Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1992449 / SP
0005986-45.2012.4.03.6126
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
09/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/09/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA ULTRA PETITA. REDUÇÃO AOS LIMITES DO PEDIDO
INICIAL. ATIVIDADES ESPECIAIS. VIGILANTE, VIGIA E GUARDA. APOSENTADORIA
INTEGRAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. REMESSA NECESSÁRIA E
APELAÇÕES DO AUTOR E DO INSS PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - Ressalta-se, de início, que, fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao
magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra
petita), consoante o art. 492 do CPC/2015.
2 - Todavia, verifica-se que o magistrado a quo não se ateve aos termos do pedido ao
reconhecer o período de 21/04/1994 a 20/07/1994 como tempo de labor especial, enfrentando
questão que não integrou a pretensão efetivamente manifesta.
3 - Logo, a sentença, neste aspecto, é ultra petita, eis que considerou como labor especial lapso
temporal não pleiteado na inicial, extrapolando os limites do pedido; restando violado o princípio
da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
4 - Conveniente esclarecer que a violação ao princípio da congruência traz, no seu bojo,
agressão ao princípio da imparcialidade, porquanto concede algo não pedido, e do contraditório,
na medida em que impede a parte contrária de exercer integralmente seu direito de defesa.
5 - Dessa forma, é de ser reduzida a sentença aos limites do pedido inicial, excluindo-se o
reconhecimento do labor especial no interregno não indicado pela parte autora.
6 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
especificamente na Lei de Benefícios.
7 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
8 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por
qualquer modalidade de prova.
9 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador.
10 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
11 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
12 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
13 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
14 - A r. sentença reconheceu a especialidade do labor nos períodos de 20/06/1974 a
10/01/1983, de 01/04/1985 a 31/01/1986, de 24/02/1987 a 29/06/1993, de 21/07/1994 a
31/08/1994, de 01/09/1994 a 17/10/1994 e de 02/01/1995 a 28/04/1995, e condenou o INSS a
implantar, em favor do autor, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir
do requerimento administrativo, em 11/11/2011, ou em 17/12/2009, caso lhe seja mais
favorável.
15 - Em razões recursais, o autor pleiteou o cômputo como comum, do período de 11/10/1972 a
19/06/1974, e o enquadramento como especial dos períodos de 29/04/1995 a 03/05/1995 e de
16/05/1995 a 05/03/1997, para que seja majorado o tempo de contribuição apurado em primeira
instância e reconhecido seu direito à aposentadoria por tempo de contribuição integral desde os
requerimentos administrativos de 17/12/2009 e 11/11/2011.
16 - No tocante ao labor comum, de 11/10/1972 a 19/06/1974, como bem salientou a r.
sentença, "não pode ser reconhecido, na medida em que a cópia da CTPS, de fl. 100, encontra-
se ilegível. Mesmo com a juntada da CTPS, de fl. 218, não foi possível comprovar o período, na
medida que sequer se encontra lá registrado".
17 - Em relação aos períodos especiais, conforme CTPS e Perfil Profissiográfico Previdenciário
: no período de 20/06/1974 a 10/01/1983, laborado na empresa Seg Serviços Especiais de
Guarda S/A, o autor exerceu o cargo de "vigilante", atividade enquadrada no código 2.5.7 do
Anexo do Decreto nº 53.831/64 - CTPS de fl. 99; no período de 01/04/1985 a 31/01/1986,
laborado na empresa Eletrônica Industrial Logical Ltda, o autor exerceu o cargo de "guarda",
atividade enquadrada no código 2.5.7 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 - CTPS de fl. 115; no
período de 24/02/1987 a 29/06/1993, laborado na empresa GP Guarda Patrimonial de São
Paulo Ltda, o autor exerceu o cargo de "vigilante", atividade enquadrada no código 2.5.7 do
Anexo do Decreto nº 53.831/64 - PPP de fls. 21/22 e CTPS de fl. 116; no período de 21/07/1994
a 31/08/1994, laborado na empresa Afinal Serviços Temporários Ltda, o autor exerceu a função
de "vigia", atividade enquadrada no código 2.5.7 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 - CTPS de
fl. 128; no período de 01/09/1994 a 17/10/1994, laborado na empresa Serviços Gerais S/C Ltda,
o autor exerceu o cargo de "vigia", atividade enquadrada no código 2.5.7 do Anexo do Decreto
nº 53.831/64 - CTPS de fl. 116; no período de 02/01/1995 a 03/05/1995, laborado na empresa
Transportadora Amélia Ltda, o autor exerceu o cargo de "vigia", atividade enquadrada no código
2.5.7 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 - CTPS de fl. 117; e no período de 16/05/1995 a
05/03/1997, laborado ne empresa Meninos Futebol Clube, o autor exerceu o cargo de "vigia",
atividade enquadrada no código 2.5.7 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 - CTPS de fl. 117.
18 - Alie-se como robusto elemento de convicção, nesse sentido, a reforma legislativa realizada
pela Lei nº 12.740/2012, que alterou o art. 193 da CLT, para considerar a atividade de vigilante
como perigosa, com o adicional de 30%, em virtude da exposição da categoria a roubos ou
outras espécies de violência, mesmo não fazendo menção a uso de armas.
19 - Ademais, reputa-se perigosa tal função por equiparação da categoria àquelas previstas no
item 2.5.7 do Decreto nº 53.831/64, ainda que não tenha sido incluída pelos Decretos nº
83.090/79 e nº 89.312/84, cujos anexos regulamentares encerram classificação meramente
exemplificativa.
20 - Ressalte-se que essa presunção de periculosidade perdura mesmo após a vigência do
Decreto nº 2.172/97, independentemente do laudo técnico a partir de então exigido.
21 - Aliás, a despeito da necessidade de se comprovar esse trabalho especial mediante estudo
técnico ou perfil profissiográfico, entendo que tal exigência não se mostra adequada aos
ditames da Seguridade Social pois, ao contrário das demais atividades profissionais expostas a
agentes nocivos, o laudo pericial resulta inviável no caso dos vigias, na medida em que a
avaliação do grau de periculosidade se dá no mesmo âmbito da presunção adotada pelo
enquadramento no Decreto nº 53.831/64, vale dizer, somente seria possível avaliar a efetiva
exposição de risco numa situação real de defesa ao patrimônio tutelado, justamente o que se
procura prevenir com contratação dos profissionais da área da segurança privada.
22 - A propósito da continuidade das circunstâncias de perigo a que exposto o segurado, bem
decidiu este E. Tribunal que "Diferentemente do que ocorre com a insalubridade, na qual ganha
importância o tempo, por seu efeito cumulativo, em se tratando de atividade perigosa, sua
caracterização independe da exposição do trabalhador durante toda a jornada, pois que a
mínima exposição oferece potencial risco de morte, justificando o enquadramento especial , não
havendo que se falar em intermitência, uma vez que o autor exerce a função de vigia durante
toda a jornada de trabalho, assim sendo, a exposição ao risco é inerente à sua atividade
profissional" (10ª Turma, AC nº 2007.03.99.038553-3, Rel. Des. Fed. Sérgio Nascimento, j.
23/06/2009, DJF3 01/07/2009, p. 889).
23 - Possível, portanto, o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de
20/06/1974 a 10/01/1983, de 01/04/1985 a 31/01/1986, de 24/02/1987 a 29/06/1993, de
21/07/1994 a 31/08/1994, de 01/09/1994 a 17/10/1994, de 02/01/1995 a 03/05/1995 e de
16/05/1995 a 05/03/1997.
24 - Acerca da conversão do período de tempo especial, deve ela ser feita com a aplicação do
fator 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, não importando a época em que
desenvolvida a atividade, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
25 - Assim, conforme tabelas anexas, após converter os períodos especiais em tempo comum,
aplicando-se o fator de conversão de 1.4, e somá-los aos demais períodos comuns já
reconhecidos administrativamente pelo INSS (fls. 40/41 e 179/180); constata-se que o autor, na
data do segundo requerimento administrativo (17/12/2009 - fl. 53), contava com 35 anos, 1 mês
e 12 dias de tempo de atividade, e na data do terceiro requerimento administrativo (11/11/2011 -
fl. 182), com 35 anos, 5 meses e 28 dias de tempo total de atividade; suficientes para a
concessão do beneficio de aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir destas
datas; observado o direito a opção pelo benefício que lhe for mais vantajoso.
26 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
27 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
28 - Remessa necessária e apelações do autor e do INSS parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação do autor, para reconhecer a especialidade do labor nos períodos de 29/04/1995 a
03/05/1995 e de 16/05/1995 a 05/03/1997, e para condenar o INSS a implantar, em seu favor, o
benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir da data do segundo
requerimento administrativo (17/12/2009) ou do terceiro requerimento administrativo
(11/11/2011); observado o direito a opção pelo benefício que lhe for mais vantajoso; dar parcial
provimento à apelação do INSS, para estabelecer que os juros de mora, incidentes até a
expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal; bem como dar parcial provimento à
remessa necessária, esta em maior extensão, para também restringir a r. sentença de 1º grau,
ultra petita, aos termos do pedido inicial, e para estabelecer que a correção monetária dos
valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E; mantendo, no mais, o
julgado proferido em 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
