015. Em sua decisão, o juiz a quo reconheceu o desempenho do labor especial, de
01/08/1973 a 30/04/1988 e 02/05/1988 a 01/07/1992, mas não analisou o pedido de
reconhecimento de labor rural, além de condicionar a concessão do benefício ao preenchimento
dos requisitos legais. Desta forma, está-se diante de sentença condicional, eis que
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
expressamente não foi analisado o pedido formulado na inicial, restando violado o princípio da
congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015. Também é cristalina
a ocorrência de julgamento citra petita, eis que não foram analisados todos os pedidos
formulados na inicial, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do
CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015. O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª
instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo
quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código
de Processo Civil. Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes
os elementos necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram
assegurados - com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação
processual aplicável, passa-se ao exame do mérito da demanda.
3 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
4 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
5 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
6 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91.
7 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, é histórica a vedação do trabalho
infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os
menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições
anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
8 - Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o
desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos
genitores. Corroborando esse entendimento, se encontrava a realidade brasileira das duas
décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64%
na década de 1950 e 55% na década de 1960).
9 - Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os
auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor pudesse o menor exercer
plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma
atividade tão desgastante.
10 - Pretende o autor o reconhecimento do labor rural no período de 01/01/1968 a 15/07/1973,
e especial nos períodos de 01/08/1973 a 30/04/1988 e 02/05/1988 a 01/07/1992, com a
consequente concessão do benefício de aposentaria proporcional por tempo de contribuição,
com DIB em 01/07/1992, data em que alega ter completado 32 anos e 9 dias de tempo de
serviço e, sucessivamente, com a DIB em 18/06/1998, data da DER, porém considerando o
período como contribuinte individual, de 01/11/1992 a 31/05/1998.
11 - Além dos documentos trazidos como início de prova material hábil para comprovar o
exercício de labor rural, foram ouvidas três testemunhas.
12 - A prova oral reforça o labor no campo e amplia a eficácia probatória dos documentos
carreados aos autos; tornando possível o reconhecimento do labor rural, no período de
01/01/1968 a 15/07/1973, exceto para fins de carência.
13 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
14 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por
qualquer modalidade de prova.
15 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador.
16 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
17 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
18 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
19 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
20 - No tocante aos períodos de 01/08/1973 a 30/04/1988 e 02/05/1988 a 01/07/1992, em que
exerceu as atividades de auxiliar, operário especializado, operário qualificado, encarregado de
2ª categoria e encarregado de turno, na empresa FIBRA S/A, o autor trouxe aos autos o
formulário DSS-8030, datado de 12/08/1997, de fls. 32, no qual consta que esteve exposto a
ruído de 96 decibéis, de modo habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, bem
como o laudo técnico individual de ruído, de fls. 33, datado de 12/08/1997, que corrobora tais
informações.
21 - Possível, portanto, o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de
01/08/1973 a 30/04/1988 e 02/05/1988 a 01/07/1992, conforme pedido inicial.
22 - Acerca da conversão do período de tempo especial, deve ela ser feita com a aplicação do
fator 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, não importando a época em que
desenvolvida a atividade, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
23 - A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201,
§7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe: § 7º É assegurada aposentadoria no regime geral
de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: I - trinta e cinco
anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;
24 - Desta forma, após converter o período especial em tempo comum, aplicando-se o fator de
conversão de 1.4, e somá-lo ao período rural ora reconhecido (01/01/1968 a 15/07/1973) e aos
demais períodos comuns constantes do CNIS; constata-se que o autor, na data da DER
(18/06/1998), portanto anteriormente à publicação da EC 20/98 (16/12/1998), contava com 37
anos, 7 meses e 9 dias de tempo total de atividade; suficiente para a concessão do benefício de
aposentadoria integral por tempo de contribuição, com base na legislação pretérita à Emenda
Constitucional nº 20/98 (direito adquirido, art. 3º da EC).
25 - O termo inicial do benefício deve ser estabelecido na data da citação (28/05/2009 - fl. 208),
tendo em vista que não se pode atribuir à autarquia as consequências da postura desidiosa do
administrado que levou 6 (seis) anos para judicializar a questão, após a apreciação de seu
recurso em sede administrativa (fl. 65/69).
26 - Impende salientar que se está aqui a tratar da extração ou não de efeitos decorrentes da
conduta daquele que demora em demasia para buscar satisfação à sua pretensão. Os efeitos
da sentença condenatória via de regra, retroagem à data da citação, eis que somente a partir
dela é que se afigura em mora o devedor, situação que não se abala quando da existência de
requerimento administrativo prévio, mas efetuado em data muito anterior ao ajuizamento da
ação, como sói ocorrer no caso dos autos. Significa dizer, em outras palavras, que o decurso de
tempo significativo apaga os efeitos interruptivos da prescrição, fazendo com que o marco inicial
para o pagamento seja aquele considerado o da comunicação ao réu da existência de lide e de
controvérsia judicial.
27 - Verifica-se, pelas informações obtidas no CNIS que a parte autora recebe o benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição desde 19/06/2012. Sendo assim, faculta-se ao
demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais vantajoso, vedado o
recebimento em conjunto de duas aposentadorias, nos termos do art. 124, II, da Lei nº
8.213/91, e, com isso, condicionada a execução dos valores atrasados à opção pelo benefício
concedido em Juízo, uma vez que se permitir a execução dos atrasados concomitantemente
com a manutenção do benefício concedido administrativamente representaria uma
"desaposentação" às avessas, cuja possibilidade - renúncia de benefício - é vedada por lei - art.
18, §2º da Lei nº 8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C. Supremo Tribunal
Federal na análise do RE autuado sob o nº 661.256/SC.
28 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
29 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
30 - Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das
parcelas devidas até a sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações
pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente, conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido.
31 - No que se refere às custas processuais, delas está isenta a autarquia, a teor do disposto
no §1º do art. 8º da Lei n. 8.620/93.
32 - Remessa necessária provida. Sentença anulada. Ação julgada parcialmente procedente.
Prejudicados os recursos de apelação da parte autora e do INSS.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, por unanimidade, dar
provimento à remessa necessária, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de
sentença condicional e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil,
julgar parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a atividade rural no período de
01/01/1968 a 15/07/1973, bem assim a atividade especial, com possibilidade de conversão em
comum, nos períodos de 01/08/1973 a 30/04/1988 e 02/05/1988 a 01/07/1992, e conceder a
aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir da data da citação (28/05/2009 - fl.
208), e estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até
a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação
do IPCA-E, fixar os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, de acordo
com o mesmo Manual e fixar os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação,
considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, restando prejudicadas as apelações
do autor e do INSS, facultada ao demandante a opção pelo benefício mais vantajoso, e, por
maioria, decidiu condicionar a execução dos valores atrasados à necessária opção por aquele
cujo direito foi reconhecido em Juízo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
