Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5070010-08.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
24/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 10/03/2022
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA EXTRA PETITA. ANULAÇÃO. ATIVIDADE RURAL.
RECONHECIMENTO PARCIAL. TEMPO INSUFICIENTE. NÃO CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA.
BENEFÍCIO NÃO CONCEDIDO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. PEDIDO INICIAL
PARCIALMENTE PROCEDENTE. APELAÇÃO DO INSS PREJUDICADA.
1 - Configurado está o julgamento extra petita, eis que, conquanto a parte autora tenha postulado
a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição (fundamentada no art. 52 da Lei
nº 8.213/91), com o reconhecimento de período de labor rural, a r. sentença examinara pedido
diverso, qual seja, o de aposentadoria por idade rural.
2 - Sendo assim, merece ser anulada a r. sentença, isso porque não examinara o pleito narrado
na inicial, restando, assim, violado o princípio da congruência, insculpido no art. 460 do CPC/73,
atual art. 492 do CPC/2015.
3 - O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à Primeira Instância, uma vez que a
legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo, quando presentes as
condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil em
vigor.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova
exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da
7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser
contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido
produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de
que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele
retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que
tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
7 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91.
8 - Verifica-se que a parte autora apresentou início de prova material (item “d”, pois
contemporâneo ao período que se pode reconhecer sem a exigência de contribuição, nos termos
do art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99), corroborado pela prova testemunhal (mídia IDs 171081112
e 220010977) colhida em audiências realizadas em 22/06/2018 e 18/06/2018 (IDs 8089308 e
8089309 – p. 6).
9 - Possível o reconhecimento do período de labor rural de 01/01/1974 a 31/10/1991, conforme o
art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99.
10 - Verifica-se que o autor até a data do requerimento administrativo (29/06/2016 – ID 8089270 –
p. 11) tinha apenas 6 meses e 15 dias de tempo de contribuição, não fazendo jus ao benefício
pelo não cumprimento seja da carência, seja do tempo exigido.
11 - Honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da
causa e distribuídos proporcionalmente entre as partes sucumbentes, nos termos dos artigos 85,
§§2º e 3º, e 86, ambos do Código de Processo Civil.
12 - Sentença anulada. Pedido inicial parcialmente procedente. Apelação do INSS prejudicada.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5070010-08.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ORIVALDO FRESSATTO
Advogado do(a) APELADO: EVELISE SIMONE DE MELO ANDREASSA - SP135328-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5070010-08.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ORIVALDO FRESSATTO
Advogado do(a) APELADO: EVELISE SIMONE DE MELO ANDREASSA - SP135328-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em
ação ajuizada por ORIVALDO FRESSATO, objetivando a concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento de labor rural.
A r. sentença de ID 8089311 julgou procedente o pedido inicial, para reconhecer que o autor
exerceu atividade rural no período de 01/1974 a 10/2014, condenando o INSS a implantar o
benefício de aposentadoria por idade rural desde a data do requerimento administrativo. A
autarquia foi condenada, ainda, no pagamento das parcelas atrasadas acrescidas de juros de
mora e de correção monetária, bem como no pagamento de 10% do valor da condenação, até a
data da prolação da sentença, a título de honorários advocatícios. Foi concedida a antecipação
de tutela.
Em razões recursais de ID 8089320, pugna o INSS pela reforma da sentença, uma vez que a
parte autora não apresentou início de prova material, não sendo possível o reconhecimento do
labor rural. Sustenta, ainda, que o autor não trabalhou no regime de economia familiar, não
fazendo jus à concessão da aposentadoria por idade. Por fim, prequestiona a matéria.
Devidamente processado o recurso, sem contrarrazões, foram os autos remetidos a este
Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5070010-08.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ORIVALDO FRESSATTO
Advogado do(a) APELADO: EVELISE SIMONE DE MELO ANDREASSA - SP135328-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Da nulidade da r. sentença
Saliente-se que, fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além
(ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante art. 492
do CPC/2015.
In casu, configurado está o julgamento extra petita, eis que, conquanto a parte autora tenha
postulado a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição (fundamentada no
art. 52 da Lei nº 8.213/91), com o reconhecimento de período de labor rural, a r. sentença
examinara pedido diverso, qual seja, o de aposentadoria por idade rural.
Sendo assim, merece ser anulada a r. sentença, isso porque não examinara o pleito narrado na
inicial, restando, assim, violado o princípio da congruência, insculpido no art. 460 do CPC/73,
atual art. 492 do CPC/2015.
O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à Primeira Instância, uma vez que a legislação
autoriza expressamente o julgamento imediato do processo, quando presentes as condições
para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil em vigor:
"A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
(...)
§ 3º. Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde
logo o mérito quando:
(...)
II - Decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da
causa de pedir".
Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos
necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados -
com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual
aplicável, passa-se ao exame do mérito da demanda.
Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do
tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não
sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149,
do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se
pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o
raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS
NÃO DEMONSTRADOS.
1. (...).
3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é
imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o
documento.(...)" (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº 0008835-
06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1
DATA:07/12/2015 - grifos nossos).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO
DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
(...)
2) Não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência
estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua
eficácia probatória. (...)" (AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver
comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil,
assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural
exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos
como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal
idônea.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes
termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(omissis)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado
urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda
que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro
outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do
caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal
meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal
meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este
equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente,
trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros
da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do
núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados permanentes."
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para
fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido
antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO
REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE
RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS PARA SANAR
OMISSÃO SEM EFEITO MODIFICATIVO.
(...)
2. No presente caso, impõe-se sanar omissão para asseverar que a jurisprudência do STJ
possui entendimento no sentido de que é dispensável o recolhimento de contribuições
previdenciárias, para fins de reconhecimento de tempo de serviço rural, quanto ao labor
exercido antes da Lei 8.213/1991.(...)"
(EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES,
SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 05/11/2015).
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 485, V, DO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 55, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. OCORRÊNCIA. SEGURADA
VINCULADA AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL-RGPS. TEMPO DE SERVIÇO
RURAL. APOSENTADORIA. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. ANTES DA VIGÊNCIA
DA REFERIDA LEI. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A autora sempre esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social.
2. Não é exigível o recolhimento das contribuições previdenciárias, relativas ao tempo de
serviço prestado como trabalhador rural, antes da vigência da Lei n 8.213/91, para fins de
aposentadoria urbana pelo Regime Geral de Previdência Social. Precedentes da Terceira
Seção.
Ação rescisória procedente"
(AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO
TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015, DJe 04/12/2015 - grifos nossos).
"APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE
SERVIÇO RURAL ANTERIOR A PROVA DOCUMENTAL.
1. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de
vigência da Lei n.º 8.213/1991, é de ser computado e averbado, independentemente do
recolhimento das contribuições a ele correspondentes, mas não se presta para efeito de
carência.(...)"
(AC nº 0029462-51.2003.4.03.9999, 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis, j. 30/11/2015,
e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/12/2015).
Contudo, o tempo de serviço do trabalhador rural poderá ser computado, independentemente
do recolhimento de contribuição, exceto para fins de carência, até o dia 31/10/1991, conforme o
disposto no art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99, in verbis:
"Art. 60. Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição,
entre outros:
(...)
X - o tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior à competência novembro de
1991;"
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do
trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas
os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições
anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o
desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos
genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando,
se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em
que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os
auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer
plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma
atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal,
tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
"ACIDENTE DO TRABALHO. SEGURO OBRIGATORIO ESTABELECIDO NO ART. 165- XVI
DA CONSTITUIÇÃO: ALCANCE. CONTRATO LABORAL COM AFRONTA A PROIBIÇÃO
CONSTITUCIONAL DO TRABALHO DO MENOR DE DOZE ANOS. MENOR DE DOZE ANOS
QUE PRESTAVA SERVIÇOS A UM EMPREGADOR, SOB A DEPENDÊNCIA DESTE, E
MEDIANTE SALARIO. TENDO SOFRIDO O ACIDENTE DE TRABALHO FAZ JUS AO
SEGURO PRÓPRIO. NÃO OBSTA AO BENEFÍCIO A REGRA DO ART. 165-X DA CARTA DA
REPUBLICA, QUE FOI INSCRITA NA LISTA DAS GARANTIAS DOS TRABALHADORES EM
PROVEITO DESTES, NÃO EM SEU DETRIMENTO. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS
CONHECIDOS E PROVIDOS."
(RE nº 104.654/SP, Relator Ministro Francisco Rezek, 2ª Turma, DJ 25/04/1986) (grifos
nossos).
"Agravo de instrumento.
2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de tempo de serviço. Art.
11, VII, da Lei nº. 8213. Possibilidade. Precedentes.
3. Alegação de violação aos arts. 5º, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de
declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos
trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e
Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do
STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte.
4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.04.86; e RE
104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86.
5. Agravo de instrumento a que se nega provimento".
(AI nº 529.694/RS, Rel. Ministro Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJ de 11/03/2005) (grifos nossos).
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes
ementas:
"PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ULTRA PETITA. APOSENTADORIA
POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB
CONDIÇÕES ESPECIAIS. TEMPO DE LABOR NA FAINA RURAL.
(...)
- Admite-se o cômputo do período laborado no campo pelo menor de idade (a partir dos 12 -
doze - anos), uma vez que as regras insculpidas nos Ordenamentos Constitucionais, vedando o
trabalho infantil, não podem prejudicá-lo.
- Dado parcial provimento tanto à remessa oficial (tida por interposta) como ao recurso de
apelação da autarquia previdenciária e negado provimento ao recurso de apelação da parte
autora."
(AC nº 2012.03.99.028461-0/SP, Rel. Des. Federal Fausto de Sanctis, DJe 16/03/2017).
"PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. POSSIBILIDADE.
DISPENSA DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES.
(...)
4. É possível o reconhecimento do tempo de atividade rural prestado já aos 12 (doze) anos de
idade, consoante precedentes dos Tribunais Superiores.
5. De acordo com os documentos anexados aos autos, corroborados pela prova testemunhal, a
autora comprovou o exercício de atividade rural no período de 07/1975 a 07/1988, devendo ser
procedida a contagem do referido tempo de serviço, independentemente do recolhimento das
respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do artigo
55, §2º, da Lei 8.213/91.
6. Apelação provida."
(AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, Rel. Des. Federal Toru Yamamoto, DJe 13/03/2017).
Do caso concreto.
As pretensas provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo da parte
autora, no período de 01/1974 a 10/2014:
a) ITR dos anos de 2009, 2011 e 2013 (ID 8089269 – p. 1/7 e 13/15);
b) Notas fiscais de produção rural dos anos de 2009, 2010, 2011 e 2012 (ID 8089269 – p. 9/12);
c) Declaração de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Empregados Rurais de Itapira em
2009 (ID 8089270 – p.3/4) e
d) Matrícula de imóvel rural em nome do autor, que é qualificado como lavrador em 1978 e em
1985 (ID 8089270 – p. 6/9).
Verifica-se que a parte autora apresentou início de prova material (item “d”, pois contemporâneo
ao período que se pode reconhecer sem a exigência de contribuição, nos termos do art. 60, X,
do Decreto nº 3.048/99), corroborado pela prova testemunhal (mídia IDs 171081112 e
220010977) colhida em audiências realizadas em 22/06/2018 e 18/06/2018 (IDs 8089308 e
8089309 – p. 6).
Dirce Pereira afirmou que conheceu o autor quando ele tinha cerca de 10 anos. O autor
trabalhava no sítio da família (sítio Santo Antônio). A depoente costumava comprar os produtos
da lavoura. O autor não estudou. Não havia empregados. Havia lavoura de feijão, arroz, milho e
mandioca. O autor trabalhou praticamente toda a vida no sítio. Em 2014, trabalhou em uma
firma e depois retornou, mas não voltou a trabalhar por motivos de saúde.
Ronaldo Mauch afirmou que conhece o autor desde 1980. Eram vizinhos de sítio. O autor
trabalhou no campo até 2010 ou 2015. O autor desde os 16 ou 17 anos trabalhava com o pai na
lavoura de café, milho e arroz.
Sendo assim, é possível o reconhecimento do período de labor rural de 01/01/1974 a
31/10/1991, conforme o art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99.
A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I,
da Constituição Federal, o qual dispõe:
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidas as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;
Verifica-se que o autor até a data do requerimento administrativo (29/06/2016 – ID 8089270 – p.
11) tinha apenas 6 meses e 15 dias de tempo de contribuição, não fazendo jus ao benefício
pelo não cumprimento seja da carência, seja do tempo exigido.
Nos termos dos artigos 85, §§2º e 3º, e 86, ambos do Código de Processo Civil, os honorários
advocatícios, (ora) arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, serão
distribuídos entre as partes sucumbentes, na seguinte proporção: 5% em favor do patrono da
autarquia e 5% em favor do patrono da parte autora.
Em relação à parte autora, havendo a concessão dos benefícios da assistência judiciária
gratuita, a teor do disposto no §3º do artigo 98 do CPC, ficará a exigibilidade suspensa por 5
(cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que a fundamentou.
Ante o exposto, de ofício, anulo a r. sentença de primeiro grau de jurisdição, por se tratar de
sentença extra petita e julgo parcialmente procedente o pedido inicial, para reconhecer o
período de labor rural de 01/01/1974 a 31/10/1991 e para determinar que os honorários
advocatícios, fixados em 10% do valor da causa atualizado, serão distribuídos entre as partes
sucumbentes na proporção de 5% em favor do patrono da autarquia e 5% em favor do patrono
da parte autora, suspensa a execução, em relação à parte autora, em razão da concessão dos
benefícios da gratuidade judiciária, restando prejudicada a apelação do INSS.
Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso
excepcional ou acertificação do trânsito em julgado.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA EXTRA PETITA. ANULAÇÃO. ATIVIDADE RURAL.
RECONHECIMENTO PARCIAL. TEMPO INSUFICIENTE. NÃO CUMPRIMENTO DA
CARÊNCIA. BENEFÍCIO NÃO CONCEDIDO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. PEDIDO INICIAL
PARCIALMENTE PROCEDENTE. APELAÇÃO DO INSS PREJUDICADA.
1 - Configurado está o julgamento extra petita, eis que, conquanto a parte autora tenha
postulado a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição (fundamentada no
art. 52 da Lei nº 8.213/91), com o reconhecimento de período de labor rural, a r. sentença
examinara pedido diverso, qual seja, o de aposentadoria por idade rural.
2 - Sendo assim, merece ser anulada a r. sentença, isso porque não examinara o pleito narrado
na inicial, restando, assim, violado o princípio da congruência, insculpido no art. 460 do CPC/73,
atual art. 492 do CPC/2015.
3 - O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à Primeira Instância, uma vez que a
legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo, quando presentes as
condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil em
vigor.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
7 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91.
8 - Verifica-se que a parte autora apresentou início de prova material (item “d”, pois
contemporâneo ao período que se pode reconhecer sem a exigência de contribuição, nos
termos do art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99), corroborado pela prova testemunhal (mídia IDs
171081112 e 220010977) colhida em audiências realizadas em 22/06/2018 e 18/06/2018 (IDs
8089308 e 8089309 – p. 6).
9 - Possível o reconhecimento do período de labor rural de 01/01/1974 a 31/10/1991, conforme
o art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99.
10 - Verifica-se que o autor até a data do requerimento administrativo (29/06/2016 – ID 8089270
– p. 11) tinha apenas 6 meses e 15 dias de tempo de contribuição, não fazendo jus ao benefício
pelo não cumprimento seja da carência, seja do tempo exigido.
11 - Honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da
causa e distribuídos proporcionalmente entre as partes sucumbentes, nos termos dos artigos
85, §§2º e 3º, e 86, ambos do Código de Processo Civil.
12 - Sentença anulada. Pedido inicial parcialmente procedente. Apelação do INSS prejudicada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, anular a r. sentença de primeiro grau de jurisdição, por se tratar
de sentença extra petita e julgar parcialmente procedente o pedido inicial, para reconhecer o
período de labor rural de 01/01/1974 a 31/10/1991 e para determinar que os honorários
advocatícios, fixados em 10% do valor da causa atualizado, serão distribuídos entre as partes
sucumbentes na proporção de 5% em favor do patrono da autarquia e 5% em favor do patrono
da parte autora, suspensa a execução, em relação à parte autora, em razão da concessão dos
benefícios da gratuidade judiciária, restando prejudicada a apelação do INSS, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
