
| D.E. Publicado em 26/11/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, bem como à remessa necessária, ora tida por interposta, bem como dar parcial provimento à apelação da autora, para reformar a r. sentença de 1º grau, reconhecendo o labor campesino da requerente como sendo de 30/07/74 a 18/01/90, e, por consequente, condenar o INSS ao pagamento, em favor da autora, do benefício de aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (21/02/09), fixando-se, ainda, a fim de estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual. Demais disso, os honorários advocatícios a serem pagos em favor do causídico da parte autora são por ora fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado das prestações devidas até a data da r. sentença de primeiro grau, nos termos da Súmula 111, do E. Superior Tribunal de Justiça, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0045273-36.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelas partes autora e ré, nos autos da ação previdenciária movida por HILDA CAMARGO DA SILVA OLIVEIRA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em que se objetiva o reconhecimento de tempos de serviço rural e especial, bem como a consequente concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço.
A r. sentença de fls. 281/285 julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo o labor rural no período compreendido entre 18/10/75 e 31/12/84, bem como o de trabalho especial, em decorrência do agente insalubre "ruído", de 13/06/90 a 14/07/97, condenando a Autarquia na sua averbação, sem concessão de aposentadoria. Condenou-se, ainda, a requerente ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados, por equidade, em R$ 400,00 (quatrocentos reais), observadas as disposições concernentes à justiça gratuita.
Irresignada, a autora, em apelação (fls. 298/320), requer seja todo o período rural afirmado na inicial reconhecido em Juízo, sob o fundamento de que foram juntadas provas suficientes para tanto, visto ter a autora laborado em regime de economia familiar nestes intervalos. Afirma, ademais, possuir tempo suficiente para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição/serviço. Por fim, pede pela inversão do ônus da sucumbência.
Em razões recursais de fls. 322/325, por sua vez, pugna o INSS pela reforma do decisum, para que seja afastada a especialidade do período de 13/06/90 a 14/07/97, vez que não comprovada a insalubridade, in casu, até porque houve neste tempo utilização de EPI supostamente eficaz.
Contrarrazões da autora às fls. 327/341.
Devidamente processado o recurso, sem contrarrazões do INSS, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, verifico que a sentença submetida à apreciação desta Corte foi publicada em 13/09/2011, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, § 2º do CPC/73:
No caso, o INSS foi condenado a reconhecer períodos de labor especial e rural da autora. Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo retro mencionado e da Súmula nº 490 do STJ.
Conheço da Remessa Necessária. Passo, pois, ao mérito recursal.
Nesta senda, a respeito do labor campesino, cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
É pacifico, ademais, o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
A pretensa prova material juntada aos autos, a respeito do labor no campo da autora, qual seja, a "ficha de recém-nascido", emitida pelo Hospital Comunitário de Beneficência de Piraju, que a qualifica como "rural", emitida em 17/11/84 (fl. 91) é suficiente à configuração do exigido início de prova material, quanto ao primeiro intervalo elencado na exordial (de 30/07/74 a 18/01/90), eis que devidamente corroborada por idônea e segura prova testemunhal colhida em audiência de instrução, realizada sob o crivo do Contraditório e da Ampla Defesa. No entanto, desde logo de se repisar que, após 1991, o labor rural somente pode ser computado e averbado, para efeitos previdenciários, em caso de haver prévio recolhimento das respectivas contribuições à Seguridade Social - o que não se configura na hipótese ora em análise.
A primeira testemunha da autora, Eduardo Evaristo, compromissado e advertido, respondeu que: "é turmeiro e afirma que a autora trabalhou para ele várias vezes no período de 1975 a 1990. Posteriormente, ela trabalhou com o depoente até 2005, levava-a nas propriedades rurais de Taguaí, assim como o esposo da autora..." (fl. 246).
Ainda, Ademir Carniato, segunda testemunha, afirmou que: "conhece a autora há uns 40 anos. A autora trabalhava na Fazenda São Vicente dos Globbo, a propriedade ficava perto da propriedade da família do depoente. Ela trabalhou neste local desde criança até 1990 aproximadamente... ...Não sabe se o marido da autora trabalhou para os Globbo. Tem conhecimento de que ele foi bóia-fria..." (fl. 247).
Por derradeiro, João Alves de Paula, último testigo, à fl. 248 dos autos, respondeu que: "foi turmeiro de 1970 a 1992. A autora trabalhou para o depoente a partir de 1974, não se recorda até quando... ...Antes de ela ir para São Paulo, a levou a trabalhar na fazenda dos Globbo, dos Ribeiro, dos Dognani e Santa Rita..."
Assim sendo, de se reformar, quanto a este tópico, parcialmente, a r. sentença de primeiro grau. Com efeito, é claro e lógico que o trabalho da autora na lide campesina se deu como diarista/bóia-fria, a despeito desta alegar trabalho em regime de economia familiar - o que, conforme demonstrado, nesta hipótese, não afasta a lide campesina - entre 30/07/74 (quando já tinha 14 anos de idade) até 18/01/90, nos termos da inicial.
Com relação ao suposto período rural compreendido entre 1997 e 2005, de se ressalvar que, além do fato de não ser possível considera-lo sem o respectivo recolhimento das contribuições previdenciárias previstas em lei, nenhum documento nestes autos isso comprova. As testemunhas inquiridas, por sua vez, quando se referem a tal fato, o fazem de forma evasiva e imprecisa. Ademais, exercera a demandante, em diversos intervalos compreendidos neste tempo, labor urbano registrado em CTPS. Diante disso, quanto a este tópico, de se manter a r. sentença a quo, pela improcedência do requerimento.
Passo, pois, à apreciação do trabalho exercido em condições especiais.
De se verificar por ora que em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ 01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
Assim, quanto ao período controvertido de 13/06/90 a 14/07/97, instruiu-se estes autos com o laudo técnico de fls. 209/210, de modo que restou definitivamente comprovado ter a suplicante sido exposta, de modo habitual e permanente, a ruído de, no mínimo, 93,5 decibéis no interregno em referência, quando laborou na empresa "SATA - Serviços Auxiliares de Transporte Aéreo S/A."
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Repita-se, por ora, entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por fim, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Assim sendo, mantenho enquadrado como especial o período compreendido entre 13/06/90 e 14/07/97, em razão de exposição, da autora, em caráter habitual e permanente, ao agente insalubre 'ruído", em níveis superiores àqueles permitidos pela legislação em vigor.
Conforme planilha anexa, somando-se o tempo de labor rural ora reconhecido ao período especial, com a consequente conversão em comum, adicionados ainda os períodos incontroversos, verifica-se que a autora, à data do requerimento administrativo (21/02/09) alcançou 30 anos, 08 meses e 17 dias de serviço, o que lhe assegura o direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição/serviço. O requisito carência restou também completado.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo - 21/02/09.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante a sucumbência mínima da parte autora, ora invertida, quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que resta perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, bem como à remessa necessária, ora tida por interposta, bem como dou parcial provimento à apelação da autora, para reformar a r. sentença de 1º grau, reconhecendo o labor campesino da requerente como sendo de 30/07/74 a 18/01/90, e, por consequente, condenar o INSS ao pagamento, em favor da autora, do benefício de aposentadoria integral por tempo de serviço/contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (21/02/09), fixando-se, ainda, a fim de estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual. Demais disso, os honorários advocatícios a serem pagos em favor do causídico da parte autora são por ora fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado das prestações devidas até a data da r. sentença de primeiro grau, nos termos da Súmula 111, do E. Superior Tribunal de Justiça.
É como voto.
CARLOS DELGADO
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